17 - Adam perspectivas: Sangue e trovões

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Os últimos dias tem sido mais calmos. Meus pais não se falam mais, o que de certa forma é melhor que as brigas. Eles se evitam tanto que mal ficam em casa, isso tem trazido uma certa paz na casa, ou solidão, ou os dois. Mas definitivamente era melhor que qualquer outra coisa.

Cloe era quem sofria mais com isso. Por mais que ela ficasse alegre brincando o tempo todo, ela era só uma criança que eu sei que queria a atenção dos pais, mas que não podia ter por que eles eram uns babacas. Eu tentava ser o mais legal possível com ela, mas tinha dias que seu olhar estava tão triste que eu chorava escondido por não poder ser um bom irmão.

As aulas com Micaela têm sido ótimas, eu tenho me empenhado mais, porque realmente preciso voltar a jogar, e como o prazo que me deram estava acabando eu precisava de todo foco possível, o que estava dando certo já que minhas notas haviam melhorado consideravelmente.

Uma coisa que notei foi Mica com Laura. Aparentemente as duas haviam voltado a se falar, e isso trazia outra vibe para as duas. Laura ficava menos chata e Micaela parecia radiante, o que era estranho depois de tanto tempo emanando sofrimento pelos olhos. Suas olheiras diminuíram, seu cabelo já não ficava tão bagunçado, seus olhos tinham um brilho novo, e ela sorria. Isso me levava para o passado todas as vezes. Ela era uma pessoa tão incrível, mas eu não era a Laura, muito menos o Lucas que também a havia perdoado, me dissera outro dia. Eu não conseguia entender por que Micaela tinha virado as costas enquanto tentávamos ajuda-la. Por pior que ela estivesse não era motivo para nos abandonar também. Eu sabia que no fundo ela precisava de nós, assim como no fundo também sabia que eu precisava ainda mais dela, talvez fosse por isso que eu não conseguia perdoa-la.

Lucas me incentivava a falar com ela, mas eu sabia que não conseguiria, afinal nem sabia se seriamos amigos, ela só estava me dando aulas, o fato dela voltar a falar com Laura não significava que voltaríamos os quatro a ser amigos. Até porque Laura também estava distante de mim e Lucas. Depois que começou amizade com a Bianca ela ficou fútil. Diferente. Não a reconhecia mais. Não que não conversássemos nunca, mas não era igual.

A última aula que Mica me deu foi um dos dias mais divertidos que eu tive. Fazer aquelas panquecas bobas me animaram de tal forma que eu não me animava a semanas. Tirou um peso de mim que eu estava carregando a dias. E ver Cloe tão feliz me deixava feliz também. E confesso que foi bizarro vê-la daquele jeito na festa de halloween. Mica nunca bebia, e encontrar ela vomitando no banheiro, jogada no colo de Laura, sem conseguir levantar era estranho. Não parecia coisa dela. O que me fazia pensar se alguém havia feito beber de novo, ou se fora ideia dela mesmo. Ainda não acreditava que tinha saído da festa antes de pegar a mina mais gata de lá, bem na hora que íamos ficar Lucas me chamou dizendo ser urgente. Eu a coloquei gentilmente na cama, seu quarto não havia mudado nadinha desde a última vez que eu estrei ali. A observei dormindo antes de sair e fechar a porta, ela respirava calmamente e eu notei algumas marcas arroxeadas em seu braço e em seu pescoço, o que descobri do que se tratava em seu diário mais tarde.

"Eu tentei correr dessa vez, mas os passos de Dom foram mais rápidos. Aquele amigo nojento do meu pai se juntou a ele enquanto ele me segurava fortemente pelos braços. Eles falavam coisas imundas e meu pai não fazia nada, continuava a beber no canto da mesa, enquanto seus amigos me torturavam com aquelas mãos porcas, encostando em mim, e acertando meu rosto com força. As marcas no meu braço sempre demoram semanas pra sumir, mas sempre há outras no lugar quando a primeira some. Não aguento mais ser tratada desse jeito. Por que ele não vai embora de vez? "

Aquilo me atormentava. Então os amigos do pai de Mica batiam nela. Como eles podiam ser tão nojentos. Haviam vários outros relatos desses caras a agredindo, ou até mesmo de seu pai. Ele perdendo a cabeça, ele gritando, ele correndo em sua direção, ele levantando as mãos enormes para acertar seu rosto delicado. Isso era tão absurdo. Como seu próprio pai podia fazer isso?

Lembranças Perdidas De Uma Garota QualquerWhere stories live. Discover now