Capítulo 12

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Corri.

A paisagem passava veloz, meu fôlego inalterado, em parte pelos exercícios no cubo, mas principalmente pelo ritmo que impusera nos últimos dias. Pulava as pedras, desviava dos arbustos altos, cuidando para não tropeçar na vegetação rasteira ou bater nas árvores, segurando os dois fuzis um em cada mão para não tilintarem na bandoleira e denunciarem minha posição.

Calculei que tinha quinze minutos de vantagem, quando peguei a direção na qual sabia que o homo sapiens desbocaria. As construções já apareciam ao fundo, então saberia que quando meu adversário chegasse aquele ponto, sua atenção dispersaria e ficaria concentrada no que estava mais adiante. O momento perfeito para agir.

Estava prestes a subir em um pau-brasil para escalá-lo e esperar, eu me inclinei ligeiramente para colocar as bandoleiras nas costas para não atrapalhar a subida, quando uma bala ricocheteou no caule, a dez centímetros de atingi-lo. Agachei-me e rolei para trás da árvore de caule robusto, buscando cobertura. Se eu não tivesse me mexido instantes antes, estaria morto agora. Apoiei meu tronco agachado, posicionando uma das armas, a outra carregada para permitir que trocasse rapidamente de fuzil, sem ter que recarregar. Cada um comportava trinta balas, sem ter que recarregar. Uma era automática, mas tinha um desvio muito alto, que eu não controlava suficientemente bem, a outra atirava em rajadas.

O silêncio permaneceu por três minutos, então cinco, fiquei estático, seria um desproposito me mover.

— Está esperando alguém? — Gritou uma voz que eu já aprendera a identificar como feminina na tentativa de me provocar. Pior que isso, estava quase certo de pertencia à mesma que me deixara seguir dias atrás. A dúvida foi quase imediatamente sanada — Esperava que não fosse eu a matá-lo, mas você tem dificultado meus planos.

A fêmea tinha pelo menos uma M16, lembrei. Sabe-se lá o que conseguira desde então. Podia dizer pela voz que ela não estava muito longe. O tiro viera do leste, mas tinha ouvido passos, enquanto se posicionava atrás do pau-brasil. Ela com certeza havia mudado de posição para evitar ser localizada pelo tiro. Mais um minuto em silêncio.

— Não foi só você que conseguiu uma aliada. Aliás, estávamos atrás dela quando ela se juntou a você, provavelmente para fugir de nós. Soube desde o segundo dia que você era ingênuo, é uma pena ver que não evoluiu em tantos dias.

"Era uma armadilha", percebi. Despropósito! Ainda que a aliada da fêmea estivesse correndo e se aproximando ainda não havia chegado, se não já estaria morto. O plano provavelmente era me afastar de Enne e me matar com aquele primeiro tiro. Sua melhor chance seria derrubá-la, enquanto a outra não chegasse, não tinha mais muito tempo restante.

Coloquei a cabeça por um instante para o lado, para determinar onde ela estava. A casca da árvore a sua frente fez um barulho oco e bem mais baixo do que o estouro que saíra da arma, mas não me acertara. Agora sabia de onde tinha vindo o tiro e ela não poderia correr sem perder a cobertura. Deitou-se no chão silenciosamente, escondendo-se atrás das raízes mais altas, e se arrastou para a direita, o lado oposto em que ela esperava que aparecesse, buscando uma brecha para atirar sem perder minha posição.

O fuzil automático carregado. Aguardei, esperando o momento em que ela tentaria me acertar novamente, o corpo tenso em expectativa. O cheiro do metal misturado com o de madeira no meu nariz, a coronha da arma encostada em meu corpo para segurar o tranco. Quase pude sentir o instante no qual ela se posicionou atirar novamente. Não foi rápida o suficiente. Vinte metros, dois mil centímetros, trinta e oito passos de um homo sapiens macho adulto ou dois tiros, o primeiro acertou o pescoço, o sangue fez uma nuvem vaporosa logo atrás dela, o seguinte na cabeça.

— Muito bem, Leopardo. — Ouvi a voz de Enne atrás de mim — Achei que podia precisar de ajuda, mas vejo que se virou muito bem.

Levantei-me com tranquilidade, batendo a terra granulada do meu corpo. Enne vinha da direção do acampamento. Seu rosto estava sujo de sangue, sua roupa parecia pegajosa, brilhando em alguns pontos, mas ela andava calmamente, tinha agora o que parecia uma cimitarra em sua mão direita, mas era sua faca na esquerda que estava ensanguentada, com pingos que escorriam e descansavam na grama. A visão era assustadora, ainda que tranquilizante.

Era possível perdoar uma traição pela metade?

— A M16 é minha — ela falou, os olhos brilhando, a roupa toda negra não parecia apropriada à tempestade.

— Desisti de Tempestade, acho que prefiro Pantera.

Enne já tinha passado por mim, a expressão pensativa quando, por fim, respondeu. A M16 sendo sopesada em suas mãos, as lâminas já em sua cintura.

— Não gosto de Pantera, você vai ter que pensar melhor sobre isso.

Dei de ombros, meu novo gesto favorito, e a segui. Ainda havia um conjunto de construções adiante para explorarmos.

Desconhecidos #EFCWWhere stories live. Discover now