CAPÍTULO 37

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Hanna está roncando de novo. É a primeira coisa que noto. A segunda é a caixa gigante sobre a minha escrivaninha.

É uma caixa simples, de papelão, com um lacinho vermelho no topo. Os desejos nunca são pequenininhos nem contidos assim, portanto sorrio de alívio ao ver o papelão.

Mas, pensando bem, um monte de coisas poderia estar dentro dessa caixa. Vai saber se não tem um bando de duendes daquele comercial de cereal de arroz escondidos ali.

Eu saio da cama com cuidado para não levar os cobertores junto e me ajoelho em rente à escrivaninha. A caixa está à altura dos meus olhos.

Coloco as mãos sobre a tampa, tentando sentir alguma vibração.

Talvez eu tenha desejado uma cascavel.

Para irritar meu irmão, claro.

Mas nada parece se mexer; levanto a ponta da tampa e olho lá dentro.

Sapatilhas.

Sapatilhas de balé.

Elas são lindas: cor-de-rosa com lacinhos delicados na lateral e solas macias para plié que fariam qualquer menina feliz.

Mesmo sem olhar, sei que não encontrarei nenhum nome de marca nelas e sei também que elas servem direitinho.

Elas foram feitas especialmente para mim.

Passo os dedos pelo laço, sorrindo um pouco para mim mesma.

Não sei se esses desejos fazem qualquer sentido, mas parece que chegaram na ordem correta.

Uma semana atrás, eu teria virado os olhos ao ver essas sapatilhas e as jogado debaixo da cama.

Todavia, hoje, meus dedos mal podem esperar para colocá-las nos meus pés, para dançar pelo chão, para saltar no ar.

Eu me sento no chão, tiro a tampa da caixa e as sapatilhas lá de dentro.

Arranco as meias peludinhas que usei a noite inteira e calço as sapatilhas cor-de-rosa.

Elas servem perfeitamente, como num sonho. Sem apertar, sem me pinicar, elas são simplesmente uma perfeição macia e flexível.

Fico de pé, estendo uma ponta do pé e depois a outra. Olho para a Hanna por um momento, para garantir que ela ainda está dormindo, então tiro um pé do chão e estendo os braços no ar da maneira mais graciosa que consigo, girando num círculo pequeno: a pirueta mais desengonçada que o mundo já viu.

Mas o sorriso não sai do meu rosto.

Talvez eu consiga fazer isso.

Talvez eu devesse tentar.

Verô tentou ser líder de torcida. E ela sabia que não era exatamente a líder de torcida ideal.

Ela ainda sofria de acne, ainda olhava para baixo, tímida. Mas deu certo. Ela brilhou por alguns momentos no chão daquele ginásio, um sorriso de orelha a orelha enquanto pulava e gritava e sacudia seus pompons a caminho da felicidade.

Se ela pode fazer isso, por que é que não posso dançar balé de novo?

Dou mais uma pirueta, e mais outra, e mais outra, até ficar tão tonta que não consigo mais ficar de pé e acabo caindo na cama, quicando dela e me estatelando no chão.

Caio na gargalhada, tonta de tanta alegria maluca.

Porque nada mais me segura.

Hanna rola para o meu lado e me olha lá da cama.

— Mas o que é que você está fazendo? — Ela esfrega os olhos e tenta tirar algumas mechas cacheadas do rosto.

— Não sei. Nada. Tudo? Eu não sei mais.

— Bom, pelo menos você parece feliz — comenta ela, resmungando e deitando de novo.

Eu sorrio para mim mesma, porque pela primeira vez em um tempão estou mesmo.

Feliz.

Make Your Wish - CamrenWhere stories live. Discover now