SETE

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Juliette Freire.

Dentro da Mercedes enorme e negra, com vidro fumê, separada do motorista por um vidro escuro, eu me sentia nervosa e acuada. Sair de casa, deixar minha filha pequena e meu marido doente, para transar com uma mulher que me odiava e a quem eu desprezava, era algo que eu nunca teria escolhido, se pudesse evitar. Mas há muito tempo eu não tinha mais o controle de nada sobre a minha vida.

Meu reflexo aparecia no vidro fumê e eu encarei minha imagem desanimada. Estava pálida, com o cabelo preso em um coque desajeitado e usava um jeans gasto e uma camiseta branca. Devia aparecer exatamente o que eu era, uma mulher pobre, que vinha enfrentando grandes dificuldades na vida. E não uma mulher prestes a fazer sexo com uma verdadeira depravada feito Sarah. Estava fria e apavorada.

Tentei enxergar o que Sarah viu em mim para fazer uma proposta daquelas. Eu já fui muito bonita no passado, quando ainda era feliz e cheia de vida. Bil e várias pessoas comentavam que eu devia ter sido modelo e manequim. Era alta, esguia, com corpo bem feito e traços que, no conjunto chamavam atenção. Todos comentavam dos meus olhos grandes e de uma cor que mesmo escura chamava atenção.

Agora eu nem tinha tempo de me cuidar ou pensar em vaidade. Vendia as melhores roupas que eu tinha, vivia com pouco que me restara. Não cuidava da pele, do cabelo, de nada. Minhas mãos eram de uma mulher que trabalhava duro com cloro e sabão, tentando aumentar a renda, fazendo trabalhos domésticos para outras pessoas.

Pela primeira vez em muito tempo, observei-me com atenção. Estava bem mais magra e pálida. Sentia-me abatida. Mas continuava bonita. Meus olhos continuavam amendoados, a pele lisa, a boca rosada e delineada. Senti raiva daquela aparência. Se eu estivesse feia, horrível, Sarah não teria feito aquela proposta. Mas talvez também não me desse o dinheiro.

Fechei os olhos por um momento, angustiada. Há mais de dois anos eu não tinha relações sexuais.Bil ficou impotente e eu nunca o trairia. Às vezes a minha natureza apaixonada reclamava e eu quase subia pelas paredes. Gostava muito de sexo e era naturalmente fogosa. Mas aprendi a dominar aqueles instintos, principalmente quando fiquei tão cheia de problemas que aqueles desejos foram relegados a último plano.

Eu recebia proposta de colegas de trabalho e conhecidos, inclusive do meu último chefe, que fez uma chantagem parecida com a que Sarah fazia agora: Sexo em troca de não ser mandada embora. Eu recusara todas. Até de alguns colegas atraentes, que poderiam ter me dado pelo menos o alívio físico. Não poderia trair meu marido, mesmo ele estando doente e impossibilitado.

Agora eu faria isso. Não com uma pessoa horrível e asquerosa. Pelo menos havia a beleza a favor de Sarah, nem que fosse apenas a física. Era a mulher mais bonita que conheci.

Lembrei da modelo famosa com ela no jornal. Devia estar acostumada com mulheres belíssimas, bem tratadas, que usavam sedas e perfumes importados. Com certeza havia me chantageado por uma vingança idiota, baseada no passado. Tão logo conseguisse o que queria, me deixaria em paz. E eu tentaria esquecer.

Abri os olhos, percebendo que o carro percorria as ruas do Brooklyn, onde o motorista informou que ela morava. Logo chegaríamos lá. Só de me imaginar ficando nua para ela, sentia vontade de chorar. Ninguém deveria ser obrigada a se humilhar daquela maneira em troca de dinheiro.

Apelei para o meu lado racional. Não havia como fugir daquilo, então eu precisava manter a calma e encarar tudo aquilo pelo lado positivo. Pagaria minhas dívidas e poderia cuidar melhor da minha família. Só me restava rezar para que Sarah não fosse violenta ou repulsiva e que tudo acabasse logo.

Comecei a tremer quando o carro entrou na garagem de um prédio lindíssimo. Fiquei imóvel enquanto ele parava e depois o motorista veio abrir a porta para mim. Olhei-o por um momento, com medo de sair daquele carro.

CHANTAGEM - SARIETTEOnde as histórias ganham vida. Descobre agora