ROSAS BRANCAS - Parte 3

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Victória

Eu não sei... De nada sei.

— Quem me trouxe até você, Helena?

— Eu já te disse, Vic... Seus amigos, aquela turma bagunceira, te trouxe toda zonza e desconjuntada. Minha filha, você não pode continuar assim...

— Não... — ignorei a bronca, falando convicta. — Nenhum deles faria nada por mim. Deixa para lá... Eu devo ter sonhado tudo. Foi mais uma ilusão da minha cabeça.

Ilusão... Ilusão... Meu consciente repetia constantemente essa palavra. Acho que os poucos anos de uso de muita droga havia me afetado seriamente. Qual seria o próximo passo? O precipício enfim? Ou melhor, as rosas brancas?

***

— Uma aposta? — ri, mas fiquei nervosa.

— Se você conquistar o cara mais lindo e disputado dessa academia, você vence.

Aquela loira estava tentando zombar de mim. Aqueles brincos chamativos e cintilantes quase berravam isso.

— Para que eu faria algo assim? Eu não preciso provar nada a ninguém...E acredito que você também não queira isso.

Minha provocação tomou lugar e se refletiu na ira dos olhos daquela garota que brilhavam quase tanto quanto aqueles brincos cafonas. Mas logo se recompôs para alfinetar mais:

— Você não consegue, Victória. Não tem mais nada para oferecer... Você é um tédio que só! Ninguém te suporta.

Eu ri até engasgar, é claro. Amava quando as pessoas cediam aos próprios pensamentos. Ela não estava muito equivocada...

— Eu devolvo então.

— O quê?

Tirei meu isqueiro de prata e fiquei tilintando nele enquanto falava:

— Estou certa de que eu não precisaria fazer nada para ter qualquer um aos meus pés... Mas, e quanto a você? Conseguiria?

Fixei bem meus olhos nos dela, sabendo que ganharia naquela provocação. Não demorou muito para ela grunhir de irritação. Eu ri, me levantei e deixei o isqueiro na mesa. Eu não queria mais aquilo... Nada que reluzia ali era verdadeiro, inclusive aqueles brincos ridículos cujos nem pertenciam a ela. Ridículo! Aquilo era tudo uma ilusão.

— Vá praticar Pilates. Você está precisando — falei por fim.

***

Eu podia sentir que logo o Henrique me encontraria e, enfim, eu teria o meu fim. Aquela vida estava me parecendo escorregadia demais. Mesmo sem o efeito de qualquer substância, eu ainda via embaçado, disforme, sinuoso... Eu me sentia vivendo num quadro abstrato. Aliás, faltava pouco para a minha pintura exclusiva do Romero Britto chegar. Ele iria representar a catarse da minha vida, assim como a minha atual visão, só que com um pouco mais de cor.

E se eu estimulasse mais os sentidos? Sem uso de nada interno... Só no externo? Helena também gostava de pintar, então tinha muitos tipos de tintas e cores. Isso seria interessante. Juntei tudo bem no meio da sala. Mas, ainda faltava muita coisa. Peguei todos os esmaltes que encontrei... Havia dúzias. Garanto que a maioria não eram meus. Tanto melhor. Fui até meu guarda-roupa e peguei as peças mais caras. Seria suficiente? Cebola... Eu detestava o cheiro da cebola. Perfeito! Fui até a cozinha e peguei vários temperos, incluindo a cebola, é claro. Piquei tudo em cima das roupas. Eu era tão ruim que não chorava nem assim... Peguei um pincel de parede e contemplei as roupas estendidas por toda a sala. Cheirava terrivelmente. Que bom! Eu ainda tinha nariz. Se enganaria quem pensasse que me pus a pintar aquele bando de peça já totalmente estragado a base do alho, do agrião e de muita, mas muita cebola. Num ímpeto passei o pincel com uma tinta fabulosamente vermelha bem na minha cara, cobrindo meu nariz. Agora sim eu nada enxergava e entupi o nariz com tanto estímulo. Caso eu nada sentisse, seria de fato o sinal de que eu não estava viva...Ah, mas eu estava! No meu melhor estilo sem sentido, eu estava viva! Cantarolante e dançante, passei a pintar cada móvel do lugar, enquanto sambava na que era a saia predileta da minha mãe. Que diversão! Mas, logo um telefonema perfurou meus devaneios e me fez perceber que eu ainda tinha ouvidos. Seria o Henrique?

— Já estou indo, Bassanesi!

Logo eu despertei.

Parte final em 29/08/2020 -------------->

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FRAGILIZADO - Livro 3 [COMPLETO] - Trilogia Irmãos AmâncioWhere stories live. Discover now