16 - O Retorno

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Quando me certifiquei que os meus patrões sairam de casa para o emprego, fui à garagem e coloquei o meu disfarce modelo: o disfarce de jovem loira que tinha quando cheguei aqui.

— Nave — grito eu depois das portas dela se fecharem.

— Bom dia, senhora.

— Nave, preciso de detalhes na localização de Lance Stewart.

— A pesquisar... — no painel touch screen aparece o mapa do mundo e um quadrado constantemente em movimento, por todos os continentes da Terra — Localização de Lance Stewart apurada. Ponto de referência: Avenue Victor Hugo, Paris, France — diz-me a nave num lindíssimo sotaque francês.

Dirige-te para lá.

Coloco o meu cinto, e o jardim da entrada é aberto pelo meio, dando à minha nave uma oportunidade de apontar o nariz para o céu, e seguir viagem até Paris.

Lembro-me da última vez que vi Lance Stewart, e das duas semanas maravilhosas que ambos passámos em Cuba, e da quantidade de vezes que estávamos a um passo de distância de ir para a cama.

Pergunto-me como está agora. Uma das qualidades que temos em comum, é termos a capacidade de não envelhecer. Quando nos conhecemos em Havannah, ele já tinha mais de 500 anos, por isso agora deve estar semelhante.

Perdida em pensamentos, já estamos a esvoaçar sobre a cidade mesmo ao lado da Torre Eiffel. Tão perto que até reparo nos turistas a tirarem fotos da minha nave. No painel de controlo da nave, carrego no botão que, trazido de verameriano, significa "apagar memória". Nele carrego, e certifico-me de destruir todos os dispositivos que têm registos meus, pois não posso arriscar ter a minha nave nos noticiários.

Aterro a minha nave, e ao sair dela ordeno que diminua de tamanho, cabendo na palma da minha mão para que eu a meta no bolso. Coloco a minha lente de contacto para encontrar veramerianos, e vejo um ponto azul não muito distante a brilhar no meu olhar. Deve ser ele.

— Lance! — grito eu.

Um homem muito mais musculoso levanta a cabeça por meio da multidão e lança-me o olhar. Está vestido com uma camisola preta, e uma echarpe cinzenta, parecendo um homem francês genuíno.

Ele aproxima-se e abraça-me, levantando-me até ao seu nível. A seguir beija-me — um beijo que desejei reviver tantas vezes, desde há 40 anos.

— Elizabeth! É tão bom ver-te — ri-se mas depois começa a chorar levemente— Como é que vieste aqui parar? Tu estás igual! Tenho tanta coisa para te contar, vamos a um café.

— Adorava Lance, mas devo dizer que só estou aqui porque preciso da tua ajuda urgente.

— Vamos para minha casa, conta-me o que se passou pelo caminho.

— Bem, antes de sair de casa, estava a servir o pequeno almoço à minha patroa, e uma dor muito forte, fortíssima aliás, fez-se sentir no meu peito. Já consegui suportar voltagens de eletricidade elevadíssimas, mas assim que isto me atingiu, tive que largar um prato que tinha na mão, de tão forte que foi.

— Uau, vejo que foi importante.

— Sim, e não é só isso: acho que atingiu os meus sobrinhos. Por isso pedi à minha nave que procurasse a tua localização para te levar a Veramer, para me ajudares a combater alguma coisa que esteja a afetar a minha família.

— Desculpa Elizabeth, mas eu não posso voltar para Veramer.

— Por favor Lance, tu és literalmente a única pessoa que eu confio no sistema solar, és a única pessoa tão poderosa quanto eu, e que basta dar um abanão com a mão para deitar abaixo um exercito inteiro verameriano.

Vejo que ele está a refletir imenso.

— Por favor Lance, eu rogo-te. Nunca tinha pedido nada tão importante a ninguém.

— Muito bem, eu vou contigo — agradeço-lhe contentíssima com um beijo — Mas vou ter que reparar a minha nave primeiro.

— Não é preciso — com um sorriso submisso, retiro a minha nave do bolso e atiro-a para a estrada, aproveitado o facto da fila de carros estar parada num semáforo, não tendo qualquer movimento nesta estrada agora.

A minha nave aumentou para o seu tamanho normal, mas a razão pela qual Lance ficou boquiaberto foi por todas as mudanças que tenho feito à minha nave ao longo destes anos. A minha nave é o que se pode chamar de um tunning.

Dei-lhe mão, e ele aceitou-a, pelo que entrámos na minha nave a caminho de Veramer.

*

A pista de aterragem que utilizei para estabelecer contacto com o planeta está um tanto diferente. O edifício que supostamente servia para o treinamento de Intrusos está neste momento destruído: os vidros das salas com vista para a pista estão partidos, há carros e naves abandonados no meio da pista, crateras no alcatrão, e uma diferença muito maior: A cor azul do céu. Quase chorei quando notei, por saber que isto aconteceu por minha causa.

Luzes brancas claríssimas começaram a brilhar na estrada do lado de fora da pista, entrando nesta, parecendo querer atacar a minha nave.

— OK, vamos aos desejos. Desejo que a nave fique indestrutível. Desejo que a nave nos proteja de qualquer maneira. Desejo que eu seja capaz de curar qualquer ferida que nos façam apenas com a mão, e que o tempo pare quando eu estalar os dedos, apenas deixando-me a mim e ao Lance com noção.

Eu e Lance saímos da nave em posições defensivas.

Os veramerianos começaram a sair dos jipes com armas, deixando-me a um passo de as fazer implodir.

— Parem todos! — grita um homem, que pela sua confiança aparenta ser o líder — É Elizabeth Dunn!

Nesse momento, o exercito inteiro larga as armas e ajoelha-se no chão, fazendo uma vénia tão gratificante que me deixa desconfortável.

— Senhora Dunn, não há palavras para descrever a honra que é estar na sua presença.

Isto faz-me lembrar a frase que o Phillip disse quando me conheceu.

— A Senhora é aquela que nos deu inspiração. Por favor, venha connosco.

Fiquei a saber que o Grupo-das-Luzes-Brancas se chama na verdade, Os Brancos Intervenientes, e que são os meus "porta-vozes" aqui em Veramer. Levaram-me para o suposto edifício do governo, que foi tomado por eles.

— Então e onde está o governo agora? — pergunto, enquanto passeio pelo corredor onde me lembro que se situava o antigo escritório de Gronos.

— Eles foram para um sítio qualquer fora do planeta, claramente porque pensavam que estavam seguros.

— O quê? — pergunto estupefacta — Então quem está a governar o planeta?

— A Elizabeth realmente esteve fora muito tempo. Mais ou menos depois da sua revolução na Terra, a revolução começou a acontecer cá também. A partir dessa altura, ninguém mais acreditou na palavra do governo, por exemplo no que toca a haver Erros. Por isso, Gronos foi-se embora e nós somos os nossos próprios governadores.

De repente lembro-me qual foi a razão inicial que me trouxe aqui.

— Espere! — grito eu — Não posso estar aqui, fui chamada, os meus sobrinhos!

— Tenha calma, Elizabeth. Os seus sobrinhos estão bem. A sua dor no peito foi apenas uma forma de a contactarmos e de a trazermos até aqui, para lhe dar-mos a conhecer as situações atuais do planeta, já que não vinha cá há tanto tempo.

— Mas porque me querem contar as coisas a mim? Está bem que gosto de saber dos acontecimentos, mas não valia a pena se incomodarem, eu preferia não ter sequer nada a ver com este planeta.

— Bem Elizabeth. Já deve ter percebido que toda a gente a adora, você foi aquela que mudou a opinião de toda a gente, foi aquela que tornou o céu azul!

— Sim, e então?

— A população quer coroa-la governadora.

A Empregada Extraterrestre Where stories live. Discover now