O grande dia

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Estava tudo nos conformes. Faltava um dia para o casamento e eu não podia estar mais feliz. Dei a notícia para alguns amigos. Liguei para o Sam, para o Leo e para a Larissa. Eram meus únicos amigos de verdade. Conheci o Sam no orfanato, ele era dois anos mais novo que eu. Na época um garotinho muito assustado, porém diferente de mim, ele nunca tinha conhecido seus pais, sempre foi órfão, abandonado pelos mesmos e dado ao orfanato. Viramos melhores amigos, era difícil sobreviver sozinho naquele lugar, então nos juntamos. Eu cuidava dele como um irmão e tenho certeza que ele também sempre me viu como um. Até que ele foi adotado e eu fiquei, nenhum casal nunca me quis, mas eu não me importava. Não queria pais. Já tive pais o suficiente, e fui machucado o bastante por eles. Não precisava disso novamente. Nos afastamos um pouco, mas ele continuava indo me visitar até que completei 18 anos e saí dali, ele me ajudou muito nos primeiros meses, já que eu não tinha um lugar pra ficar. Estava totalmente sem teto, sem dinheiro, sem nada. E seus pais sempre foram muito legais comigo, eles realmente se amavam e amavam o Sam. E Sam também os amava.

Me perguntava como era possível isso, amar dois estranhos que de repente, sem mais nem menos, decidem ser seus pais. Sou deprimente, eu sei. Vou tentar ser mais otimista (eu acho).

O Leo já conheci depois de ter minha vida colocada nos eixos, nos conhecemos na faculdade. Ele fazia letras comigo, e estava uns 4 períodos na minha frente então ele sempre me ajudava. E a Larissa... bom, a Larissa vem de uma longa história, deixarei pra falar de nós em outro momento. Tudo o que você precisa saber é que a Larissa é uma das pessoas mais importantes na minha vida, eu a amo como uma irmã.

Ela também teve uma história difícil, mas diferente de mim ela transformou isso em força. E eu nunca soube lidar com a dor. Ela me ajudou, mas eu a afastava. Não gostava de me aproximar das pessoas, já devo ter mencionado. Tinha medo de ser machucado, abandonado novamente. Então quando eu me entregava a alguém (coisa rara), eu me entregava mesmo. E ela conseguiu a façanha de me derrubar, invadiu totalmente a enorme fortaleza que era e é o meu coração.

–Não acredito! – disse o Leo. – Já tava na hora hein! – nós sorrimos.

–Pois é cara! Agora deixa eu desligar, ainda preciso avisar a Lari e o Sam. 

–Beleza irmão! Conta com minha presença! – disse ele desligando.

Liguei pro Sam e o avisei. Ele só faltava me devorar pela outra linha com tanta alegria. Desliguei e disquei o número da Lari. Ela não atendeu, tentei mais algumas vezes e nada. Deixei de mão.

O sábado foi normal. Liguei pra Bruna pra saber como estava indo os preparativos.

–Boa tarde querida! – disse quando ela atendeu.

–Boa tarde querido! 

–Não vamos nos ver hoje? – perguntei.

–Ah, eu tô muito ocupada com as coisas do casamento sabe, o vestido, o bolo... 

–É verdade, se é assim tudo bem! Amanhã vai ser perfeito. – disse acalmando-a, na verdade, mais a mim do que a ela.

–Vai sim! Agora preciso ir, beijos Pedro. – desligou.

Tirei a tarde para corrigir as pilhas de provas que se acumulavam em casa. "Zero...quatro...dez...nove... Certo, errado, meio ponto, anulado. E ham? Que resposta é essa?"

Confesso que é divertido corrigir provas, alguns alunos soltam cada pérola que você não acreditaria. Anoiteceu quando eu estava terminando, e fui dormir mais cedo. O dia seguinte seria importante e exigiria de mim mais energia.

*** 

Acordei às 10h. O casamento seria às 15h.

E as horas passaram voando. Fui pegar o terno, e tentei ligar mais uma vez pra Larissa. Nada.

No caminho parei para almoçar no restaurante de sempre. Paguei a conta e voltei pra casa. Com o terno em mãos, cheguei no térreo e chamei o elevador. Quando ele chegou, tinha um homem saindo. Nunca o vi por ali.

–Bom dia! - cumprimentei-o.

–Bom...dia. - disse ele assustado. E foi embora do prédio. Estranho.

Entrei e apertei o número 4. Quando o elevador parou, saí e fui caminhando pelo corredor, até meu apartamento, o 404. 

Peguei as chaves no bolso, meio sem jeito por causa do enorme terno em minhas mãos, consegui destrancar a porta e a abri. 

Quando dei o primeiro passo para dentro de casa, senti algo em meus pés.

Correspondência? Não, uma carta.

Da...Bruna!?

Abri.

Pedro, o que eu fiz não tem justificativas. E não espero pelo seu perdão. Mesmo assim, me desculpa. Sou uma idiota e não espero que entenda o que fiz. Apenas não posso casar com você, estaria mentindo para mim e para você. De qualquer forma, estou indo embora, para que não precise mais me ver ou ouvir falar de mim. Espero que encontre alguém que o mereça e tenha uma vida feliz.

Ass Bruna.

Dessa vez.. não deixei o terno cair.

Apenas molhei aquela carta com as poucas lágrimas que insistiam em cair.

Mas logo as sequei e liguei avisando a meus amigos que não haveria mais casamento. A ficha ainda não tinha caído. E eu realmente não tinha entendido. Por quê? Foi tudo uma mentira?

Isso eu descobriria depois. Mas eu não a culpava no momento. Culpava a mim mesmo. Por ter confiado meu coração a alguém novamente mesmo depois de ter aprendido que o resultado pode ser catastrófico.

Passei o resto do meu domingo fazendo ligações para cancelar os preparativos do casamento e quando me perguntavam o porquê eu apenas respondia:

"Alguém percebeu que não tem sorte em me ter."

A história se repetia. E lá estava eu sozinho de novo. 

Abandonado. Mas decidi que não derramaria mais lágrimas.

Que não passaria por isso de novo.

E naquele momento é como se eu sentisse as trancas do meu coração se fechando. Dessa vez, pra valer. 

Acordei no dia seguinte, me levantei, fiz minha higiene pessoal, tomei café e fui trabalhar. Mais um dia normal começava.



Perfeitamente QuebradosWhere stories live. Discover now