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Cora acordou num sobressalto, sentando-se na cama. O quarto agora iluminado pelo sol estava completamente vazio.

Custava a acreditar que pegara no sono.

Depois da conversa com Meia-Pata, seu cérebro estava a mil. Ela voltara para o quarto, deitara sem fazer barulho e se pusera a remoer tudo o que tinha escutado. O Sol já nascia quando seus olhos começaram a ficar pesados, e no entanto, tudo parecera não mais que uma piscadela. Uma piscadela rápida e de repente suas amigas não estavam mais lá. Por quanto tempo o cansaço a vencera?

Desceu as escadas apressada, pouco se importando com a aparência amassada do roupão e dos cabelos. Encontrou Edith e as outras espalhadas pela sala, sentadas no sofá ou mesmo pelo chão. Sentiu falta de uma delas.

"Onde está Eloise?" perguntou.

"Mahira a levou mais cedo para conversar e desde então não a vimos" Edith jogou um pacote de biscoitos amanteigados que Cora pegou no ar. "Afanei isso do café da manhã. Melhor você comer alguma coisa."

"Não quisemos te acordar antes de saber o que estava acontecendo..." disse Amelia timidamente.

A ruiva sorriu agradecida, rasgando o lacre da embalagem de biscoito. Sentiu-se tentada a contar às outras sobre a conversa com Linda, mas um tipo de voz interior parecia repetir em sua mente as palavras da nogitsune: não confie em raposas.

Não que duvidasse da lealdade das amigas, mas seria difícil prever como cada uma reagiria à notícia. Talvez imaginassem que Cora estava se bandeando para o lado inimigo, talvez achassem que Linda falava apenas mentiras vazias. Ou pior ainda, talvez acreditassem nela.

A própria Cora não sabia o que pensar à respeito. Apenas tinha a certeza, um pouco mesquinha porém sólida, de que deveria guardar aquelas informações para si. Como uma espécie de trunfo, algo que podia vir a calhar. Ouvir mais, falar menos.

Céus, estava começando a pensar como uma raposa. Desde quando ela se importava tanto em estar um passo à frente? Talvez as provações do dia anterior a tivessem endurecido... Ou Linda.

O som de passos interrompeu seu fluxo de pensamento: Sofia caminhava para elas. A mulher ostentava as mesmas feições irreconhecíveis que Cora vira na clareira. Seus cabelos impecáveis agora estavam presos num rabo de cavalo precário, cheio de pontas soltas. Duas bolsas arroxeadas marcavam seus olhos e sua aparência geral era de puro cansaço.

Sofia alcançou o grupo e ficou parada com as mãos atrás das costas.

"Cora, Mahira gostaria de trocar uma palavrinha com você. Pode me acompanhar?"

A menina fez que sim, esfregando as mãos para livrar-se dos farelos de biscoito. Levantou desconfiada, fazendo uma careta para Edith. A amiga apenas retribuiu o olhar cheio de interrogações. Cora tinha motivos para ser cautelosa: na última conversa que haviam tido, a tutora batera sua cabeça contra a parede, literalmente.

Sofia a levou por um corredor lateral ainda no primeiro andar, até um cômodo cuja finalidade original era servir como uma espécie de sala de jogos. Agora, no entanto, parecia mais um escritório.

Mahira estava sentada em frente a uma mesa de bilhar novinha em folha, onde repousava um computador, uma impressora portátil e várias pilhas de papel. Uma olhada rápida foi o suficiente para que Cora classificasse os equipamentos como caros e sofisticados, coisas do tipo que o alto escalão da Radiant usaria.

"Aqui está ela" disse Sofia. "Vou cuidar das...outras providências"

"Obrigada" respondeu Mahira, observando Sofia deixar a sala antes de virar-se para a recém chegada. "Sente-se, por favor."

Dons de Inari - Parte IWhere stories live. Discover now