Capítulo 28

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— Olha que memória belíssima! — Fellicia estava de frente para um quadro, onde eu e Edrian estávamos sentados juntos, sobre um tronco caído. Suas asas grandes e douradas pareciam descansar sobre seu colo. Elas não estavam ali antes, mas ele as havia invocado para que eu mexesse. Novamente sua voz ficou muda, mas conseguir enxergar seu rosto perfeitamente.

— Antes de deixar o quarto do príncipe, tive uma visão trágica e repentina. Nela ele me informou que eu já tinha tocado suas asas antes. — Informei a raposa, confusa com o porque, apesar de ser uma visão, haveriam verdades nela.

— Uma visão? Pensei que humanos não tivessem poderes mágicos.

— Eu não sei o que foi, mas eu vi, então...deduzi que fosse uma visão. Como estou no mundo mágico, essas coisas deveriam ser normais de acontecer. Erdem também disse quando chegamos que poderíamos passar mal até nossos corpos se adaptarem. Eu não tive nenhuma mudança, como meus colegas, então pensei que talvez o efeito tivesse se retardado em mim.

— Isso me parece bem improvável. A magia desse mundo não pode te afetar, porque você sempre conviveu com ela! O anel, o laço, tudo isso tem origem mágica.  — A raposinha se preparou para pular dentro do quadro, dando uns passinhos para trás, balançando o rabinho e então se lançando para dentro. — Pode entrar! Essa memória é interessante! — Sua voz estava diferente, como se conversasse comigo embaixo da água, mais distante.

— Onde estou me metendo...— Sussurrei para mim mesma, sem acreditar que entraria em uma memória que mais se parecia um portal das historias de conto de fadas. 

(Aconselho ouvir a música Silent Forest, da Kikoru, nesse momento)

Assim que meus pés se aproximaram da lembrança e pude coloca-los para dentro do quadro, senti como se estivesse levitando, como se meu corpo não fosse mais tão pesado e qualquer passo meu me faria voar para longe.

Tudo o que estava ao meu redor parecia ter sido construído com vidros delicados, pelas mãos de artesões profissionais, que emolduraram os troncos, folhas e terra com seus dedos, não uma vez, mas milhares, até que se tornasse perfeito. 

Enquanto meus olhos ainda estavam presos nos detalhes, senti as caudas felpudas de Fellicia se enrolarem em meu tornozelo, me acordando para a realidade. Ela sorria, mostrando os pequenos caninos brancos, enquanto seus olhos me pediam silenciosamente para segui-la. Era nítido que aquela não era sua primeira vez dentro das memorias de alguém. E algo me dizia que não seria a ultima.

Começamos a adentrar entre as plantas, que não eram tão resistentes e se desfaziam ao contato como nuvens. Até que no meio de algumas árvores maiores que as demais, percebemos um bosque, com grama baixa e um riacho ao lado de um muro de pedras e flores. Lá estavamos eu, Edrian e uma figura muito antiga, por entre minhas lembranças.

— Eleonor. — Sussurrei, me estagnando no lugar, enquanto a observava.

— Você a conhece? — A raposinha parou ao meu lado, encarando a menina.

— Sim. Mas...já faz tanto tempo.

— O tempo nunca é longo para mim. — Fellicia soltou mais uma de suas enigmáticas frases, antes de voltar a caminhar para perto do trio. Eles não conseguiam nos ver, era óbvio, mas conseguiamos ouvi-los.

— Para, Edrian! — Minha "eu" jovem riu, enquanto o príncipe sorria para ela, colocando um morango em frente a seus lábios.

— Alimente-se e paro de fazer cócegas.

— Ja disse que comi no orfanato!

— Eu aceito! — Eleonor não hesitou em se oferecer, balançando os ombros para se inclinar para perto da fada. — Parece delicioso. — Mas seus olhos ignoraram a presença da fruta.

O Beijo Da FadaWhere stories live. Discover now