DEZESSETE

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"O diabo pode citar as Escrituras quando isso lhe convém."

William Shakespeare

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O grito estridente que saiu daquela boca pode ser ouvido no andar inteiro. A forma como seu rosto tornou-se um grande vermelho, deixando sua pele branca com um tom rosado, somente piorava a medida em que ela se aproximava de nós.

O barulho do seu salto plataforma ecoou pela sala, enquanto Johann e eu tentávamos nos recompor em meio à súbita intromissão da loira de farmácia.

"O que você está fazendo aqui Johann??? Com essa piranha??? Como pôde fazer isso comigo???" Simone apontava o dedo na cara do ruivo, acusando-o por motivos óbvios.

"Piranha??? Com quem pensa que está falando, sua mal educada?" Nem deixei o ruivo se explicar, pulando na frente dele, terminando de vestir minhas roupas. Meu cabelo ainda era uma bagunça, mas mantinha a pose na frente da insuportável Simone.

"Estou falando com você mesmo...querida...Quem pensa que é para tirar o que é meu?" A olhava com total espanto. Sabia que era errado ficar com o namorado dela, mas não esperava essa reação tão baixa. Bem, na verdade esperava sim.

"Como é que é Simone? Seu? Eu não sou sua propriedade garota!" Acredito que Johann cansou de apenas observar e decidiu se pronunciar contra a loira azeda.

"Eu sei que não é...mas isso não dá o direito dessa vagabunda te tirar de mim!!" Simone estava totalmente descontrolada, andando muito próxima a nós, como se estivesse preparando o bote.

O que ela não sabia é que eu estava preparando o meu.

"Quantas vezes vou ter que repetir Simone? VOCÊ NÃO É MINHA DONA CARAMBA, E NÓS NÃO TEMOS NADA!!!.NADA!!! VOCÊ É A DROGA DA MINHA MEIO-IRMÃ!!!! Enfia isso na sua cabeça!" Não tinha visto o ruivo naquele estado ainda. E confesso que esperava não vê-lo assim tão cedo novamente.

"Mas não somos filhos dos mesmos pais! Não temos o mesmo sangue! Nada nos impede de ficarmos juntos! Você sabe que eu te amo! Por que precisa dessa garota idiota quando pode ter a mim??"

Estava em completo choque. Então era isso. Eles são irmãos. Por isso toda a proximidade. E pelo visto algo mais além disso, pelo menos da parte da loira aguada, que não parecia se conformar com o desprezo de Johann.

"Então vocês dois...são irmãos?" Foi a única coisa que consegui dizer. Minha cabeça ainda estava muito confusa com todas as informações que recebi.

"Simone, vai embora? Essa discussão acabou. Eu já te disse tudo que precisava ouvir. Acredito que não irá se humilhar mais, não é?" A voz do ruivo não estremeceu em nenhum momento. Permanecia firme e decidida a tirar a loira para longe de nossas vistas.

"Eu vou sim... Mas não antes de dizer mais umas verdades na cara dessa pilantra!!" Vinha em minha direção, parecendo prestes a levantar a mão em meu rosto, mas parou abruptamente à minha frente.

"Morde essa língua para falar de mim, você está no meu apartamento!" Levantei meu tom de voz, deixando bem claro à ela que não tinha medo de suas ameaças.

O ruivo fez menção de nos separar, mas fiz sinal para que ele permanecesse onde estava. Cuidaria disso sozinha.

"Se está pensando que vou deixar isso barato, você errou feio. Não vou engolir esse seu romance com o meu irmão. Ele é meu, e só meu. Vou fazer tudo que estiver ao meu alcance para destruir todas as chances que você pensa ter com ele. Está avisada." Disse, fazendo sua melhor cara de nojo antes de tentar sair.

Isso mesmo. Tentar. Porque ela iria me ouvir primeiro. Peguei-a fortemente pelo braço, fazendo com que ela me dirigisse um olhar espantado. Consegui o meu propósito.

"Escuta aqui sua piranha de quinta... Eu não tenho medo de você, e muito menos das suas ameaças..." Continuava apertando firmemente o braço da loira, que permanecia imóvel encarando-me surpresa. "Pode tentar. Mas já aviso que não vai conseguir nada. Tinha até um certo remorso por pensar que o ruivo era seu namorado, mas agora que descobri que não é, tenho pena de você. Vive mendigando o amor dele, mesmo quando já foi rejeitada. Tadinha... Mas pode deixar viu? Vou cuidar muito bem do ruivo..." Adoro um deboche. E adorei cada segundo que pude debochar da cara de Simone ao vivo e à cores.

"Eu vou te matar cadela!!!" Quando dei por mim, Simone segurou firme meus cabelos, puxando-os com força, o que fez-me gritar alto.

"Piranha loira!!!" Consegui me desvencilhar de Simone, acertando um tapa em seu rosto. O barulho foi forte, e deixou uma grande marca.

Johann apressou-se em nos separar, parando entre nós, colocando seu corpo em frente ao meu, protegendo-me. Não que eu precisasse de proteção, muito pelo contrário. Quem precisava se cuidar era Simone.

"Simone vai embora agora!!! Antes que eu mesmo cometa uma loucura!!" Não pude ver o rosto do ruivo, pois estava atrás dele, segurando seus braços, mas podia ter um vislumbre de que estava praticamente da cor de seus cabelos. Vermelhos. Assim como o rosto da loira à nossa frente.

"Mas...Johann...Você..." Simone gaguejava, em uma perda total de palavras.

"VAI!!!" Gritou mais alto ainda, e pude ver o medo nos olhos da loira, que apenas assentiu antes de sair apressadamente de meu apartamento, fechando a porta com mais força do que o permitido, batendo-a e causando um enorme barulho.

Ainda estava em choque. Por tudo o que houve. Por todas as coisas que ouvi e presenciei. Por todos os sentimentos confusos dentro de mim agora. Minhas pernas fraquejaram, e só não fui ao chão por causa do ruivo, que segurou-me bem a tempo, antes que caísse, amparando-me em seus braços. Me senti protegida. Mais protegida do que nunca. Aqueles braços fortes me abraçaram e me acolheram, parecendo saber exatamente como acalmar meu coração.

Não sei quanto tempo ficamos em silêncio, abraçados no meio da sala. Meus batimentos cardíacos ainda estavam acelerados, e meus olhos permaneciam fechados, enquanto repousava a cabeça no peitoral de Johann, escutando seu próprio coração bater da mesma maneira. Aos poucos fui dominada por uma sensação de paz, sentindo suas mãos acariciarem meus cabelos, e sua respiração descompassada começar a se estabilizar.

Ele me devia explicações. Muitas. Várias. E estava afoita por elas. Por que não me disse antes que era irmão de Simone? Teria nos poupado de todo esse sofrimento. Me poupado de tantas noites em claro, suspirando por arrependimento de sequer pensar em querê-lo. Quando eu podia esse tempo todo querer. Levantei meu rosto para encarar aquela beleza ruiva, encontrando seu olhar dentro do meu. Era só o que precisava para começar.

"Você tem muitas explicações à me dar ruivo..." Disse, soltando um meio sorriso, recebendo de volta o sorriso mais lindo que já vi em toda a minha vida.

" Disse, soltando um meio sorriso, recebendo de volta o sorriso mais lindo que já vi em toda a minha vida

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A garota dos fones de ouvidoWhere stories live. Discover now