Capítulo 66

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Corvo

Sentei-me no último banco da igreja e esperei pelo fim da oração. Meus pensamentos estavam em qualquer lugar, exceto, na palavra de Deus empregada pelo padre.

Os fiéis ao fim da missa deixaram a igreja e sobrou apenas eu e ele sobre um teto coberto por imagens sacras.

— Como seu corpo não queimou ao entrar aqui? — brincou.

— Quem disse que não? Estou agora mesmo em chamas.

Ele riu e se sentou com a bíblia em seu colo, indicando-me um lugar ao seu lado.

— Tem algo para mim?

— A cabeleireira não o incomodará mais — garanti, com a sensação de uma bola entalada na garganta.

Seus olhos foram até o teto e ele fez uma cruz em resposta.

— Não tem vontade de conhecer o seu filho, padre?

— Por que pergunta isso? Ele está aqui? — Assustado, procurou ao redor.

— Não. Não está. É apenas uma curiosidade minha. — Toquei em suas mãos sobre a bíblia para tranquilizá-lo.

Seu corpo relaxou e a roupa de repente cresceu nele.

— Se tenho vontade em conhece meu primeiro e provavelmente único filho? Só Deus sabe como. Mas não posso.

— Toda criança é uma benção.

Deu-me um sorriso de canto, o qual demonstrava pena.

— Sei do seu desejo em conhecer seus pais, filho, mas talvez o maior ato de amor que eles tiveram por você, tenha sido deixá-lo quando perceberam que não seriam fortes o bastante para criá-lo.

— O senhor é a segunda pessoa a me dizer isso. Mas, que ato de amor é esse que abandona um inocente em um mundo tão doentio? Consegue imaginar como é viver se perguntando o que fez de errado? Por que foi rejeitado?

Tentou levar sua mão em meu ombro. Eu me levantei antes que isso acontecesse.

— Você não fez nada de errado. Uma criança nunca tem culpa por nascer. São os pais que as vezes não estão prontos para serem pais.

— Que porra está me dizendo?

— Não fale palavrão aqui! — repreendeu-me.

— Ô cacete que não falarei. Se dois adultos não querem um filho, então se previnam ou não trepem!

— JÁ CHEGA! — levantou-se e apontou a saída para mim. — Quando estiver mais calmo voltamos a conversar.

— Perdoe-me, padre, mas não acho que o senhor seja a melhor pessoa para esse tipo de assunto. O senhor não sabe nem em qual Deus está a sua fé.

Olhei para a enorme cruz e fiz uma rápida prece antes de deixar a igreja.

Já no palácio dei de cara com Marvin me aguardando no portão. Ele tinha deixado Érebos ontem quando o expulsei. Seu irmão fora junto.

— O que faz aqui? — questionei, ríspido.

— Vim derrotá-lo.

Gargalhamos juntos.

— O plano deu certo? — perguntei.

— Caíram como um peixe. Deixaram isso aqui dentro da minha mala. Só o encontrei hoje quando fui organizar as roupas no armário. — Ele me entregou um bilhete onde o convidavam para fazer parte da Âncora. A letra, um garrancho tremendo, tinha como objetivo proteger sua identidade.

— Sabe quem o deixou lá?

— Talvez você não goste da resposta.

— Diga de uma vez.

— Juliana foi a única a ter contato com a minha bagagem quando me acompanhou até a saída ontem.

Lancei um olhar de ódio incandescente.

— Você tem certeza?

— Sim. O que vai fazer?

— Minhas mãos encontrarão um lar no pescoço dela.

Ele me acompanhou até dentro de casa e quando passamos por Farah, suas sobrancelhas se ergueram de modo sugestivo. Meu estômago se revirou ao pensar que ela finalmente me veria agir, mas fingi desinteresse. Não parei para falar com ninguém. Só continuei seguindo escada acima, formando uma fila de seguidores.

Marvin, Farah, Shobhan, Galanis, todos me acompanharam feitos uma plateia mórbida.

Bati à porta do quarto de Juliana, entendendo agora o porquê de ela não sair da minha cola desde que voltei para Érebos.

— Corvinho? — Ela se inclinou para me beijar, a ação corajosa de quem não sabia que estava prestes a morrer.

Eu esquivei e a peguei pelo pescoço com força, despertando o assombro dos outros.

— Desgraçada. Achou engraçado matar o meu cão?

— D-amon... — emitiu um grunhido e tentou segurar meus pulsos.

— Eu esperava traição de qualquer um. Menos de você!

A joguei no chão do quarto e entrei atrás. Ela tossiu, tentando recuperar o fôlego. Seus joelhos tremiam como os de uma criança, mas que tipo de criança era aquela que matava um cachorro e armava planos para acabar com o meu negócio?

— Você é tão idiota que achou mesmo que eu não descobriria!?

— Por favor, Damon...

— Por favor o quê!? Acha que devo perdoá-la?

Ela tentou correr em direção a sua arma que eu sabia ficar embaixo do travesseiro, mas eu a peguei pelos cabelos e a puxei. Eu não bancaria o tolo novamente só porque ela era uma mulher. Já me bastava ter perdoado Farah por cometer quase o mesmo erro.

— Por que? Apenas, por que?

— PORQUE VOCÊ NÃO É MAIS O MESMO — a voz áspera como um rosnado. — ESTÁ FRACO E PRESTES A PERDER TUDO.

— Não. Está enganada. Eu nunca estive tão forte. Se fosse em outros tempos, eu jamais teria coragem de acabar com você.

Me deu uma cotovelada na costela e eu a empurrei contra a parede, imobilizando sua cabeça com a mão e uma ameaça de tortura infindável:

— Você virá comigo e servirá de exemplo para todos que agirem contra seu líder!



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O Corvo das Ilhas Gregas (DEGUSTAÇÃO)Onde histórias criam vida. Descubra agora