Capítulo 59: Eu nunca desejei ser a vilã.

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Kayla

Voltamos para o acampamento com a sombra de algo pesado e tenso sobre nós. A manhã começou a chegar, mas o dia não ficou mais claro. Nuvens pesadas e escuras cobriam o céu e logo a neve começou a cair com força sobre nós. Enquanto alguns de nós estavam ocupados tentando reerguer o acampamento antes de mais neve se acumulasse, o restante de nós estava cuidando dos feridos e procurando os que haviam desaparecido.

Cedric, Lyra e Diana haviam sumido. Quando voltamos, encontramos Kenji desesperado atrás de nós. Ele ficou aliviado quando viu nós dois bem, mas estava com uma expressão sombria agora que o tempo começava a passar e não encontrávamos os três.

—Acha que foram levados? —Trevis indagou, enquanto caminhávamos pelas imediações da floresta, tentando achar pegadas ou qualquer coisa que nos ajudasse, antes que a neve cobrisse tudo de uma vez.

—Eu não sei. Talvez... —Engoli em seco, olhando ao redor, para a fumaça negra das chamas que ainda persistiam no acampamento. —Me pergunto porque levar os três. Não me parece fazer sentido.

—Não precisa fazer sentido. —Trevis continuou a andar, indo mais à frente de mim, com a cabeça baixa. —Só precisa nos atingir de alguma forma.

Ele tinha razão. Independente de quem ela levasse de nós, nos atingiria de alguma forma. Soltei o ar com força, vendo minha respiração criar uma névoa assim que saia dos meus lábios. Continuei atrás de Trevis, olhando para a floresta e para o chão.

—AQUI! —Alguém gritou, me fazendo parar de andar e olhar para trás, vendo alguns dos homens entrar correndo na floresta. —A PRINCESA!

—Diana? —Trevis murmurou, antes de passar esbarrando em mim quando disparou naquela direção. Corri também, vendo que Kenji já estava se juntando a nós.

Desviamos das árvores enquanto corríamos, vendo o grupo de pessoas que estava no meio das árvores congeladas. Quando chegamos até eles, vimos que Diana estava caída no meio da neve, com um corte profundo na testa que sangrava sem parar.

—Ah não! —Trevis correu para junto dela, começando a ajudar os outros que tentavam acorda-la e ver se ela estava bem.

Só então percebi que Axel estava ali, se levantando do lado dela e vindo na minha direção. Ele olhou ao redor, antes de parar entre eu e Kenji. Ainda estava olhando para a princesa, que permanecia apagada.

—Eu a encontrei. —Axel indicou a direção do litoral. —Tem pegadas pra lá. Pelo menos umas 10 pessoas.

—Soldados da rainha. —Falei, vendo ele balançar a cabeça que sim. Saímos do caminho quando um dos homens pegou a princesa no colo e eles dispararam em direção ao acampamento de volta. —Ela levou os dois. Talvez fosse o plano dela desde o início. Atacar nossos piores pesadelos e nos deixar fracos. Então, quando eu havia enviado as safiras para longe, ela veio até aqui e levou dois de nós para nos atingir, agora que eles não podiam se defender.

Olhei para Kenji, vendo a expressão dura no rosto dele. Já tinha visto Kenji sério e infeliz antes. Mas não era nada comparado aquela versão dele ali na minha frente. Estava tenso, furioso e frio como uma pedra de gelo.

—Kenji...

—Vamos ver se a Diana está bem. —Afirmou, caminhando em direção ao acampamento a passos pesados, nos deixando para trás.

[...]

Segurei o prato de comida com as mãos um pouco trêmulas, antes de respirar fundo e finalmente entrar na barraca. A princesa estava sentada perto de uma fogueira, encarando as chamas enrolada em um cobertor. O machucado na sua testa havia sido limpo e ganhado um curativo um tanto chamativo. Ela girou a cabeça, percebendo que era eu ali.

—Vim trazer o jantar. —Falei, com a língua um pouco pesada. —E também queria conversar com você.

—Tiveram alguma notícia? —Indagou, observando eu me aproximar aos poucos, antes de me sentar ao lado dela e estender o prato com a comida fumegante que ela logo aceitou.

—Infelizmente não. —Suspirei, sentindo o ar frio ao meu redor. Já havia anoitecido de novo e não tínhamos uma notícia sequer deles. Não sabíamos ao certo o que a rainha pretendia.

—O que você quer conversar comigo? —A princesa começou a comer, parecendo alheia a minha presença ali. Mas eu sabia que estava prestando atenção em cada respiração minha.

—Cedric contou a vocês o que eu pedi em troca da minha ajuda? —Indaguei, vendo ele erguer os olhos confusos pra mim e negar com a cabeça. —Tenho uma ideia que pode ajudar a vencer a rainha suprema, dependendo do que acontecer quando formos até lá. Claro que tudo mudou agora, já que ela levou Lyra e Cedric. Mas ainda sim, acho que pode funcionar.

Enfiei a mão dentro do meu casaco, pensando nas últimas horas e em como eu me sentia sobre tudo que estava acontecendo. Com o coração martelando no peito, peguei a lágrima de sangue que eu carregava comigo, observando a flor brilhante e viva antes de estendê-la para ela.

—Eu nunca desejei ser a vilã da história, princesa. Fui colocada nessa posição, mesmo não desejando poder e a morte de ninguém. —Afirmei, enquanto ela trazia a mão até a minha e pegava a flor. —Não espero que confie em mim e que goste de mim. Na verdade, isso pouco me importa. Mas vamos lutar juntas agora e vamos precisar uma da outra se quisermos fazer isso dar certo e trazê-los de volta.

Ela me encarou por longos segundos, apenas absorvendo cada palavra que eu dizia. Seus dedos se fecharam ao redor da flor e ela balançou a cabeça em concordância.

—Sinto muito pelo seu pai. —Fiquei de pé, vendo os olhos dela me seguindo enquanto eu ia até a saída da barraca. —Quando a hora certa chegar, você irá desejar que todos os guardiões se tornem conjuradores. Vamos trazer minha linhagem de volta à vida.



Continua...

Um Mundo de Sombras / Vol. 2Onde histórias criam vida. Descubra agora