O Derradeiro Final

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Certo, agora é sério.

Já entendi que bati o recorde do Jason há uns três desmaios atrás e se ainda tiver um neurônio normal na minha cabeça depois de tanta pancada é um milagre!

Juro que não desmaio mais até o fim dessa droga de missão!

Esses foram os únicos pensamentos que surgiram no momento que recobrei a consciência. Eu estava com raiva. Não, eu estava irada! Minha garganta vibrou com um rosnado baixo e abri os olhos na força do ódio encarando um teto baixo e que parecia ondular com as sombras projetadas por uma tocha que iluminava o local precariamente. Apertei os dedos sentindo algo macio e confortável sob meu corpo e me sentei em um pulo, minha cabeça protestando com o movimento repentino.

- Merda.

Massageei as têmporas e percebi, surpresa, que meu pulso deslocado estava curado. Quando o mundo parou de girar diante de mim franzi o cenho, intrigada. Porque de todos os lugares que esperei ser posta pelos capangas do Mestre nunca esperei algo tão...luxuoso. Apalpei a calma abaixo de mim, admirada com o dossel intrincado e os lençóis de linho fino e seda vermelha com travesseiros e almofadas macios dispostos perto da cabeceira além das cortinas diáfanas que pendiam dos quatro cantos do topo da cama. Pisquei, esperando acordar daquela loucura, mas tudo continuou igual. Afastei as cortinas apenas para ver que o luxo não terminava no móvel que eu estava deitada: Jarros de barros coloridos estavam dispostos ao lado da cama assim como uma bacia dourada, desenhos e pinturas pontilhavam as paredes de areia vermelha e um tapete felpudo cobria o chão completamente, um espelho enorme de moldura dourada estava disposto entre duas tochas, a única iluminação do local. Levantei quando senti minha cabeça parar de latejar, sentindo o tapete fazer cócegas em meus pés descalços.

Espera, onde estão meus tênis?

Encarei o chão, os olhos arregalados ao ver não só meus pés nus como minhas pernas expostas, apenas uma saia longa e de tecido quase transparente que ia até os pés. Em poucos passos rápidos eu estava em frente ao espelho e quase me engasguei ao ver meu reflexo.

Onde diabos foram parar minhas roupas?

Porque no lugar de minha blusa do acampamento e das calças jeans, meu corpo estava coberto com uma túnica de linho branco e aveludado, quase um vestido tubinho até o meio das coxas enquanto um tecido dourado e transparente, uma espécie de véu, estava jogado por cima, descendo até os calcanhares e preso na cintura por faixas coloridas, tão apertadas que modelaram minha cintura como um espartilho. As mangas curtas de linho branco também eram cobertas pelo véu estranho que fazia meu braço pinicar e deixavam as cicatrizes brancas em meus braços à mostra enquanto a gola ia do meu pescoço até pouco acima dos seios, larga e colorida, com meu colar de cobre sobre ela. Atordoada, arregalei os olhos me analisando dos pés à cabeça, sentindo meu corpo ferver de raiva ao imaginar uma daquelas criaturas idiotas trocando minhas roupas.

- Só faltou a peruca e o Kohl nos olhos para eu ser a verdadeira Cleópatra! – Murmurei, indignada quando tentei girar no lugar e senti o vestido de linho dificultando meus movimentos, minhas pernas limitadas à passos curtos. Rosnei, os punhos cerrados. – As egípcias não precisavam correr nunca? Muito esperto, Mestre maldito.

Minhas reclamações e xingamentos foram interrompidos quando ouvi passos do lado de fora, finalmente percebendo as grades de ferro que separavam meu quarto-cela do corredor do outro lado. Ainda sou prisioneira apesar de toda essa mordomia. Não esqueça disso, Eduarda. Os passos pesados se aproximaram ainda mais e desci minha mão até meu pulso, finalmente percebendo que minha pulseira não estava ali. Frustrada e irritada, me pus em posição de combate, ou tentei já que o vestido idiota mal deixava eu afastar os pés ou erguer os braços. Tentei rasgar a saia de linho, abrir uma fenda ou apenas despedaçá-la, qualquer coisa que me ajudasse a me mexer melhor, mas aquela droga parecia feita de aço e não de tecido. Sem uma lâmina não dá pra fazer nada! Olhei ao redor do local e segurei a bacia dourada, a única "arma" ao meu alcance, e erguia-a o máximo que as mangas apertadas permitiam. Os passos pararam em frente a cela e a tocha que a criatura trazia me permitiu ver o que era aquilo: uma harpia. Mas seus movimentos, sua postura, tudo indicava que ela não era uma das harpias idiotas e sem noção. Ela me encarou com as presas a mostra em um sorriso medonho e ouvi o tilintar de chaves. O ranger da cela abrindo encheu o ambiente silencioso e a coisa entrou calmamente, se aproximando rápido, as pernas longas e cadavéricas batucando o chão enquanto o corpo coriáceo e esquelético ondulava. As garras seguravam a tocha com firmeza e as asas estavam fechadas contra o corpo.

Realidade ImagináriaWhere stories live. Discover now