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Ouviu o estrondo da porta a fechar-se atrás de si e sentiu um ligeiro aperto no peito. A partir daquele momento estava, oficialmente, por sua conta. Tinha, portanto, que se desenvencilhar sozinha e de nada valia arrepender-se e pedir auxílio à sua família, pois esta tinha acabado de a renegar e recusar-se-ia, com toda a certeza, a prestar-lhe todo e qualquer tipo de auxílio.

Desceu a escadaria exterior de mármore marfim em passo vagaroso, atravessando toda a zona ajardinada e deteve-se nos grandes, pesados e enferrujados portões verdes. Olhou
para trás e contemplou pela última vez a fachada exterior do palacete, construído no final do século XIX, como se estivesse a mentalizar de que, a partir de agora, aquela casa já não lhe dizia nada e fazia parte do passado. No fundo, era como se estivesse a fazer já o seu "luto" psicológico para que, numa ocasião em que tenha necessariamente de passar por esta rua ou, quanto mais
não seja, na necessidade de ter que voltar para recuperar o resto das suas coisas, as recordações não lhe assaltarem a memória com tanta mágoa.

Até que resolveu parar de se lamentar da sua sorte e fez-se à vida. Passou para o exterior da propriedade pegando no telemóvel ao mesmo tempo. Ia ligar à Bianca, era sua amiga e certamente não a iria deixar desamparada. Enquanto ouvia o sinal de chamada, largou por instantes as asas das malas e aguardou sentada em cima de uma delas.

Estou? - Respondeu uma voz feminina vinda do outro lado da linha.

–É a Sofia. Estás boa? - Cumprimentou Sofia.

Eu estou agora tu é que não pareces estar! Essa voz não me engana... - Notou Bianca.

Sofia deu um profundo suspiro e respondeu:

–E não estou mesmo, Bianca. Tive mais uma discussão com os meus pais só que esta foi a pior de todas. O meu pai pôs-me fora de casa! - Revelou.

Estás a gozar, certo? - Perguntou Bianca estupefacta.

–Não. E para te ser sincera acho que até foi um favor! Há muito que estava desertinha por sair desta casa! - Exclamou Sofia olhando para trás.

Fogo, acredito! Passa por cá, assim falamos melhor! - Sugeriu Bianca antevendo já uma longa conversa.

–Mas passo mesmo! Estou mesmo a precisar de uma das nossas conversas! - Desabafou Sofia já um pouco mais serena. - Vá, até já então!

Até já! - Desligou o telemóvel. Sofia e Bianca conheceram-se no último ano do Secundário. Sofia frequentava a área de Economia ao passo que Bianca estava em Artes depois de ter desistido de Humanidades antes da conclusão do último ano, obrigando-a a fazer novamente os três anos do ensino secundário.

Foi ela quem passou o bichinho do burlesco a Sofia e a paixão por essa arte performativa uniu as duas até aos dias de hoje. Além disso Bianca era uma pessoa que gostava de ouvir e aconselhar sem fazer julgamentos a priori mas também dava na cabeça
quando era preciso. Daí Sofia recorrer sempre a ela quando está em baixo; sabia que podia contar com o apoio e a honestidade de Bianca.

Ao chegar a casa de Bianca é recebida com um longo abraço. Sofia encostou as malas e sentaram-se no sofá.

–Então, miúda?

–É o mesmo de sempre: o meu pai NUNCA vai aceitar o facto de eu não querer trabalhar na empresa da família. Está mais do que visto! - Sofia constatou o óbvio.

–E ele pôs-te fora de casa assim do nada?

–Praticamente sim. Foi mais uma discussão igual às outras só que desta vez cheguei ao meu limite e disse-lhe na cara o que pensava. - Relatou Sofia. - E foi por isso que fui posta fora de casa: ninguém gosta de ser confrontado, muito menos o meu pai.

Tudo Tem Um Fim Where stories live. Discover now