Capítulo 37: Dois garotos.

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Me sentei no chão, entre Axel e Kenji. Cedric estava na minha frente e formávamos um estranho círculo no meio da sala. O Livro das Revelações estava entre nós, fechado e pronto para responder algumas de nossas perguntas.

—O que vamos querer saber primeiro? —Kenji indagou, abrindo o livro e passando os olhos sobre os escritos estranhos que haviam ali.

—Sua mãe e a magia das trevas. —Cedric olhou pra ele, engolindo em seco. —Devlon disse que ela está matando os guardas e usando a magia para mantê-los ainda em ação.

—Um exército de cadáveres? —Axel fez uma careta, erguendo as sobrancelhas. —Acho que isso é demais até mesmo para ela.

—Bem, mas é verdade. E eu ainda vi com meus próprios olhos. —Cedric se remexeu, parecendo ficar desconfortável. —E a magia brincou com a minha mente. Me mostrou coisas que... que não existem.

—Como pode ter tanta certeza? —Axel indagou, soando extremamente ranzinza. —Você pode estar apenas ficando louco.

—Eu enfiei uma faca na garganta do cara e ele não caiu morto no chão! —Cedric exclamou, ficando vermelho. —Eu sei o que eu vi, tá legal? Mas lê a merda do livro e descobre sozinho se eu estou ou não falando a verdade.

Axel abriu a boca para retrucar e eu dei uma cotovelada nele, fazendo o mesmo me olhar de cara feia. Mas pelo menos ele ficou quieto. Olhei pra Kenji, vendo que ele parecia um pouco pálido. Talvez a informação nova sobre a mãe o tivesse assustado um pouco.

—Kenji, pode ver algo sobre isso? —Perguntei, vendo ele engolir em seco e assentir.

Ele segurou o livro, folheando um pouco até encontrar o que procurava. Agarrei a mão de Axel, enquanto Kenji começava a ler o que quer que estivesse escrito ali. As palavras pareceram flutuar para fora do livro, com uma magia única e luminosa. O ar pareceu parar por alguns segundos ao nosso redor, congelado, tenso, urgente e quente.

Kenji ficou com os olhos focados naquelas palavras e símbolos que saiam do livro, assim como Axel. Senti ele apertar minha mão, ao mesmo tempo que as palavras e a magia desapareciam aos poucos, deixando apenas a tensão no ar e a expressão séria de Kenji.

—O que era? —Cedric indagou, com uma expressão ansiosa. —O que o livro mostrou?

—Você não é louco. —Axel sibilou, estalando a língua. —Mas continua sendo um idiota.

—Dá pra parar? —Apertei a mão dele, vendo-o fazer uma careta. —Então, todos os guardas estão mortos?

—Parte deles sim. Ela está reunindo eles no castelo e possuindo-os com magia das trevas. Logo não restará um guarda que não esteja... —Kenji hesitou, com os lábios trêmulos. —Morto.

Ficamos em silêncio, encarando o livro que Kenji havia acabado de colocar de volta no chão, no meio de nós quatro. Fiquei encarando a capa, com aquela informação girando na minha mente, ao mesmo tempo que a culpa pesava nos meus ombros.

—O que você quis dizer com aquilo de a magia ter brincado com a sua mente? —Indaguei, erguendo os olhos para Cedric, que estava fitando Kenji com uma expressão impassível. Ele desviou os olhos pra mim, engolindo muito lentamente.

—Quando estávamos vindo pra cá de trem, fomos atacados pelos guardas. No meio da confusão eu vi minha mãe. —Ele encolheu os ombros. —Eu acho que era ela. Não tenho certeza, porque nunca a conheci. Mas ela era parecida comigo e... e me chamou de filho. Só que ela está morta. Eu sei que está.

Um zumbido atingiu meus ouvidos, enquanto o sangue parecia esquentar dentro do meu corpo, latejando em cada ponto, enquanto meu coração martelava no peito, chegando até minha boca, pronto para explodir dentro de mim.

—Aquele dia na Cidade dos Ossos. —Me virei para Axel, com as palavras dançando na minha boca. —Quando estávamos na rua, a noite. Você viu os dois garotos sentados na calçada, sujos, magros e sozinhos?

Axel piscou. Observei o movimento da sua garganta quando ele engoliu lentamente e então balançou a cabeça negativamente.

—Não havia ninguém nas ruas, Kay. Estávamos sozinhos. —Afirmou, juntando as sobrancelhas. —Não encontramos nenhum morador de rua, em nenhum momento. Muito menos dois garotos.

Fiquei de pé, tropeçando nos meus próprios pés, enquanto me lembrava perfeitamente daqueles dois garotos, de como eles se pareciam com meus irmão. Eu tinha certeza que havia visto. Eu tinha certeza absoluta.

—Kay, o que foi? —Axel se aproximou de mim, segurando meu rosto. —O que foi? O que está acontecendo?

Abri a boca para responder, tentando explicar aquilo. Mas nada saia da minha boca. Era tudo um borrão na minha mente.

—Kayla, fale comigo! —Axel praticamente implorou, enquanto apertava minhas bochechas e acariciava meu rosto.

—Ela fez isso comigo também. —Afirmei, soltando uma respiração pesada, enquanto a confusão na minha mente dava lugar a indignação. —Ela me fez ver meus irmãos na rua. Ela brincou com a minha cabeça também, Axel!

A raiva queimou dentro de mim, acendendo uma chama dentro do meu corpo, pronta para queimar e explodir. Cerrei as mãos, apertando meus dentes uns contra os outros enquanto uma fúria descontrolada fazia meu coração arder dentro do peito.

—Kay? —Axel chamou, parecendo entender perfeitamente o que estava acontecendo comigo.

Eu estava pronta para destruir uma cidade inteira de novo. Mas dessa vez... dessa vez usaria a raiva ao meu favor.



Continua...

Um Mundo de Sombras / Vol. 2Donde viven las historias. Descúbrelo ahora