Capítulo 25

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                                                                 Sam


Meus ossos fazem um estalido quando finalmente os raios de sol que surgem através da cortina da janela me convencem a despertar e levantar-me do chão, onde chorei e peguei no sono. Minha boca tem um gosto amargo que me incomoda mais que o normal pelas manhãs, por associá-las a visão nojenta do Tyler me traindo com a Cassandra. Tyler me traiu. É como se fosse um pesadelo. Um desses pesadelos bem vívidos e dolorosos. 

No espelho do banheiro meus olhos estão realmente inchados, o azul apenas um traço envolto do vermelho. Meus cabelos semelhantes a um ninho de pássaros muito mal feito.

- Pequena Sam? – chama-me carinhosamente Lupe.

- Ei, Lupe. Estou no banheiro – retorno.

- O café está pronto. O senhor Samuel está lhe esperando – avisa.

Papai me esperando para comer com ele? Apresso-me em me livrar das roupas e entrar debaixo do chuveiro com a escova de dente na mão. Por ora não aproveito a sensação bem vida da água gelada que banha meu corpo pegajoso. Não liguei o ar ontem á noite.


                                                      (...)

- Bom dia, papai! – digo um pouco mais feliz assim que desço e encontro seu prato intocável. Ele realmente estava me esperando.

Quando foi a última vez que isso aconteceu?

Quando você estava doente?

Ignoro.

- Bom dia! – retribui, sem emoção alguma. Como sempre.

Ás vezes me pergunto se algum dia todas as chamas de esperança que mantenho acesas dentro de mim sobre ele deixar de ser tão indiferente a mim mudará. É doloroso. Ainda mais depois que tive um lampejo de como ele seria um bom pai. Carinhoso e amigável. Talvez amar e ser amado não sejam para todos no fim das contas.

- Por que você mudou de ideia? - Pergunta, acho para recompensar o climão que se instalou.

Dou de ombros, dando um gole em meu suco de frutas vermelhas.

- Esse gesto não é resposta, Sam – diz, dando um gole em seu café.

Meu nome em sua boca me faz me sentir como uma criança que fez o que não devia.

- Molly ligou para cá perguntando sobre você e aquele rapaz que esteve aqui no verão. Qual é mesmo o nome dele? – pergunta. Ele é ótimo com nomes e fisionomia.

- T... Tyler – balbucio.

Sem lágrimas, por favor.

Quando ergo o olhar que nem havia percebido que estava encarando a toalha branca de linho da mesa, noto que me observa. Ele limpa a garganta e toma mais um gole do seu café.

- Você deveria ligar para ela. E para o Jake também, pude ouvi-lo soltar alguns palavrões - conta, levantando-se – Tenha um bom dia – diz, como se falasse com um dos seus sócios ou clientes. Ou qualquer pessoa e não sua filha.

- Pai? – chamo.

- Sim? – olha para mim.

- Termina de tomar café comigo e depois vamos andar um pouco pela praia – peço.

- Tenho trabalho a fazer. Nem todos têm a disponibilidade de sentar-se e não fazer nada – diz, voltando a andar em direção ao seu escritório. Seu esconderijo do mundo quando não está na empresa.

- Você sabe que eu não sou como ela, não é? Que eu não sou a Charlotte – digo, amargurada.

Ele fecha os olhos e toma uma grande ingestão de ar, antes de abri-los novamente. Brilham com raiva ou sei lá o quê.

Quando penso que vai dizer algo simplesmente se põe a caminhar outra vez. Uma raiva súbita cresce dentro de mim. Ganhado tamanho e força. Meu copo de suco a certa o chão alguns centímetros afastados dele. Nós dois paralisamos, mas não dou a mínima para sua reação.

- Diga – exijo aos berros – Diga que você sabe. Diga!

- Pequena Sam – murmura Lupe assustada, vindo do lado oposto, a cozinha.

É aí que me dou conta que estou jogando tudo sobre a mesa no chão, e ele continua lá. Parado e de costas para mim, me ignorando como sempre.

- Eu te fiz uma pergunta – esbravejo, agora em sua frente.

Toda sua expressão sem qualquer indício de emoção. Nem raiva. É como estar diante de um robô. Diante de um cadáver.

- Eu cansei – digo baixinho, junto às lágrimas que escorrem imperturbavelmente mais uma vez – Eu cansei.

- Guadalupe? – chama, olhando-me, mas agindo como se eu não estivesse ali.

- Sim, senhor?

- Leve minha filha para o quarto e acalme-a – ordena frio.

Eu cansei!

                                                                        Tyler


Alcanço sem desviar os olhos da casa da Sam mais uma vez a lata de energético. Depois de um tempo uma esperança mais que otimista que logo nos resolveremos, é o líquido agora quente que ainda me mantém acordado. Peter já me ligou e enviou centenas de mensagens querendo informação, apenas lhe disse que tudo ficaria bem e li uma onde ele contou que conseguiu explicar tudo para os gêmeos homicidas. Que se foda. A única pessoa que quero que entenda e acredite em mim é a Sam. Só de saber que Molly nem Jake conseguiram falar com ela desde que chegou, me enche de pânico só ao imaginar como deve estar se sentido mal. Arrasada e acreditando fielmente que a enganei.

Porra! Estávamos tão bem.

                                                    (...)

-... Garoto

Logo desperto, e me xingo mentalmente por ter cedido ao cansaço e pegado no sono. No entanto, logo percebo que não foi os raios de sol ou a posição desconfortável em que estou no carro do Peter que me acordaram e, sim uma senhora de rosto redondo e conhecido. Lupe. Logo desperto por completo, me ajeitando no banco do motorista abro a porta do carro. Ela me dá espaço.

- Aconteceu alguma coisa com a Sam? – pergunto preocupado.

A mulher parece triste.

- Eu nunca vi a pequena Sam daquele jeito – diz, os olhos cheios d'água.

Antes que diga mais alguma coisa caminho em direção a casa. Mas Lupe agarra meu braço.

- Não, ela saiu. Ela brigou com o pai. Ela estava com tanta raiva. Eu tentei convencê-la a ficar no quarto, mas se foi – conta, chorosa.

- Para aonde? – pergunto preocupado.

- Tem um casarão...

- Eu sei onde fica. Obrigado, Lupe.

Eu sei bem onde fica. Nunca cheguei perto o suficiente, mas foi o suficiente para perceber como a Sam a considera especial. Até brinquei que no dia em que aceitasse a se casar comigo a compraria. Ela riu. Riu tanto que chegava a se contorcer, e só piorou quando eu acrescentei que sentaríamos na varando do quintal todos os dias para vermos nossos filhos correrem e brincarem na areia, e mais tarde para admirarmos o mar e o pôr-do-sol quando fossemos velhinhos.

Lembro de ter pensado pela primeira desde que a conheci que seria capaz de matar por aquele sorriso e para ser eu o responsável por ele.

O trajeto até o casarão abandonado demoraria muito mais, por ser uma das casas mais afastada do local, mas do jeito que corro torna-se curto. Chego a tempo suficiente para ver de longe Sam atravessando um pequeno portão escondido pelas plantas que cresceram demais até a casa. De fato, o lugar é impressionante. As colunas erguidas de pedras escuras com vidros, que escondem o interior pelas persianas, vão de rústico a contemporâneo na mesma medida.

Soa quase como uma pintura. Daquelas onde nós poderíamos passar horas admirando.

Como a Sam.

Mais Que Amigos {Finalizada}🚫16 Where stories live. Discover now