Perfeitamente Quebrados

Bruna

Flashback

2 ANOS ATRÁS

Devo admitir que não sou muito fã de conferências. Eu estava sentado em uma mesa, sozinho. Eu, a comida e a bebida basta. Era uma conferência de educadores, então havia muitos professores naquele lugar, principalmente os de português, como eu. Discutindo sobre seus trabalhos, alunos, sonhos profissionais, meios de melhorar o ensino... Eles pareciam legais e muito cultos. Mas, não gosto de contato, prefiro observar tudo e todos de longe. Era como eu passava o tempo, observando as pessoas, tentando descobrir apenas pelo olhar como elas eram, quem elas eram.

E foi nessa brincadeira idiota que meus olhos pararam naquela mulher. A mulher mais linda presente naquele enorme salão, sua beleza ofuscava a do próprio lugar que era lindo por si só: mesas distribuídas por todo o salão, a altura do teto era enorme, o que deixava uma sensação boa de conforto e liberdade. Enfim, era bem diferente de todas as outras conferências que já fui. Parecia mais um lugar onde se realizam casamentos. Mas voltando a falar dela... Seus cabelos loiros bem amarrados, como uma executiva. Dando-lhe um charme especial. Ela usava um vestido azul que ressaltava a cor de seus cabelos. Estava sentada sozinha numa mesa não tão distante da minha. 

Enquanto eu era levado por essa onda de pensamentos, nem percebi que eu ainda a encarava. E agora ela me olhava. Parabéns Pedro, você foi flagrado. Por algum milagre que não sei qual, fui tomado por uma coragem súbita e me levantei. Fui até sua mesa, da forma mais tímida possível. Eu havia tido poucas namoradas, mas nenhuma séria. Algumas conheci na minha pior época, dos 14 aos 18 anos, quando eu era um adolescente inconsequente revoltado com a morte da mãe. Mas depois falamos do meu passado. 

–Oi! - dei um sorriso meio torto – Tudo bem se eu me sentar aqui?

–Oi! Claro, pode sentar! – disse ela de maneira simpática.

–O que faz aqui sozinha?

–Bom, eu vim meio que obrigada por meu chefe. Estou aqui como ele queria, mas não quer dizer que preciso participar de algo. – ela riu, triunfante com sua artimanha.

–É verdade! – eu ri junto – Mas mesmo assim... Meu nome é Pedro, prazer! – estendi minha mão por cima da mesa.

–Bruna, prazer! – ela apertou minha mão. Nossos olhos não desviavam a atenção um do outro nem por um segundo sequer.

Começamos a conversar sobre a conferência, nossos trabalhos, nossa vida em geral. Descobri que Bruna era professora também, de química. Talvez isso explique seu jeito de ser tão elegante, inteligente e atraente ao mesmo tempo. Ela me contou um pouco sobre sua vida, de como seus pais quiseram forçá-la a cursar medicina. E quando no meio do curso ela desistiu para seguir seu verdadeiro sonho, eles não entenderam e até hoje guardam mágoa disso. Ela tinha alguns irmãos mais velhos, e gostava de falar como eles eram importantes pra ela, sempre foram muito unidos. Pois os pais deles eram muito rigorosos e conservadores. E ricos. 

No entanto, Bruna saiu de casa para sustentar sua própria vida, seus próprios estudos. Não queria ter nada fácil nem depender dos pais. E seus irmão fizeram o mesmo. 

Eu... falei sobre tudo, menos meu passado. Mesmo que estivesse tendo algo legal com ela, iria demorar para eu confiar o bastante nela para contar tais coisas. 

Depois que começamos a conversar, a conferência passou mais rápido e logo nos vimos indo embora. 

–Pois é, parece que acabou! – eu falei meio decepcionado.

–A conferência acabou, mas nossa conversa não senhor Pedro! – ela brincou – Eu realmente gostei de conversar com você.

–O sentimento é o mesmo então! Deveríamos repetir isso qualquer dia.

–Um dia, sim. mas agora tenho que ir.

–Tudo bem, você tem como ir? - perguntei.

–Já chamei um táxi. 

–Dispense-o, eu te levo. 

–Não precisa Pedro, está tudo bem. – falou sem graça.

–Por favor, faço questão, além do que, podemos continuar nossa conversa no carro.

Ela acabou cedendo e ligou para o posto cancelando a corrida. Fomos até meu carro e entramos. Ela morava no Boqueirão, bem longe de onde eu morava, mas não mencionei isso se não ela poderia desistir. 

Conversamos e rimos muito durante o caminho. Coloquei Legião Urbana para tocar e me surpreendi com ela cantando ao meu lado. Começamos a cantar juntos.

"Vamos lá, tudo bem, eu só quero me divertir, esquecer dessa noite, ter um lugar legal pra ir..." (Teatro dos Vampiros).

Foi assim o caminho todo, eu via que ela também estava se divertindo. E isso me deixava feliz, mas nervoso. O que era aquilo? E no que poderia se tornar? Isso me assustava. Não sabia se estava pronto para deixar alguém entrar na minha vida e fazer parte dela. Mas Bruna... Talvez eu abrisse uma exceção pra ela. Tínhamos acabado de nos conhecer e eu já estava maravilhado, eu me sentia bem ao seu lado, leve. E não me fechava como com os outros. 

–Chegamos! – eu disse.

–Muito obrigada Pedro, não tenho palavras pra agradecer. – ela disse.

–Não precisa agradecer, mas se quiser retribuir... o que acha de sairmos esse fim de semana?

–Sim..claro! Seria maravilhoso! – me surpreendi com o sorriso que ela esboçou, que ia de orelha a orelha – Hoje foi incrível, você tornou minha noite tão chata em uma das mais divertidas! Obrigada! – ela beijou minha bochecha e saiu do carro. Sumindo na noite até a porta de sua casa.

O que era aquilo? Eu não sabia, mas me sentia bem. E voltei pra casa pensando nisso tudo. 

Mal podia esperar pelo próximo fim de semana. Que pareceu demorar um século (sendo que estávamos na quinta).

E assim, eu e Bruna começamos a nos ver, viramos amigos. Eu a visitava no trabalho de vez em quando e a levava para almoçar em algum lugar. Por sermos professores, nossos horários de intervalo eram praticamente os mesmos. 

E assim, foi acontecendo tudo no seu tempo. Primeiro beijo, primeiro cinema, primeira ida a casa do outro, primeiro dia dos namorados, primeiro aniversário dela, depois o meu, o pedido de casamento... Eu também havia criado coragem e lhe contei sobre o meu passado, literalmente tudo, depois conto a vocês. Ela me abraçou enquanto eu chorava, e um sentimento estranho me invadiu. Um sentimento bom.

Nunca havia sentido nada como aquilo. Bruna mudou minha vida. Eu era alguém totalmente diferente com ela. E eu esperava mudar a sua também.