Capítulo 1

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"Eu sou Ninguém."

O teto cinza e liso estava acima de mim, como sempre estivera. Com cuidado, mantinha os meus braços esticados e parados ao lado do meu tronco. Controlado. Isso.

"Existe alguém além de mim? Se existir, também é Ninguém?"

Minha boca, contudo, mexia-se em murmúrios involuntários, ela tremia com frequência e meus dentes batiam por entre as palavras que eu tentava conter.

"Não posso falar alto. Não posso falar alto. Devo me policiar."

Questões sobre existência não são bem vistas (por quem, porquemporquemporquem...?). Fui privado de alimentação por muito tempo da última vez. Não foi assim que descobri que podia beber minha urina, já tinha descoberto isso antes. Descobri, no entanto, que não devo comer minhas fezes. Fiquei doente por alguns dias.

— Eu sou Ninguém. "Eu sou Ninguém."

"Não sei quando digo em voz alta ou quando penso. Que despropósito."

— Devo me policiar.

A tela ligou e eu levantei do meu catre prontamente, agradecendo o ruído de estática que a acompanhava, tão familiar. Aprendi no dia trezentos e sessenta e três do segundo estágio que era uma tela de 27 polegadas. Ela ficava no centro de uma parede de concreto lavado de dois metros e meio de altura, que era a mesma medida das quatro paredes que me cercavam; um cubo perfeito. Sei o que é um cubo perfeito.

Ri. Um cubo perfeito para Ninguém.

"Mas que despropósito, o riso pode fazer com que Alguém pense que eu sou louco, riso sem propósito é um dos sinais, conforme mencionado no dia oitocentos e cinquenta e dois do terceiro estágio. E se eu sou Ninguém, Alguém deve existir. Melhor não rir, melhor ouvir."

O som da Tela preencheu o cubo. A imagem de um corpo flutuando com as múltiplas inscrições e códigos que a acompanhava.

— Olá, Ninguém. Dia mil, quatrocentos e sessenta do quarto estágio. Parabéns, você completou este estágio apto para o estágio final.

"Estágio, estágio e estágio. Uma anáfora, repetição, normalmente empregada para fins estilísticos, que tela esperta, seria ela uma poetisa?"

— Você será movido em até 53 minutos.

"Movido?"

A tela desligou.

"DESLIGOU???"

"Mas se passaram oito segundos, oito segundos quando um dia inteiro tem oitenta e seis mil e quatrocentos segundos. Normalmente a tela funcionava por pelo menos vinte e oito mil, oitoc..."

— Gás.

Deixei-me levar. Era a única forma que eu conhecia.

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Queridos leitores,

Muito obrigada por estarem aqui! ❤ 

Eu sei que este é um capítulo incomum - é assim porque mostra a loucura de Ninguém. Talvez ele melhore com o tempo, talvez ele fique mais louco (é possível, acreditem). O que é certo é que a jornada pela frente será difícil.

Espero que vocês nos acompanhem nela!

Um beijO!

Danny Ueda

Desconhecidos #EFCWWhere stories live. Discover now