Dezessete

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Em noites quentes de verão, os moradores da Barra costumam sentar-se na varanda da casa ou até mesmo andar pelo calçadão até altas horas. Até que uma senhora passou e nos disse que formávamos um casal perfeito. Entrei no carro e ele sentou-se no volante sorridente, com as mãos na minha perna deu partida. Alguns minutos depois, parou em frente ao motel de luzes azuis, bem florescentes. Olha-me, e eu dou de ombros, faz a volta e pega novamente a estrada.

- Aonde vai?

- Para minha casa!

- Mas e a sua mãe?

- Ela está bem. Gosta de você.

- Não gosta não.

- Precisa aprender a dar uma oportunidade das pessoas conhecerem você melhor.

Isso me fez abrir um sorriso.

- Eu só não quero ser intrusa.

- Não é intrusa e eu sou bem grandinho.

- É que não fui muito legal da última vez.

- Ela já esqueceu isso. Talvez nem se lembre de você. - ele faz uma pausa.

Assinto com a cabeça.

- Podemos recomeçar daqui em diante. Eu e você e a nossa filha. - ele para pôr um momento, seus olhos embriagam-se de lágrimas, prontas para cair, eu as seco.

- Você acha que podemos recuperar tudo que perdemos?

- Eu acho que não. Mas ainda podemos construir uma nova vida.

- E se ela não quiser. Se não conseguirmos.

- A gente vai conseguir! - disse ligeiramente.

Aquele amor que Pedro me devotada era o que eu tinha sonhado durante todos esses anos, e agora estava acontecendo. Estava descobrindo que o importante era o amor e não todas as coisas.

- Eu li sua carta. – falei baixinho.

- Leu? - questionou consternado.

- Sim... Eu li.

- Espera. Com quem estava?

- Com minha mãe. - digo contra minha vontade.

- Quer dizer que esse tempo todo ela sabia, sabia das cartas e nunca falou nada a você?

- É Pedro, eu também me surpreendi. Mas no fim eu entendi. E quis me proteger.

- Proteger. De mim?

- Pedro. Eu já tinha me casado e receber aquelas cartas, mudaria tudo. E naquele momento minha mãe achou que era a coisa certa a fazer. - nem eu acreditava naquilo. Mas ela era minha mãe, e eu sempre acreditei e admirei tanto ela. Que não me via fazendo ao contrário.

- E eu achei que ela gostasse de mim.

Franzo o cenho.

- Acredito que foi só o instinto de mãe falando mais alto.

- É eu acredito que tenha sido para proteger mesmo você, de mim. Só de mim! - diz com certa ironia.

Pego sua mão, Pedro me olha e beijo seus dedos, desfazendo toda tensão.

- Vamos entrar? – pergunta depois de ficarmos quase 30 minutos dentro do carro estacionado.

Ele não acendeu nenhuma luz. A casa estava silenciosa e escura. Ouvia se apenas o tilintar do relógio enorme pendurado logo na porta da entrada. Acho que ele não esperava que eu viesse passar a noite em seu quarto. Ele foi explicando e jogando para o canto as toalhas molhadas e as roupas sujas. E eu não esperava encontrá-lo, nem mesmo sabia se merecia ter os braços dele agarrados no meu. Depois lembrei que eu tinha bebido um pouco antes de ir para a praia, tinha aberto uma garrafa de vodka e bebi quase toda. Eu tinha deixado a televisão ligada, não quis me sentir solitária. Não lembro se a desliguei. Pedi desculpas sem saber muito por que estava me desculpando. Mas corri para o banheiro e enxaguei minha boca com água. Ele é forte e me leva para a cama nos braços. Conversamos um pouco mais e entre um beijo e outro, depois de um banho quente e de fazer amor, ele adormeceu. Fiquei pensando em Sofia a noite inteira, incapaz de me concentrar no sono.

Quando abro os olhos já é dia e o sol ultrapassa a janela sem cortinas, olho ao redor Pedro não está ali. Passo os olhos rapidamente pelo quarto e tudo ainda permanece igual, apenas a cama não era a mesma. Estico-me na cama pensando que terei que voltar para a realidade da minha casa vazia.

Dou uma risada ao ver Pedro de cueca entrando no quarto com uma bandeja de café da manhã. Com uma flor de plástico num copo com água. Pensei logo em Sofia, só ela fazia isso para mim. Era inevitável não derramar lágrimas ao pensar nela.

- Bom dia... - diz ele com um largo sorriso no rosto.

- Oi. Bom dia. – seco a lágrima e sinto vergonha de estar ali na cama dele, descabelada e sem roupa, apenas enrolada no lençol.

Ele contempla meu olhar.

- Há tanto tempo espero por isso. – toca minha boca com seus dedos.

- Eu também. - respondo acanhada.

- Me diz o que você quer comer?

- Ah, qualquer coisa.

- Não temos qualquer coisa – ele larga a bandeja de café e segura minha mão.

- E eu estou me sentindo mais leve, sabia? - balanço a cabeça e acaricio o rosto dele.

- Que bom. – ele diz e me faz um cafuné.

Tomamos nosso café juntos, com nossas pernas entrelaçadas uma na outra até que rompi o silêncio.

Ouço o ranger na porta.

- Oi mãe. – ela abre devagar, mas não entra. – está tudo bem mãe...?

Não consigo ver o rosto dela. E sei o que espera, espera-me falar sobre Sofia. Mas ainda não estou preparada.

- Preciso voltar para casa. – por fim digo.

- Casa?

- É. Mesmo que não pareça eu ainda tenho uma casa, uma filha.

- E um marido? – ele me repreende.

- Não ia dizer isso.

- Você está aqui, mas não parece estar. Sofia não está lá.

- É que para você pode parecer fácil, mas para mim não.

- Não disse que era fácil. Mas o que prende você na sua outra vida?

- Pedro...

- Não. Sério, me fala. O que ainda te prende naquela casa? Por que eu só quero entender Alicia. Tivemos uma noite maravilhosa e ai ao acorda parece que o encanto passa. Você parece mudar repentinamente.

- Desculpa. É que é estranho para mim. Eu só preciso ir para casa.

- Ok. Entendi. Mas parece querer fugir.

- Não. Não é isso.

- Então fica. Fica de uma vez. Já tem provas suficientes que escolheu a vida errada e agora ta tendo a oportunidade de consertar, de viver o que realmente sempre quis. Fica aqui. Encare a realidade. Mia não é sua amiga! Adam enganou você! Sua mãe mentiu. Não tente fingir que as coisas têm uma razão para que fiquem mais suaves.

- Você sabia que Mia e Adam, que eles?

- Você não sabia?

- Não!

- Ué. Eles estavam sempre juntos, talvez escondidos, mais cansei de vê-los juntos. – Pedro admitiu.

- E como sabe que eu sei? Sabia que os dois ainda tinham um caso?

Pedro levou um instante para entender.

- Ah, isso eu não sabia. Eu sabia de antes. Antes de você se casar com ele.

Meu coração começa a bater acelerado.

- Agora sabe!

- É isso que te incomoda?

- Não. Não me incomoda. – respondi com rancor.

Ele me analisa. Uma brisa de vento soprou pela janela e a sensação não foi boa.

- Eu vou ficar um pouco mais, até o almoço quem sabe. – retruquei fingindo não me importar com o que tínhamos acabado de dizer.

- É sábado. Fica aqui até amanhã, podemos ir até lá e pegar umas roupas, seu celular...

Ouço passos na escada e de repente uma voz me chama. Era a da senhora Laila. Meu coração volta a bater acelerado. Eu sentia que era sobre Sofia o chamado dela.

A Vez do AmorWhere stories live. Discover now