Capítulo I

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Farah

Com minha mala em uma mão e meu saree em outra, segui a senhora até duas escadas acima. Não trocamos qualquer palavra, e nem pudera, não partilhávamos nem o mesmo idioma.

Ela abriu uma porta e revelou uma suíte com uma grande cama de casal, de lençol e travesseiros branco, assoalho de madeira alaranjado, um armário da mesma cor e uma mesinha redonda com duas cadeiras próximas à janela de cortinas floridas, mas de tudo, foi o teto em relevo que me chamou mais atenção. Eu era acostumada com todo o conforto, mas eu nunca vira nada tão lindo quanto o teto daquele palácio.

Sabendo que a grega esperava alguma reação minha, me virei e a agradeci com um aceno de cabeça. Ela retribuiu e se foi.

— Ah, grande mãe divina, o que estou fazendo aqui? — Suspirei, no momento em que fiquei sozinha.

Engoli um soluço e me sentei na cama.

— Está tudo bem. Eu não tive escolha. Agora eu só preciso conseguir sair.

                                           ***

Troquei de saree após o banho e decidi que era hora de deixar o quarto. Desci as escadas frias de mármore, devagarzinho, e, por estar descalça, consegui flagrar o corvo conversando com um cachorro sem que me notasse. Estava sentado no hall de entrada com a calça dobrada nos tornozelos, os pés sujos de terra e o cabelo preto despenteado era o de quem não se importava com a aparência, mas eu sabia que estava enganada. A roupa era de ótima costura, e os sapatos jogados ao lado era do mais puro couro. Talvez ele só estivesse tendo um péssimo dia. Era o mais sensato a se pensar.

Parei ao seu lado e esperei até que erguesse os olhos para mim. O corvo não era o tipo de homem por quem eu me encantaria, tinha a pele pálida demais, olhos e cabelos muito escuros, e não menos importante, o olhar era ousado, prepotente. Ele era atraente por fora, mas, depois de ter me desvirginado sem ao menos perguntar meu nome... Baguan Kelie (por Deus), sua índole conseguia ser a parte mais feia.

—  Olá, tagarela. —  Ergueu uma sobrancelha, ironizando. —  Você não está mais na Índia, pode usar outras roupas — olhou para meus pés — e sapatos.

Chupt karo (cale a boca). Engoli a ofensa e apenas me curvei como fora acostumada a fazer diante os homens.

O corvo se levantou e passou as mãos pela camisa. O cachorro entendeu que sua cota de carinho do dia já tinha se esgotado e saiu porta afora.

— Você não era tão quieta assim quando eu estava te comendo.

Senti meu rosto pegar fogo e precisei entrelaçar as mãos para evitar de levá-la no seu rosto.

— Como posso ajudá-lo, kutta (cachorro)?

Me deu um sorriso despojado. Mal sabia que eu acabara de ofendê-lo.

— Que bom que começamos a nos entender. Agora, vamos para o que nos interessa. — Ele seguiu por um corredor e eu entendi que precisava acompanhá-lo. — Você cuidará da parte da limpeza com outros empregados.

— Eu preferia ficar na cozinha, senhor.

— Ah, preferia? — Estava zombando de mim. — Você devia me agradecer por não lhe dar mais de uma obrigação depois do que me fez passar.

Só baixei a cabeça. Eu tinha mesmo o usado e o envolvido em meus problemas pessoais.

Chukriá.

— Espero que isso seja um "obrigada".

E era.

Ele me mostrou o resto do palácio com bastante descaso, estava com pressa. Eram estátuas gregas e mais estátuas. Quadros e mais quadros. Tapetes, móveis, objetos...Baguan Kelie (Deus do céu), eu teria muito trabalho.

O Corvo das Ilhas Gregas (DEGUSTAÇÃO)Where stories live. Discover now