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Cora largou todo o peso do corpo na cama. Um baque seco a seu lado indicava que Edith acabara de fazer o mesmo.

"Não entendo como chegamos a esse ponto de exaustão apenas passando o dia numa almofada" disse ela, esfregando os olhos vermelhos.

"Acho que não consigo sentir minhas pernas" respondeu Edith.

No entanto, por mais que seus músculos estivessem doloridos e sua cabeça latejasse, Cora sentia-se tão desperta quanto antes. As revelações de Mahira e a conversa tensa que tivera com as outras iniciadas durante o jantar serviram como um grande estímulo para seu cérebro, que trabalhava a mil. Seu pensamento flutuou até a família. Seus pais deveriam estar quase enlouquecendo pela falta de notícias. Não travaram nenhum contato desde a frugal mensagem que enviara ao chegar na estação de Newcastle. Até Miss Maddie estaria estranhando seu sumiço.

Um desejo dolorido de falar com os pais, seu elo com um passado de normalidade, brotou intenso em seu coração. Se não estivesse tão cansada, provavelmente teria raciocinado com mais juízo. Porém, em seu atual estado de esgotamento, Cora viu-se levantando e caminhando em direção à porta.

"Onde você vai?" Edith esforçava-se para acompanhá-la com o olhar.

"Preciso falar com meus pais. Ainda não devolveram meu celular."

"Tem certeza de que esta é uma boa ideia?" perguntou Edith. Mas Cora já havia atravessado a porta.

A menina caminhava na ponta dos pés, mais por costume do que por necessidade. As colegas estariam tão cansadas que não perceberiam nem mesmo se uma manada de búfalos passasse por ali. Descobrira durante o jantar que Eloise e Franchesca dividiam um quarto, assim como Leonora e Amelia, ambas profundamente contrariadas com o arranjo. De certa forma, sentia-se grata por ser Edith sua companheira de quarto.

Chegando à escada, precisou respirar fundo para espantar um medo repentino, mas acabou subindo até o desconhecido terceiro andar. Esperava encontrar alguma nova decoração extravagante, papéis de parede vitorianos ou até mesmo alguma obra de arte. No entanto, o terceiro andar parecia exatamente igual ao segundo, o mesmo chão acarpetado e cinzento sob seus pés. O número de portas também era o mesmo. Por baixo de uma delas, no vão entre a madeira e o piso, Cora vislumbrou uma fresta de luz indicando que o cômodo estava ocupado. Aproximou-se lentamente e bateu.

"Por favor, que seja Sofia" murmurou para si mesma.

"Entre" respondeu a voz inabalável de Mahira.

Cora abriu a porta vacilante, fazendo a madeira ranger. O quarto onde acabara de pisar tinha as mesmas proporções que o seu, mas sua organização era completamente diferente. Havia uma cama ao fundo, encostada na parede junto a um criado mudo, mas a maior parte do cômodo era ocupada por uma imensa escrivaninha, rodeada por prateleiras de livros e arquivos de documentos. Mahira estava sentada à mesa, numa confortável cadeira de escritório em couro. Digitava velozmente num computador de última geração, mal erguendo os olhos para a garota em pé à sua frente.

"Depois de todos os exercícios de hoje, imaginei que estaria dormindo há muito, Cora" disse ela, apontando para uma cadeira desocupada no lado oposto da mesa.

"Desculpe incomodá-la a esta hora."

"E o que traz você aqui a esta hora?"

Cora sentou-se, as mãos suadas apertando os joelhos. O barulho cadenciado do teclado a estava deixando nervosa. Era como se Mahira não estivesse prestando a mínima atenção. Porém, a visão de um telefone sem fio acomodado sobre alguns papéis na ponta da mesa renovou-lhe as esperanças.

Dons de Inari - Parte IOnde histórias criam vida. Descubra agora