Capítulo VIII

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Não Há Com O Que Se Preocupar
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     Kars nunca se preocupou quando transava – com certa frequência – sem camisinha, porque Dio lidava com a possibilidade de gravidez (ou seja, qualquer suspeita mínima) como quem trata uma dor de cabeça prestes a eclodir antes dela se tornar aquela bola de chumbo dentro do crânio.

Por esta razão, o que fez Dio quase perder as estribeiras foi ter identificado uma maldita insinuação nos dizeres daquele alfa mau-caráter, que encenava uma súbita preocupação quanto às consequências do que fizeram àquela noite, com intenção de jogar toda a responsabilidade de uma possível burrada na sua cara. O que nunca aconteceu antes.

Dio reconhecia que tivera sorte até então de se relacionar com alfas que apenas verbalizavam o desejo de marcá-lo com a mordida, mas que nunca chegaram a concretizar o ato por, supostamente, compartillharem do mesmo entendimento sobre o benefício de não estar ou ter amarrado alguém de apenas uma noitada, ainda que essa atitude exigisse um tremendo autocontrole dos envolvidos.

Dava-se a entender que (ainda era uma minoria, embora fosse louvável) crescia o número de alfas que buscavam por parceiros compatíveis para uma união duradoura ao invés de saírem marcando todo e qualquer ômega que estivesse no cio por aí para cruelmente desvincula-lo quando não o quisessem mais. E as leis de amparo ao ômega em vigor contribuíam e muito para que o primeiro cenário fosse possível.

Entretanto, do contrário do que podia parecer, Kars não era esse tipo de alfa simpatizante à causa dos omegas.

Ele era egoísta, cínico, ganancioso, acreditava ser mais importante que qualquer um e que os omegas existiam para o satisfazer. E quanto mais omegas ele podia manter enganados com juras de amor vazias enquanto estes balançavam as bundinhas empinadas para ele, como um filhote de cachorro feliz quando vê o dono, era melhor para reafirmar a sua virilidade.

Dio o conhecia bem e por isso justificava essa "parceria", porque eles sabiam que, no fundo, eram iguais... sendo a única diferença óbvia as suas posições na sociedade, as suas origens.

Ainda assim, pareciam moldados numa mesma fôrma ou beberam da mesma fonte de arrogância com aquele toque de maldade; em contrapartida, era curioso que Kars nunca demonstrasse interesse real em transformar aquele ômega rebelde em um de seus pets com a mordida.

Todavia, Dio nunca lamentou este fato, deixava claro que acabaria com a vida do sujeito se alguma coisa saísse dos conformes, e assim permaneceu como um acordo velado entre eles.

No início, quando se conheceram, final de 72, Dio estava seriamente encantado com a desenvoltura do headbanger na guitarra, crente que não haveria absolutamente nenhum empecilho que pudesse interferir no sucesso da banda – esse era o único interesse de Dio nele – e os dois se deram muito bem, exclusive nos ensaios, quando "Vampires Legacy's" surgiu no ano seguinte. Embora Kars tivesse admitido desde o começo que detestava as transições da melodia, a música se tornou o maior sucesso dessa união naquele ano.

Tudo passou a dar errado – essa certeza ninguém tirava de Dio – após uma dessas noites de bebedeira e uma jam session improvisada que, com o tempo, tornara-se a desculpa esfarrapada perfeita para os dois saírem juntos sem levantar bandeira.

Dio ainda se lembrava do momento exato que deixou de valorizar o seu guitarrista; foi uma crítica fora de hora, acompanhada por uma risada zombeteira e seguida de um conselho não pedido numa dessas conversas pós-transa vinda por parte de Kars.

Que porra ele estava fazendo? Reclamando da velocidade do compasso na bateria, dando pitaco desnecessário sobre o vocal de Speedy e de como Erina devia se vestir nas apresentações, e se sentindo no direito de fazê-lo só porque transava com o líder da banda.

Âmbar No Azul-Celeste [✓]Where stories live. Discover now