Capítulo 6

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Vídeo: Flume - Say It (feat. Tove Lo) (Illenium Remix)

11h20min


Talvez haja uma grande distinção entre dor física e dor psicológica, mas o certo é que ambas levam ao sofrimento do indivíduo. O meu corpo já se encontrava dormente de tanto ficar na cama acompanhada das minhas lágrimas, que por mais tempo que passasse, parecia que as fabricava ainda mais e as deixava cair pelas minhas bochechas.

Quando me levantei da cama, fiquei um pouco tonta, sentindo as minhas pernas como gelatina. O que se tinha passado é que eu não sou suficientemente forte para aceitar o que Enzo me tivera dito. Aliás, toda a minha cabeça encontrava-se numa confusão completa. Eu estava mais que triste com o que ouvira. Fazia-me sentir inútil, pois todo o meu passado talvez tenha sido uma fachada sem eu ter qualquer noção disso.

Sem querer pensar mais neste assunto, caminho lentamente para a casa de banho e entro no chuveiro. Ligo a água quente e deixo cair a mesma livremente sobre o meu corpo ainda um pouco trémulo.

Pego numa toalha incrivelmente fofa e macia e passo pelo meu corpo, após ter saído debaixo do chuveiro. Estava em frente ao espelho da casa de banho. O meu olhar percorreu o meu corpo nu e avistei algumas marcas da noite anterior sobre a minha pele clara.

Okay, Lia. Não vais mais chorar, sê forte. Já enfrentaste coisa pior, certo? O meu subconsciente falava para uma Lia que se sentia magoada e enganada.

Olhei para a aliança no meu dedo e suspiro mais uma vez. Eu tenho que ser forte, encarar esta situação de frente. Não vou mais chorar e fazer-me de coitada naquela história. Sim, eu sou a vítima. Eu sei muito bem disso, mas já chega de pensar nisto.

Vou pensar racionalmente e vou ultrapassar isto. Vou arranjar alguma maneira de um dia poder acabar com esta farsa de casamento.

Caminho para o meu closet e encaro todas aquelas roupas absurdamente caras. Pego numa roupa qualquer confortável, não ligando se o meu querido noivo irá gostar. Quer ele queira, quer não, ele não está em posição de reclamar. Se ele quer uma noiva a sério, então terá uma! Mas eu sabia que tudo isso seria apenas uma máscara para não me sentir tão inferior a ele. Porque, lá no fundo, eu estava totalmente triste.

Saio do quarto indo direto para a cozinha, sem olhar para o lado, pois ele ainda poderia aparecer e eu não estou disposta a encara-lo, não agora e, quem sabe, nunca.

Assim que entro na cozinha, Gabriela olha para mim, arregalando os seus olhos verdes e aminha rapidamente na minha direção.

- Lia! O que se passa? Estás com uma cara de cansaço e os olhos inchados! – Fala olhando-me atentamente, de maneira mais crítica. Como se estivesse a tentar descobrir o que se passara comigo. – Estiveste a chorar?

Encaro-a sem saber o que dizer. – Eu... tive um pesadelo e estou muito cansada. Só mais tarde é que consegui dormir. – Minto com dificuldade. Sabia que não deveria agir daquela forma, mas não estava preparada para falar com ela sobre o que acontecera na noite passada, na cama de Enzo. Mesmo sabendo que Gabriela é uma óptima rapariga.

- De certeza? – Insistiu. Lá no fundo, ela tinha noção de que não fora isso que se passara. Era nítida a desconfiança no seu olhar esverdeado. Assenti sem saber o que dizer. – Okay. Estou a ajudar a Dona Ana a preparar o pequeno-almoço. – Volta para o que estava a fazer, assim que acaba de falar.

- Não estou com muita fome...

- Mas precisas de comer alguma coisa. – Volta-se de novo para mim, olhando-me severamente, como se eu fosse uma criança que acabara de dizer algum palavrão. – Come pelo menos uma peça de fruta.

Suspirei e assenti, caminhando na direcção da banca e pego numa maçã. Quando caminhava na direcção da porta da cozinha, Gabriela voltou a falar, fazendo-me parar.

- Enzo avisou que hoje é capaz de chegar tarde a casa.

- Não me importo. – Dou de ombros e saio da cozinha.

Passei o resto da tarde a ver um filme, ler um livro e aproveitei e fui para o jardim e para a piscina dar alguns mergulhos. Ainda convidei Gabriela. De início, ela não aceitou logo, até porque estava com algum trabalho para fazer. Mas depois acabou por ceder à tentação de dar, pelo menos, um bom mergulho naquela piscina maravilhosa.

Assim, também eu poderia descontrair um pouco e não pensar tanto no moreno de olhos azuis. As palavras dele não me magoaram de todo, mas, sim, o que elas significavam no meu passado. Algo que eu estava disposta a enterrar até então.


23h30min


Subi para o meu quarto na tentativa de dormir e descansar um pouco, mas foi um falhanço completo. Não preguei olho até de madrugada. Virava para um lado. Virava para o outro, e não conseguia dormir. Fechava os olhos e contava até cem, mas voltava a abri-los por me perder na conta. Então, virava-me para o outro lado da cama e voltava a fechar os olhos, começando a contar as ovelhas que saltavam da cerca.

Quando estava disposta a utilizar outra técnica qualquer para tentar dormir, ouvi uns passos no corredor, arruinando a minha ideia. A casa, àquelas horas, estava muito silenciosa e eu não fazia ideia se Enzo já voltara ou não do que quer que fosse.

Ouço uma porta a bater e deduzi que fosse Enzo, reparando, afinal, que o mesmo tivera chegado mesmo muito tarde a casa. Quando voltei a fechar os olhos, fui, novamente, interrompida. A porta do meu quarto fora aberta e fechada logo de novo. Ouvi os passos perto da cama e o seu cheiro fora logo descoberto pelas minhas narinas. Porra de homem! Estava zangada com ele e decidida de que não seria tão fácil conviver comigo a partir daquele dia. Mas bastava apenas inalar o seu perfume e já me deixava com água na boca.

Sinto os seus dedos a acariciarem o meu rosto, proporcionando-me uma sensação de carinho e calma, e algo em mim despertou. Por mais que eu não quisesse. Por mais que eu o odiava. Eu adorava o seu toque. Preenchia-me e fazia sentir-me muito bem.

Do nada, os seus dedos afastam-se dos meus por alguns momentos, fazendo-me abrir os olhos lentamente e com cuidado para que não fosse apanhada. Assim que o meu olhar se normalizou com apenas a iluminação que vinha da janela do meu quarto, um rabo dentro de uns boxers Calvin Klein é a visão perfeita que eu tenho naquele momento. Uma vista espantosa. Mais uma vez, o meu subconsciente martela-me na cabeça, dizendo que o que eu pensava era absurdo perante o ódio que eu sentia pelo meu noivo.

Enzo olhava para a parede à sua frente, onde eu tinha pendurado um quadro que pintara há alguns meses atrás. O quadro original era de um pintor japonês que eu muito adorava, por isso, não consegui não tentar fazer um igual para mim.

Pouco depois, Enzo gira nos calcanhares e apreço-me em fechar os olhos. Só esperava que ele não conseguisse ver o meu rosto corado depois de ter espiado o seu traseiro, na maior cara de pau.

Sinto a cama a baixa atrás de mim e o meu coração começou a bater rapidamente. Enzo acabara de se deitar atrás de mim?

Os cobertores são postos no sítio, só que um pouco mais puxados para si, dando-me a nítida ideia de que o meu futuro marido acabara mesmo de se aconchegar na minha cama, ao meu lado.

- Desculpa por tudo, Lia. – O seu sussurro era bastante rouco e deixara toda a minha pele arrepiada, desde o meu ouvido até às pontas dos meus pés. O seu braço pousou sobre a minha cintura e senti o seu peito nas minhas costas. Permaneci de olhos fechados, incapaz de fazer qualquer movimento que me acusasse de que estava acordada há algum tempo. De certa forma, eu deveria de me sentir insegura. Deveria de me sentir desconfortável, certo? Pois, foi totalmente o contrário o que eu senti, ali, aconchegada no peito do meu falso noivo.


O Meu GangsterWhere stories live. Discover now