Capítulo 34

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Alguns hábitos nunca mudam

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Alguns hábitos nunca mudam. Principalmente aqueles que são enraizados cedo demais.

Foi assim comigo.

Antes mesmo de atingir a puberdade eu já estava sendo moldado, instruído a ser aquilo que esperavam de mim. E como é de se imaginar, cumprir tal missão não foi uma tarefa fácil. Precisei abrir mão do final da minha infância e de toda a minha adolescência. Eu não tive escolha quanto a isso, afinal era essa a única forma de agradar a pessoa que havia me restado.

Eu não costumava admitir, mas fiz o que fiz por um único motivo. Eu queria, desesperadamente, ser um filho amado.

Não só pela minha mãe, mas por ele também.

A minha maior alegria era ver o orgulho no olhar de Antony Campbell. Um mísero "Muito bom, rapaz." ou "Está indo bem, Miguel." era o meu auge. Eu vivia por um elogio seu. Fazia de tudo para que ele me notasse, para que me aprovasse. Pena que isso não acontecia rotineiramente, muito pelo contrário.

Eu o via pouco. Ambos não tinhámos muito tempo, ele por conta do seu trabalho e eu por causa das minhas mil e uma atividades extras. Natação, corrida, tiro ao alvo, boxe, judô... Qualquer tempo livre da minha rotina milimetricamente organizada era preenchido. Eu precisava ser a criança mais esperta, o menino mais forte e o filho mais obediente, afinal era isso que ele esperava de mim. Perfeição.

A cada ano que passava tudo se tornava pior. Antony não me enxergava mais como filho, e sim como seu sucessor. Nesta época passamos a nos ver com bastante frequência, já que me pai tornou-se meu treinador. Lutavamos até a minha completa exaustão, e por vezes ele me quebrou ossos. Antony dizia estar me preparando, mas em seus olhos, nestes momentos de agonia, eu só via satisfação, nunca preocupação. 

A noite era o único momento em que eu podia descansar. Sozinho em meu quarto eu me dispia de todas as preocupações, no entanto, isso também me foi tirado. Certa vez acordei com um movimento repentino. O travesseiro estava sendo pressionado com força contra o meu rosto, lembro de pensar que a casa deveria ter sido invadida e que aquele era o meu fim. Lutei até que não me restasse mais nenhuma força, e quando estava a beira da inconsciência o meu agressor se revelou. Era ele.

Isso se repetiu por todas as noites do mês seguinte, até que finalmente consegui antecipar o seu ataque. Segurei a sua mão no ar, quando ele estava prestes a me enforcar. Diferente das outras noites, em que ele entrava e saia sem dizer ou expressar nada, dessa vez ele sorriu. E eu soube que havia passado no teste.

***

O simples suspirar foi capaz de me despertar. E por meros segundos todo o meu corpo entrou em estado de alerta. Eu sabia que aquele som não poderia ter sido feito pela Sophia, já que eu conhecia todos os barulhos que ela costumava fazer quando estava adormecida. Assim, instintivamente levei a mão até o encontro do colchão com a cabeceira, ali eu guardava uma arma. Por sorte, resolvi espiar antes de atirar, como faria normalmente. Notando então que o motivo da minha preocupação era uma figura pequena e de grandes olhos escuros.

Juntos por um Golpe Where stories live. Discover now