- 25 -

220 41 18
                                    

O quarto era puro silêncio, mas Cora duvidava de que alguém estivesse realmente dormindo.

A luz do luar, infiltrada em tiras através da cortina, era suficiente para revelar a silhueta de suas companheiras. Podia vê-las tensas, paradas como estátuas, fingindo o sono para que não fossem obrigadas a conversar, a encarar a tristeza uma da outra. Fora um dia muito cheio. A própria Cora encolhia-se em seu colchonete, forçando a respiração num ritmo calmo e controlado.

Sabia que o sono não viria naquela noite. A simples presença de Eloise no quarto a deixava tensa e evocava memórias recentes ainda muito doloridas.

Gostaria de poder consolá-la, gostaria de que pudessem consolar umas às outras. Mas desde que Eloise se fechara em luto, todas pareciam apenas fingir que não estavam ali. Como se formassem um indesejado grupo de intrusas naquele ambiente de dor.

A menina ruiva esfregou os olhos, amaldiçoando o tempo que insistia em não passar. Mais alguns minutos naquela angústia e enlouqueceria.

Com muito cuidado, afastou as cobertas. A cabeça de Edith, deitada ao lado, virou-se em sua direção, mas a amiga nada disse. Cora esgueirou-se pelo cômodo, os pés descalços minimizando o ruído. Alcançou a porta e lançou-se aliviada pelo corredor, esticando os músculos e inspirando profundamente o ar frio da casa.

A escada que conduzia à sala de estar refulgia prateada sob a luz da lua, uma das vantagens de se ter uma residência construída quase que totalmente em vidro. Planejava alcançar a plataforma da piscina. Quem sabe poderia olhar o céu e, com sorte, esperar sozinha a chegada da aurora.

Pé ante pé desceu os degraus gelados. Precisaria atravessar a sala e abrir a porta da frente sem fazer barulho. Ou quem sabe seria mais fácil pular a janela.

Sua atenção foi atraída por uma pequena luminária acesa. Era apenas uma fraca luminosidade, quase como uma vela, e deixava exposto apenas o vulto de uma única pessoa largada no sofá.

Cora estancou, indecisa entre seguir em frente ou dar meia volta. A pessoa estava de costas, talvez não tivesse sentido sua presença.

"Estou vendo você parada aí" uma voz melosa cortou o cômodo.

A garota sentiu o coração disparar. Engoliu em seco e aproximou-se lentamente.

Meia-Pata estava sentada com as pernas para cima, usando um pijama cinza comprido cujas calças e colete seguiam um corte de estilo oriental. Ela também estava descalça e segurava uma taça trabalhada, cheia até a metade com um líquido que Cora identificou como algo extremamente alcoólico.

"Não consegue dormir?" a mulher perguntou. "Sente-se aqui e me faça companhia, garota."

Cora deslizou para o lado do sofá que a kitsune mais velha indicara com a mão.

Estava um pouco tensa. Não parecia correto estar sozinha no mesmo ambiente que uma nogitsune, ainda mais uma tão poderosa. Além disso, Linda parecia diferente da anfitriã que os recebera mais cedo naquele mesmo dia. Ela parecia cansada, suas pálpebras formavam bolsas enrugadas, e não havia nela o menor vestígio de toda aquela desenvoltura e glamour. Seus olhos estavam levemente avermelhados. Estivera chorando?

A mulher voltou a encher a taça com uma garrafa que repousava na mesinha lateral. Fitou Cora por alguns instantes antes de quebrar o silêncio novamente.

"O propósito de me fazer companhia é também falar de vez em quando, sabe?"

Cora não respondeu.

"Vamos lá, o que falaram de mim? Que posso desencaminhar qualquer uma de vocês apenas com palavras?" ela riu. "Relaxe, minha querida, está mais dura que um cabo de vassoura."

Dons de Inari - Parte IМесто, где живут истории. Откройте их для себя