capítulo quatorze

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— Eu te disse para não entrar nesse quarto.— disse Kinn quando ele trouxe a refeição.

Pete pegou a bandeja e ignorou o que foi dito. Nos últimos seis dias desde que Vegas tinha saído, ele aperfeiçoou a arte de ignorar o chefe de segurança. Não foi difícil. Ele não sabia o que Vegas tinha falado para Kinn, mas esses dias o moreno corpulento mal ousava olhar para Pete quando trazia a comida.

Era muito engraçado como Kinn evitava minuciosamente fazer qualquer contato com os olhos. Era um contraste gritante com a forma como o cara se comportou antes: o jeito que ele olhava para Pete mantia ele sempre desconfortável. No entanto, agora, o cara mal olhava para ele, mesmo quando fazia cara feia e repreendia Pete por alguma coisa.

— Ele vai ficar bravo se voltar e te encontrar aqui — Kinn persistiu.

Pete deu de ombros.

— Ele deveria ter trancado a porta do quarto, então — disse ele, ligando a TV e se acomodando melhor contra os travesseiros.

A televisão era a principal razão pela qual Pete vinha estado confinado no quarto de Vegas  mais do que em seu próprio quarto. Ele não  se deu o trabalho de acatar a desaprovação de Kinn quando ele o surpreendeu no quarto de Vegas, pela primeira vez há vários dias.

Embora a maioria dos canais fossem americanos, era um alívio ter algo para ocupar a sua mente da situação que estava e do tédio roendo seus sentidos.

Pete era uma pessoa social. Ele nunca tinha sido tão bom em se entreter sozinho e nada estava acontecendo. Às vezes, ele iria ver os guardas rindo, bebendo e trocando piadas sujas no quintal. Às vezes, ele ficava ouvindo sons distantes de músicas e bêbados risos através da porta.

Parecia que depois que o chefe saiu, seus homens passaram a serem relaxados e indisciplinados. Eles nunca se comportaram dessa forma quando Vegas estava na casa. Pete começou a pensar que se ele não tivesse preso, poderia ter escapado totalmente despercebido.

— Você não deveria estar aqui — disse Kinn.

Pete se serviu um pouco de café e tomou um gole, observando Kinn por cima da borda de sua caneca. Ele sabia que Kinn queria ele e tinha notado isso desde o primeiro dia. Ele tinha certeza de que Kinn era enrustido e considerou usar ele para escapar. Contudo, a ideia de o seduzir, revirou seu estômago. Ele não conseguia sequer pensar. Ele só não achava o cara atraente, mas também não sentia nada, nem mesmo segurança com ele. Ao contrário de Vegas, Kinn poderia ser violento, sem qualquer motivo.

Pete lembrou o brilho sádico em seus olhos quando Kinn tinha visto os guardas o batendo. Ele tinha que ter cuidado.

— Tenho certeza de que é você que não deveria estar aqui — Pete disse calmamente. — Você deveria me trazer comida e, em seguida, sair. Seu chefe não teria prazer em descobrir que você está desobedecendo suas ordens.

Pete não podia negar que era bom saber que as ordens de Vegas estavam o protegendo. Obviamente Vegas tinha algumas segundas intenções para dar
tais ordens, mas o fato era que Kinn não podia fazer nada com ele. E ambos
sabiam disso.

Kinn fez uma careta e saiu, murmurando em inglês que Pete iria se arrepender uma quando Vegas retornasse.

Pete mordeu o lábio.

Verdade seja dita, ele não tinha certeza que Kinn estava errado. Estritamente falando, Vegas não tinha explicitamente lhe permitido entrar em seu quarto. Vegas tinha simplesmente o deixado no cômodo, após aquela noite.

Suspirando, Pete afastou sua caneca para baixo e começou a passar os canais, tentando ignorar a sensação inquieta sob sua pele. O tempo estava passando muito lentamente. Era quarta-feira e Vegas não iria voltar até amanhã.

Pete sentiu agoniado com a impaciência. Ele se sentia como se estivesse preso no limbo, à espera de qualquer notícia do mundo exterior. Tinha sido quase três semanas desde seu sequestro e ele tinha muitas perguntas que precisavam de respostas. Ele continuava pensando no que estava acontecendo com sua família e amigos. Ele estava preocupado com Porsche: seu amigo estava deprimido demais para ser deixado sozinho por tanto tempo. Será que ele estava comendo? E, certamente, o pai de Pete deveria saber agora que ele tinha sido sequestrado. Será que ele foi avisado? E a mãe dele? Será que houve algum pedido de resgate?

Pete fez uma careta. Não fazia qualquer sentido. Vegas não precisava de dinheiro. Ele era podre de rico, a sua rede oficial fazia dele um dos homens mais ricos da Tailândia. Mas se não fosse dinheiro que Vegas estava atrás, por qual razão Pete continuava alí? Claro, a coisa toda de sequestro poderia ser um simples ato de vingança contra seu pai, mas Pete não tinha sido prejudicado. Então, qual era o ponto?

Antes da chegada de Vegas, seus capangas o agrediram um pouco, mas Pete não achava que tinha sido por ordem de Vegas. Ou era?
Vegas estava apenas fazendo algum joguinho psicológico? Porra, era tudo tão desconcertante e frustrante, mesmo sem levar em conta que a coisa entre ele e Vegas estava tornando difícil de ignorar.

Duas vezes.

Aconteceu duas vezes.

Não era nem sequer os boquetes que incomodavam Pete. Era a atração e a intensidade quase servil que o puxava. Como ele podia ter qualquer atração por um homem frio e manipulador que ele nem mesmo gostava?

Que loucura.

Pete riu alto. Sim, definitivamente. Era uma besteira muito grande. Ele havia prometido a si mesmo que estava cansado de se envolver com idiotas. Ele havia jurado. Ele queria conhecer um cara legal, se apaixonar, e começar uma família com ele. Uma família real. Um marido, muitas crianças e uma casa agradável e acolhedora cheia de risadas, alegria e amor.

Porsche o chamava de romântico incurável, mas Pete não se envergonhava de seus sonhos. Tendo crescido com um pai distante e uma mãe que tinha vivido separadamente a maior parte de sua vida, Pete sempre tinha desejado ter uma casa e uma família. Ser gay complicava tudo um pouco, ou muito, considerando o quão homofóbico seu pai era, mas Pete se recusou a desistir de seu sonho.
É o século vinte e um e os gays podem se casar em alguns países. Havia maneiras de ter filhos, também: adoção, inseminação. Seus sonhos eram realizáveis. Ele só tinha que encontrar o homem perfeito para construir uma vida e parar de ficar pendurado em otários.

Pete deu um sorriso torto.

Até agora, ele estava fazendo um trabalho fantástico. Vegas fez todos os seus ex-namorados parecerem um bando de santos em comparação as coisas que faziam juntos. Seus ex eram apenas paspalhos; eles não eram como Vegas em uma porção de coisas, ainda mais como raptar pessoas e níveis de ações superiores muito mais desagradáveis. Ainda que tivesse toda uma visão negativa de Vegas, Pete deixou que mesmo assim o cara o tocasse e enfiasse o pau em sua garganta quando ele quis. O pior é que ele queria fazer de novo e estava ansioso para isso. Era constrangedor, até mesmo para seus padrões lamentáveis. Porsche iria chamá-lo de idiota e estaria absolutamente certo.

Suspirando outra vez, Pete concentrou sua atenção na tela televisiva. Ele estava vendo um episódio de Masha e o Urso. Tinha visto isso antes com seu afilhado Porschay, mas por algum motivo, o desenho animado era muito mais engraçado em inglês e Pete se pegou rindo das travessuras bobas da personagem.

— O que você está fazendo aqui?

O sorriso de Pete escorregou de seu rosto.

cruel × vegaspeteWhere stories live. Discover now