CAPÍTULO 41

1.3K 149 24
                                    



Chiara Sienna Antonella Ricci Petrova – 16 dias antes


Flashback

"Bulgária, Fortaleza Konstantin – 4 de julho de 2012.

Papai me bateu e passei os últimos três dias na masmorra, comendo pão duro e água quente que pinga da parede suja. Mamãe tentou me entregar um pouco de leite com mel para que eu me sinta melhor mas joguei tudo na cara do guarda monstruoso que fica me vigiando vinte e quatro horas por dia. Preciso fugir. 

Durante o último ano é tudo em que consigo pensar. Dragomir tem me encurralado em cada cômodo possível, passando a mão pelo meu corpo, lambendo minha pele, me obrigando a tocá-lo em partes que jamais nomearia. O nojo por ele aumenta a cada dia, assim como minha rebeldia e a certeza de que ou irei matá-lo ou me matar antes que esse casamento aconteça. E papa parece pensar o mesmo, pois meus castigos ficam cada vez mais cruéis e longos. Agora tem um cobertor duro na masmorra e capim para amortecer o chão onde durmo a maior parte da semana, porque os castigos estão sendo emendados uns nos outros. 

Papa não sabe que agradeço a masmorra escura, que prefiro dormir aqui, no capim cheio de pulgas, lambendo a pedra suja da parede do que ficar em meu quarto, onde Dragomir possui livre acesso. Na masmorra, fico segura. Escondi dois livros, esse diário e uma lanterna em um dos buracos na parede, e sei que no final dela há um buraco pequeno, que dá acesso a um tunel que não sei onde vai parar. Esse tunel é tudo que consigo pensar. Não consigo passar pelo buraco, mas se eu conseguisse abri-lo mais um pouco, eu teria acesso livre para Deus sabe onde, mas preciso de ajuda e não confio em ninguém. Tenho quatorze anos e o mundo parece estar contra mim. Entre os jantares com homens importantes do país, as aulas, treinamentos e castigos, pareço não ter espaço para nem mesmo respirar. Controlam até mesmo a forma que pisco, e os batimentos do meu coração. A não ser nas noites de treinamento com a Senhora Samir, que me faz usar roupas de rapazes e me leva por toda a fortaleza, nos últimos meses tenho tomado consciencia da gravidade das ações de nossa família, todo o mal que causamos ao mundo para benefício próprio. Os horrores de todas as mulheres lá embaixo. Os bebês mortos, as meninas mais novas que eu que parecem querer sumir do planeta. Se eu pudesse, resolveria tudo. Tentamos levar comida e remédios para elas todas as noites, mas é difícil. Papa parece desconfiar de tudo e de todos, aumentando a segurança exponencialmente. As noites são longas, mas os dias são excruciantes. Quero ser livre. Preciso ser livre."


Releio as palavras borradas de meu diário amassado, que recuperei no esconderijo na marmorra, para onde Papa me mandou ontem a noite, após Dragomir e eu termos lutado em cima da mesa do jantar. Espalhando comida por todos os lados. Inclusive no vestido caro da nova-antiga noiva de Dragomir, a preciosa Annabella Troushër.

Seu sobrenome me faz rir toda vez que penso nele.

É uma pena que a doce Anna não saiba falar português, porque se soubesse não seria uma tremenda trouxa por ficar, esperando que Dragomir a escolha, quando poderia ir embora ilesa. Meu pai já autorizou sua partida, mas a afetada aristocrata alemã parece apaixonada pelo traste do meu primo. E agora ninguém sabe o que fazer com ela. Matá-la não era uma opção. Poligamia também não. Ela parecia mais do que feliz de se contentar com o cargo de amante.

E eu poderia vomitar. E foi isso que fiz. Dragomir mandou um beijo estalado em minha direção, e enfiei dois dedos na guela, forçando um som asqueroso de ânsia para fora de mim. Caí na risada com a cara de choque de todos os meus tios e primos ao redor da mesa. Minha mãe parecia pálida, e meu pai, furioso. Dragomir não perdeu tempo em atravessar a mesa, completamente ultrajado.

REDENÇÃO - Irmãos Fiori: Livro III - COMPLETOOnde as histórias ganham vida. Descobre agora