Ecos do esquecimento

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_ Podemos fugir de novo?
_ Você quer cutucar a onça com vara curta. Ele nos achou. Vai nos seguir de perto. Acabou.
_ Simples assim?
_ Fazer o que? Foi bom enquanto durou.
_ Não vou perdoar o que ele fez com você.
_ Não precisa me defender, já passou. Você pode voltar e rever os nossos filhos. Os seus outros maridos.
_ Mas você me queria só para você. O que mudou?
_ Meu surto de egoísmo passou. Eu sei como eles se sentem. Sei o quanto dói.
_ Ele é intransigente _ reclamei do Uriel.
_ E autoritário, prepotente, arrogante..., mas ele te ama como eu.
_ Vou fazê-lo sofrer.
Sentiu pena dele _ É justo _ me deu razão mesmo assim.
_ Posso pedir divòrcio?
_ Não vai querer o divórcio.
_ Como você sabe?
_ Eu conheço você _ passou o polegar sobre os meus lábios _ Vamos logo. Ele está esperando lá embaixo.
Levantei e olhei pela janela com cara de zanga. 
_ Já que não tem jeito.
Nos vestimos e pulamos da casa na árvore. 
Encarei o loiro, contendo o monte de desaforos que eu queria lhe dizer. Ele não me encarou. Simplesmente, seguimos por onde eles indicavam. Até um amplo jardim com uma casa imensa.
_ Você tem mesmo mania de grandeza, não é? _ censurei o loiro, que não gostou do que eu disse, mas não respondeu.

Ainda caminhava no jardim, quando outro híbrido sorriu e veio para mim, me abraçando. Fez isso com um jeito terno, que foi impossível não retribuir ao seu carinho. Me vi dentro do seu beijo e, nem lembrava o seu nome.
_ Will _ respondeu ao meu pensamento.
Afirmei ainda encantada com a sua gentileza.
_ Onde você esteve?
Abri a boca, mas ele já tinha ouvido tudo nos meus pensamentos.
Continuou _ Pelo menos você se divertiu. Senti muito a sua falta, mas não faz mal. Você está de volta.
Só aí, ele levantou o olhar de mim e viu o Lui _ Híbrido _ rosnou desagrado _ Eu vou te matar, Lui. Eu chorei a sua morte _ cobrou.
_ Perdeu a vez para o Uriel _ o Lui retrucou.
Relembrei a cena em minha mente e a minha raiva do Uriel reinou sobre mim.
_ Onde está o Christian e os lobinhos? _ o Lui quis saber.
_ Ficaram na Romênia.
_ Meus filhos? _ eu queria vê-los.
_ Estão com o pai. O Christian se casou com outra _ o Uriel disse a queima roupa.
Acho que ele estava bravo comigo e, queria ir a forra.
_ Ótimo _ aprovei totalmente _ Pode me mostrar o meu quarto, Will? Adoraria tomar um banho.
Todos ficaram em silêncio por um instante, antes do Will atender ao meu pedido.
As gotas de água do jato do chuveiro fazia um barulhão. Assim que terminei o banho ouvi a conversa entre os três.
_ Podemos fazer o Marcos desfazer _ o Lui sugeriu.
_ Não dá mais _ o Uriel lamentou.
_ Ela não é mais a mesma. Viu como ignorou a informação sobre o Chris?
_ Ela o amava tanto _ o Lui comentou _ Até me deixava com ciúmes.
_ Quem de nós não sentia ciúmes do casal _ o Will soou óbvio.
Eu não lembrava deste Christian, nem dos nossos filhos. Parece que eu realmente não sou mais a mesma.
_ Vocês estão falando de mim _ cheguei recém vestida com os cabelos molhados _ Podem falar comigo?
Silêncio.
_ Você quer ver as crianças?
_ Quantos anos as crianças têm?
_ Farão dezessete depois de amanhã.
_ Já? _ o Lui pareceu surpreso.
_ Você me disse que eles eram adultos _ cobrei do Lui.
_ Eles tinham mais que doze. Eram fisiológicamente adultos.
Senti um impulso de raiva pelo trapaceiro, mas deixei para lá _ Eu preciso vê-los _ declarei.
Uriel tinha um ar preocupado, contemplando as estrelas no horizonte. Pareceu se esquecer que eu podia ouvir os seus pensamentos, e deixou escapar algumas informações sobre o novo casal. O híbrido, com quem me casei, havia se casado com minha irmã gêmea. Nos pensamentos dele, eu iria sofrer por causa disso. Mas, na real, eu não lembrava nem o nome dele. 
Era cedo da noite, quando chegamos na Romênia. Lembrei da minha casa, eu a comprei e mobilhei. A minha gêmea foi quem nos atendeu. Um moreno surgiu atrás dela e me encarou como se contemplando um fantasma. Levou um segundo para vir me abraçar.
_ Helena... Como isso é possível?
Eu não sabia o que dizer, foi o Uriel quem explicou o que aconteceu, para todos, depois que entramos. Estávamos jantando, eu observava meus adolescentes. Lembrava deles bebês, e de todas as suas fases até os doze. 
Ficamos hospedados em quartos separados, mesmo que eu quisesse o Lui comigo. O Uriel é muito chato e todos acatam as suas ordens. Eu não.
Fui para o quarto do Lui assim que o movimento diminuiu.
 Mas antes, depois do jantar, passei um bom tempo com os meus filhos. Jogamos basquete na quadra externa. Meninas contra meninos. Eram muito habilidosos, em três dias eles ganhariam garras e, ficariam muito melhor.
No interior da casa, os adultos conversavam sobre mim. Parecia ser um grande problema a minha amnésia.
O Jacob propôs _ Por que não obrigamos o Marcos a consertar isso? _ ouvi enquanto jogava.
_ O Marcos está morto _ o Uriel esclareceu finalmente _ Ele me pediu isso mais uma vez e, eu cedi. 
_ E agora? _ o Jacob soou a decepção.
_ Agora nós vamos ter que viver com isso _ o Will estava igualmente decepcionado.
O Lui era o único que não se manifestava. Estava tudo bem para ele. Sendo franca, para mim também.
As florestas da Romênia são únicas. Estávamos reunidos para a estreia dos novos membros da alcatéia. Algumas imagens disso, em um passado semelhante a outra vida, me vinham a mente. Eu fui parte dessa alcatéia, mas agora, eu tinha a minha própria família. Reconheci os meus entre os muitos lobisomens. Híbridos, como eu, outros, além de mim, o Lui, o Will e o Jacob. O Uriel era um mistério no meu radar. Não sabia bem, o que ele era.
_ Você... O que aconteceu com você, Helena? _ uma velha senhora me saudou de perto.
_ Perdi minha memória _ tentei justificar, algo no jeito dela me incentivou, parecia me querer bem.
_ Não foi só isso que você perdeu, perdeu a sua alma. Onde está o seu coração?
Que tipo de pergunta era essa? _ Eu... _ neguei sem saber como responder, ou entender o que ela dizia.
_ Mama _ chamaram-na e ela se afastou hesitante.
Senti um certo alívio, com isso, não nego.
Minhas crianças viraram lobisomens. Senti um impulso me levar junto e não só eu. Todos corremos juntos, até o Uriel. Na corrida, me perdi do Lui, embora ele fosse o meu alvo. Estava em uma imensa plantação de girassóis, quando alguém me pegou em um abraço quente. Aquele cheiro que me confundia. Era o Uriel.
Sua ardente paixão me envolveu. Foi impossível resistir, mesmo tentando e, eu tentei. A confusão mágica, que unia todas a mentes presente naquela corrida, entorpecia os sentidos, de modo que, tudo parecia um sonho. A noite foi quente e a manhã nos despertou para a realidade.
Vesti minha roupa e me afastei dele, sem falar. O seu interesse sobre mim, naquele olhar, ele queria conversar, mas eu não. Fui de volta para o local do início, onde estavam meus sapatos.

Calçava meus sapatos, quando ela se aproximou e me chamou como quem quer contar um segredo. Me inclinei para a senhora. Mama tão pequena que dava para duvidar que fosse uma lobisomem, ou a líder dos mesmos.
Quando a encarava de perto, sorri correspondendo ao seu doce sorriso. Passou a mão na minha testa, da esquerda para a direita e disse: Encontre-se.
Helena
Era manhã, quando acordei nua e grogue como uma humana. Levantei o olhar para aqueles olhos verdes atentos sobre mim. Lui também estava nu, deitado ao meu lado. 
_ Bom dia, linda.
Sua voz melodiosa e sexy fez um arrepio percorrer o meu corpo. Seu cheiro era delicioso e ele estava tão belo, quanto na primeira vez em que eu o vi.
_ Bom dia. O que aconteceu? _ falei sem me mover.
_ Você adormeceu enquanto fazíamos amor. Como sempre _ soou divertido.
_ Onde estão os outros?
_ Outros!?
_ Sim, Lui _ soei óbvia.
Olhei ao redor, não reconhecendo o lugar _ Onde estamos?
_ No hotel _ lançou-me um olhar preocupado _ O que há com você?
_ Lui, onde está o Uriel, o Will, o Chris? O que você fez?
_ Como você conhece o Uriel e quem é esse Chris? 
_ É uma piada?
_ Helena, acho que você ainda está bêbada da nossa festa de ontem. Estamos em um hotel, esperando o próximo vôo para França. Onde passaremos a nossa lua de mel. 
Olhei para os meus braços sardentos _ Eu sou humana!
O Lui gargalhou _ É. Me diz o que você bebeu, que eu quero um igual _ continuou sorrindo.
_ Em que ano estamos?
_ Mil novecentos e sessenta. Faz uma semana e dois dias que nós nos conhecemos. Nos casamos ontem. Você não se lembra? Isso é muito ofensivo.
_ Lembro bem mais do que isso.
Contei toda a história da minha vida para o Lui durante aquele dia. Era noite, quando terminei. Estavamos no quarto da sua casa em Paris, deitados na cama. Olhei no seus olhar pensativo ao terminar.
_ Desculpe-me por ter te feito viver assim. Não foi o meu intuito ser tão idiota. Neste momento, assim como no momento em que selei o seu destino, eu só queria te fazer feliz. Ser feliz. Não deu muito certo, não é?
_ O que está dizendo, Lui? Aquilo foi real ou um sonho?
_ Foi real... E um sonho.
Não consegui compreender e o olhei com cara de interrogação.
_ Vampiros não vêm o mundo como os humanos. É normal, para um vampiro, viver em duas ou mais realidades ao mesmo tempo.
_ Mas eu sou humana.
_ Relativamente sim e não _ sorriu _ O tempo não é linear, ele é relativo. Você está em uma fenda agora.
_ Porquê?
_ Eu não sei.

Numa Noite Sombria Where stories live. Discover now