CINCO

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Quinze anos tinham se passado.

Eu passava dias sem ir a lugar nenhum, em alguns desses dias eu apenas caminhava pela areia da praia ao entardecer, quando voltava da terapia, antes de ir para casa. Era tão bom sentir o vento soprar levemente, fazendo com que os grãos de areia subissem pelas minhas pernas.

- Eu amo você, Alicia. - Adam se aconchega atrás de mim, enterrando seu rosto em meu cabelo.

De repente, o sol forte desapareceu atrás de uma pesada nuvem cinza, o céu escureceu, a tarde tinha passado tão depressa que eu nem havia percebido e naquela noite seria a apresentação de piano de Sofia, sua primeira apresentação.

- Oi querido, não vi que estava aí. – eu disse, passando meu braço sobre o rosto, para que a manga do casaco secasse as lágrimas que tinham caído com algumas lembranças.

- Cheguei ainda pouco e vi que estava aqui sozinha, então preparei um café para nós dois. Ainda temos tempo!

- Preparou um café? – perguntei de cabeça baixa, não querendo que ele percebesse que eu tinha chorado.

- Sim, coloquei a mesa e fervi o leite do jeito que você gosta. Ainda deve estar bem quentinho, você vem? – perguntou, levantando meu rosto. A expressão dele mudou, mas ele se manteve firme.

Adam sempre era tão benevolente que parecia estar ensaiando as coisas. E fazia tudo para me agradar. Era para eu me sentir completa ao lado dele, porém, ainda não posso dizer que sou e nem mesmo que eu o amo ou que gosto dele como ele merece. Mas ele sabe que tenho por ele gratidão, talvez não seja o melhor dos sentimentos de uma mulher por um homem. Juro que ele tem sido o melhor esposo do mundo e me faltam palavras para descrevê-lo. Sei que isso não basta, e sei que ele precisa do meu amor, precisa que eu o tenha com meu homem e não como só pai de Sofia. Talvez existam muitas maneiras de se amar, talvez! E acho que eu o amo de alguma maneira, nunca parei para me perguntar qual delas. Sou grata a ele por tudo que fez por mim e por Sofia, por tudo que vem fazendo esses anos todos. É só nisso que consigo pensar agora.

Quando Adam terminou o banho, eu já estava pronta, aquela era a noite da minha filha e não podíamos atrasar. Então vesti meu melhor vestido e prendi todo o cabelo deixando as costas de fora.

- Que linda! - disse ele, e sorriu entregando a gravata para que eu desse o nó.

- Obrigada, Adam.

Por uma fração de segundos nós dois seguramos nossas mãos, por um determinado tempo olhamos um para o outro, ele com olhar resplandecente e eu buscando dentro dos olhos dele o mesmo motivo para tal brilho. Quer saber se encontrei? Não... eu não encontrei! Porém apesar de não encontrar, desta vez eu me deixei levar pela emoção e o beijei com zelo.

Uma hora depois já estávamos sentados na primeira fileira do teatro, esperando ansiosos para o início da apresentação. Sofia devia estar cansada, estava lá desde às duas horas da tarde. Conforme os minutos passavam, as luzes foram se acendendo no palco, foi quando Sofia entrou e seus olhos tímidos percorreram pela plateia, que aplaudiu.

- Linda! - gritou Adam, aplaudindo de pé.

Sofia abriu um sorriso trêmulo e sentou-se no piano e foi quando tocou a primeira nota que minhas lágrimas começaram a cair. Em cada segundo, em cada nota, ela se supera, era aplaudida e aquilo de fato lhe passava ainda mais segurança. Quando Sofia olhou para mim pela décima vez, pude ver o brilho dos seus olhos, senti uma pontada de emoção. Medo de que um dia ela viesse a me odiar por ter lhe escolhido um pai. Ver ela bem me fazia um bem.

- Prepare-se. É agora. - Adam levanta animado e bate palmas.

De repente a plateia inteira levantou-se e aplaudiu, aplaudiu até as palmas secarem, até as mãos doerem de tanto baterem uma na outra. Ela se inclinou e agradeceu como fazem os artistas. Minha filha estava sendo aplaudida, tão jovem e com tanta responsabilidade. E havia tantas escolhas que ela precisava fazer, a paixão pelo mar, pela prancha, tinha deixado adormecida já que Adam era contra. E sua dedicação ao piano, mesmo que por vezes pensou em desistir, estava sendo reconhecida e aquilo me entorpeceu de felicidade. Quando todos foram saindo, eu e Adam permanecemos esperando por Sofia que chegou com as pernas bambas, as mãos trêmulas, como se não estivessem presas ao corpo, a abraçamos. E minutos depois ela parecia mais confiante, ainda tímida, porém confiante. Ela estava linda no vestido preto.

A Vez do AmorOnde histórias criam vida. Descubra agora