Capítulo 22: Mundo de sombras.

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Eu podia ouvir o som acelerado do meu coração batendo. E ele ficou fora de si a noite toda, enquanto eu e Axel estávamos grudados um no outro, aproveitando os poucos momentos que tínhamos sem ninguém ao redor. Já que normalmente, os momentos de paz duravam minutos. Ali naquela fazenda tínhamos horas, ou talvez dias.

—Você não vai ficar grudada com esse diário de novo. —Axel resmungou, agarrando minha cintura e me puxando para si, quando me movi na cama para pegar o diário que ainda estava no chão. —Você já passou tempo demais com ele em mãos.

—Mas eu preciso terminar de lê-lo, você sabe. —Me virei pra ele, arqueando as sobrancelhas ao ouvi-lo estalar a língua.

—Por que não resolvemos logo a questão do Kenji e voltamos pra alto mar? —Indagou, soltando um suspiro frustrado. —Não tenho certeza se Devlon vai mesmo ficar quieto. Ele não é nem um pouco confiável.

—Você quer ir atrás dele? —Questionei, observando o rosto dele curvado em uma careta, enquanto encarava o teto de madeira do quarto.

—Eu posso ir até lá, atrás dele. Você fica aqui, em segurança, até eu voltar com ele. —Ele olhou pra mim, vendo meus lábios pressionados em negação. —Em segurança, apesar de eu ter certeza que você pode destruir o mundo se quiser.

—Muito agradável. —Resmunguei, escutando Axel soltar uma risada. —E se a gente só mandar um sinal a ele, pra que ele saiba que estamos aqui? —Olhei pra ele, mordendo o lábio inferior ao pensar na ideia. —Kenji sabe que esse é o lugar que viríamos se estivéssemos em terra firme.

—Um sinal? —Axel juntou as sobrancelhas.

Estendi a mão para o lado, observando as três safiras aparecerem ali, já que a quarta eu havia deixado com Kaisser, no navio. Terra, fogo e ar. As três pareciam brilhar com mais intensidade nas minhas mãos, com o poder fluindo para dentro de mim.

—Acha que eles conseguem ler o Livro das Revelações? —Indaguei, vendo Axel se aproximar e tirar a safira do ar da minha mão.

—Acho que não precisamos nos preocupar com isso. Nada que aquele livro mostre a eles, pode fazer as safiras pararem de responder a você. —Ele abriu um sorriso irônico. —Mas talvez a rainha deva ficar preocupada.

—Eles vão procurar algo além das safiras para poder derrotá-la. —Constatei o óbvio, pressionando os lábios em reprovação. —Essa é uma péssima ideia. Meu acordo com ela não vai servir de nada se eles continuarem provocando-a desse jeito.

—Você fez a sua parte, Kay. Não pode protege-los pra sempre. —Axel afirmou, apertando minha mão livre com a sua. —E eu acho que eles não conseguiram ler o livro, de qualquer forma. Se tivessem conseguido, as coisas não estariam tão quietas assim.

Olhei pra ele por alguns segundos, balançando a cabeça de leve. Não quero me envolver em outras batalhas. Não quero sujar minhas mãos com sangue de novo. Fiz isso uma vez, e já me sinto suja. Quero que isso acabe logo, sem mais mortes.

—Espero que Kenji não esteja se envolvendo com o que não deveria. —Afirmei, olhando para as safiras, observando a pedra verde brilhante desaparecer, restando apenas a de fogo na palma da minha mão. —Ele só precisa vir até nós.

[...]

O mundo estava cinzento e apagado. Estava assim quando chegamos, observando as cidades viradas em absolutamente nada, por conta do tipo de governo que a rainha suprema estava exercendo sobre a terra.

Mas ali na fazenda, no meio daquela floresta, pude perceber as coisas ganhando um pouco mais de vida quando chegamos. O pomar que estava abandonado, virado em galhos retorcidos, havia amanhecido florido cheio de folhas. As árvores ao redor também pareciam mais vivas e mais iluminadas, pelos pequenos raios de sol que conseguiam passar pelas nuvens de chuva no céu.

—É você. —Axel afirmou, enquanto eu tirava uma das flores que brotava na árvore. —A magia das safiras está dentro de você. Isso fez as coisas voltarem a florecer, como deveria.

—Isso deveria fazer eu me sentir uma boa pessoa, por estar trazendo vida ao mundo? —Ironizei, encolhendo os ombros ao observar a pequena flor na minha mão.

—Deveria sim. —Ele parou ao meu lado, olhando o pomar ao redor, muito florido. —A rainha suprema está tirando a vida do mundo. Você tem o poder de devolvê-la.

—Tenho o poder de tirá-la também. —Rebati, me virando para o imenso lobo negro que se aproximava de Axel, antes de vir até mim. —É um pouco irônico, de certa forma.

—Mas a diferença é que você não está fazendo isso, Kay. —Axel afirmou, enquanto me observava passar a mão na cabeça do lobo, nos pelos espessos e negros. —Você está escolhendo não fazer isso.

—Mas estou escolhendo deixar a rainha fazer o que quiser. —Olhei pra ele, gesticulando com a mão para a floresta ao redor. —E ela está acabando com o mundo.

—Então faça algo. —Ele caminhou até parar na minha frente, envolvendo meu rosto com as mãos. —Faça algo a respeito disso, Kay.

—Não posso lutar contra ela, você sabe. —Soltei uma respiração pesada. —Isso iria machucar o Kenji. Não quero que ele sinta raiva de mim.

—Mas você não precisa lutar contra ela. Pode ajudar o mundo de outra forma. —Ele segurou meu queixo e virou meu rosto, mostrando a árvore florida que estava bem ali, no meio de todas as outras. —Transforme esse mundo de sombras em luz de novo, Kay. —Olhei pra ele de novo, vendo aquelas estrelas brilhando entre os olhos negros. —Você sabe que tem o poder.

—Pensei que não se importasse com o mundo. —Comentei, sentindo ele beijar minha testa.

—Eu não me importo. Posso vê-lo queimar por inteiro, caso algo aconteça com você. —Ele me encarou com um carinho de partir o coração. —Mas me importo com você. E se isso fizer bem a você, é o que vale pra mim.

Minha mente viajou por cada pensamento racional e sensato. Minha garganta se fechou e eu senti meu coração dar um salto no peito, com o pensamento que passou pela minha mente.

—Quero ir a Cidade dos Ossos. —Afirmei, umedecendo meus lábios com a língua, quando o nervosismo tomou conta de mim. —Vou reerguer aquela cidade, Axel.



Continua...

Um Mundo de Sombras / Vol. 2Where stories live. Discover now