DEZ

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O maior problema em se apaixonar é que às vezes o objeto de sua afeição não corresponde aos seus sentimentos e expectativas. Mas o que fazer quando  ocorre a reciprocidade? Quando aquela pessoa demonstra querer-te da mesma maneira que a queres? Seria perfeito, não é mesmo? O final feliz do conto de fadas. Só não podemos nos esquecer das tribulações pelo caminho. O que seria de uma história linda de amor sem os obstáculos? Sem o drama, as brigas. Qual seria o sentido de amar alguém que não te desperte nenhum desafio a ser melhor? 

Encontrei em Johann muito do que sempre procurei. Alguém que me fizesse rir sem muito esforço. Que me despertasse desejo com um simples olhar. A verdade é que tudo nele encaixava-se exatamente no que precisava. Mas a realidade não é igual a ficção. Aqui não sou nenhuma mulher inexperiente que tem problemas sexuais. Não sou virgem há muito tempo. Apesar de estar sem transar a muito tempo. 

A conversa com minha irmã me trouxe um certo nível de paz de espírito. Mesmo que todos os meus sentimentos reprimidos pelo ruivo nunca chegassem aos seus ouvidos. Essa era a intenção. Quero evitar mais derramamento de sangue, e um possível confronto com Simone. Não me entendam mal. O medo é algo que todos possuímos sim, mas este não é o caso aqui. Sempre fui de evitar e preferir ignorar algo que me incomoda a ter que bater de frente. Isso só me trouxe brigas desnecessárias e fez-me esgotar minhas energias a troco de nada importante. E é isso. O segredo está na importância que damos às pessoas e às situações ao nosso redor. A esta altura todos sabem que a importância de Simone em minha vida pode ser comparada a um zero.

Entre aquele sábado fatídico e o dia de hoje em que me encontro, passaram-se exatamente duas semanas. E aqui estou eu, sentada em frente à minha televisão, sem ânimo algum para nada, mais uma vez. Bem que minha irmã e Hugo tentaram me animar, fazendo propostas irrecusáveis para que eu saísse de casa, mas infelizmente declinei todas elas. Precisava de um tempo sozinha comigo mesma. Os dias no trabalho e na faculdade correram normais, normais demais. Tudo tranquilo, nada de anormal. Sempre fui uma aluna aplicada e interessada, e isso não mudou. Talvez a única coisa que mudou foi o fato de que parei de tentar socializar. Os fones de ouvido como sempre, foram  meus únicos amigos nas horas de solidão. A cada música, meu peito tentava encher-se de algo que ainda não tinha um nome definido. Tentava buscar a resposta e tantas outras respostas para todas os meus problemas internos, apesar de ter com quem conversar. Só era teimosa demais para dividir com os outros todos os meus medos e paranoias. Continuaria carregando o fardo enquanto pudesse.

Quando dei por mim, estava assistindo a um programa de culinária. A receita era bolo de cenoura com cobertura de chocolate. Isso estava ficando mais interessante. Enquanto prestava atenção à forma como o chef triturava as cenouras, senti meu celular vibrar. Peguei-o e constatei que se tratava de um número que não conhecia. Confesso que pensei em não atender. Mas meu lado curioso falou mais forte quando apertei a tecla verde.

"Alô?" Minha voz soou curiosa, o que não era nenhuma novidade.

"Oi Gabriela..." Aquela voz... Não pode ser.

"Como conseguiu meu número?" Era a pergunta que não queria calar.

"Sua irmã me deu... Fiz mal em ligar para você? Não é uma boa hora? Olha... precisamos conversar sobre o que aconteceu, você não concorda?" Por mais que pensasse em negar, ele estava certo.

"Não...não é isso ruivo...Sei que precisamos conversar. Mas agora não é uma boa hora." Adiaria o quanto pudesse.

"Por quê? Está ocupada?" Por que digo eu! Que direito ele tinha de mexer com meu psicológico, usando essa voz contra todo o meu corpo, que só sabia reagir à ele. "E a propósito, adoro quando me chama assim..." Como suportar este martírio senhor?

A garota dos fones de ouvidoWhere stories live. Discover now