CAPÍTULO 42

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CHIARA SIENNA ANTONELLA RICCI PETROVA 


10 dias antes

"Bulgária, Fortaleza Konstantin – 7 de novembro de 2012

[...] Eu não consigo entender porque a polícia não os prende. Porque o exército não se une para derrubar essa fortaleza e matar todos nós. A certeza de que o inferno é nosso destino final fica mais clara a cada dia. Não tenho acesso à nenhum celular ou computador. Todos os meus passos são vigiados. Senhora Samir já me explicou que não há provas concretas contra meu pai. Que ele é mais poderoso do que consigo imaginar. Mas não entendo porque precisamos fazer pessoas e famílias sofrerem para sustentarmos a nossa. A quantidade de meninas que chegam nos caminhões de madrugada tem aumentado cada vez mais. Senhora e Samir e eu não damos conta de cuidar dos machucados de todas, de ajudá-las da melhor forma que podemos, com comida e remédios. A cada dia que passo odeio mais tudo isso. Preciso fugir. Não posso escrever como pois alguém pode achar esse caderno e estarei perdida. Mas vou fugir. Vou fugir, encontrar ajuda e nunca mais pisar nesse lugar."

É engraçada a capacidade humana de se adaptar as situações mais extremas com naturalidade. Acredito que meu passado de abusos facilite com que eu volte ao ritmo doentio da Fortaleza Konstantin.

Eu e Dragomir havíamos lutado de novo. E agora, já sei todo o caminho que preciso fazer para chegar até o escritório de meu pai. E eu havia repetido o trajeto tantas vezes, que agora conseguia chegar até a saída da ventilação que me dá uma vista perfeita para o quatro que esconde um cofre que eu conhecia muito bem, em exatos dois minutos e quarenta segundos.

Agora eu só precisava que meu pai aparecesse no escritório e digitasse a porcaria da senha. Mas nos dez minutos diários que me permito transitar pelos tuneis de ventilação saindo do meu quarto, Papa Ivan jamais nem sequer entrou no cômodo.

Com a ajuda de Küster, eu havia conseguido entrar também no túnel de ventilação do banheiro do segundo e terceiro andar. Já havia fotografado mais quinze das cinquenta – que agora eu tinha conhecimento de possuir – fotos que cabiam na pequena câmera descartável. Papa Ivan e seus homens aparecem na maioria delas. É uma pena que eu não consiga gravar. Uma câmera de verdade jamais entraria aqui dentro, não com todos os sensores espalhados. A pequena câmera de plástico com aspecto infantil teria que servir.

Infelizmente, nenhum desses andares me levam até o grande galpão no subsolo. Sei que para isso, terei que fazer o que Senhora Samir sempre me ensinou. Me esgueirar do meu quarto às duas, com a ajuda de Küster. Roupas masculinas. Cabelo num boné. Passos longos. Troca de turnos.

A troca acontece a cada oito horas, e é durante ela que nós utilizávamos cada grama de músculo para nos esgueirar através de uma entrada dentro de um poço seco no fundo do terreno da fortaleza que não possuia nada além de árvores antigas e pouquissa iluminação. Dessa forma, possuia também nenhuma monitoração por câmeras. Apenas o muro acima do poço, e a porta dos fundos.

Nunca entendi completamente porque era tão importante para Senhora Samir que eu visse, com meus próprios olhos, os horrores que meu pai cometia. Não podia ser apenas para me tornar mais forte, mais consciente.

Acho que Senhora Samir sabia que um dia, eu fugiria.

Um dia eu precisaria saber como utilizar cada canto dessa Fortaleza à meu favor.

Ver o que ninguém mais via. Roubar o que eu podia, e assim, me defender.

Por mais que eu saiba que posso simplesmente contar a Küster como chegar até o galpão através do poço seco, sei que ele jamais poderia se comprometer assim. Ele é gigante demais para passar de percebido. Um rosto exuberante demais. E jamais caberia na passagem de madeira que leva para a antiga encanação, que dá diretamente a uma saída em um canto no chão dos dormitórios improvisados, imitando perfeitamente os grandes pisos. Ao contrário de mim, que desde meu último castigo estou vivendo de casca de pão, pescoço de galinha e folha de beterraba. Ideia de Dragomir e que, por mais que me doesse admitir, estava me custando músculos que eu não estava disposta à perder.

REDENÇÃO - Irmãos Fiori: Livro III - COMPLETOWhere stories live. Discover now