1. Caminhada dos mortos

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Hannah escutou atentamente na porta para os ruídos. Os ruídos suaves e incertos. Os ruídos que ela tinha ouvido na calada da noite antes de seu irmão ser tirado dela. Ruídos que pareciam sempre acompanhar o Homem Brilhante.

Mas essa porta estava na cozinha de um Castelo! O rei havia prometido que o Homem Brilhante não poderia entrar aqui! E a porta não levava para fora, mas entrava mais fundo na casa real.

Levava às adegas abaixo, onde armazenavam as raízes de inverno, o óleo, as ervas secas e o vinho de cozinha. Havia outra porta lá embaixo que ligava o porão ao resto dos níveis inferiores do castelo, mas essas também eram seguras. Nada poderia estar lá embaixo. Certamente não o Homem Brilhante.

Era tarefa de Hannah descer e pegar coisas para o cozinheiro Shelton no porão, desde que não fosse muito pesado para ela levantar e carregar.

A cozinheira a estava ensinando a preparar as deliciosas refeições que alimentavam até o rei! Um dia, Hannah esperava usar o avental branco engomado e o chapéu que o cozinheiro Shelton usava.

Era um uniforme, mas um uniforme melhor do que o da Guarda. Ela faria qualquer coisa para usá-lo ela mesma.

Mas, hoje, ela não queria fazer sua única tarefa, que era descer ao porão. Ela pegou a bainha de seu vestido ansiosamente.

—Hannah, eu precisava do alecrim ontem, querida!— Cook Shelton chamou por cima do pássaro que ela estava depenando.

Hannah saltou no ar como se fosse um grão de milho em óleo quente.

Sua boca se abriu para explicar sobre os barulhos e o Homem Incandescente, mas antes que ela o fizesse, a cozinheira de bochechas rosadas soltou um suspiro exasperado.

—Hannah, — ela parecia bastante irritada, —não há tempo para ficar sonhando acordada, garota, vá buscar o alecrim para mim rapidamente!

Piscando rapidamente, Hannah agarrou a frente de seu vestido cinza simples, embora bonito. Ela ainda tinha sapatos e fitas de cabelo. Ela tinha um lugar quente para dormir que era todo seu e muito para comer.

Ela nunca teve tanto em termos de conforto material. E o cozinheiro Shelton foi tão gentil com ela. Ela pediu a Hannah tão pouco em troca. Ela tinha que fazer o que Cook queria.

Assim que Cook estava prestes a perguntar de novo, Hannah abriu a pesada porta de madeira e metal. O ar frio do porão a invadiu.

Estava perfumada com os cheiros de água e pedra e... esse era o mais leve cheiro de podridão? Se fosse, provavelmente era apenas algo na despensa que havia explodido.

Isso foi tudo.

Este era o castelo.

Era seguro.

Respirando fundo, Hannah colocou um pé no primeiro degrau de pedra. Ela engoliu. Sem ruídos. Apenas silêncio e uma estranha sensação de eco que sempre parecia ocorrer nos níveis mais baixos do castelo.

Houve momentos em que ela estava lá embaixo onde ela imaginava que estava no limiar de um lugar mágico.

Houve momentos em que essas imaginações eram tão fortes que ela pensou ter visto figuras com orelhas pontudas em vestes pretas e douradas lançando feitiços mágicos com o canto do olho.

O Homem Brilhante também tinha orelhas pontudas, mas não era como essas figuras fantasmagóricas que de alguma forma irradiavam calor, conforto e cheiro de flores. Quando ela tentou olhar diretamente para eles, eles desapareceram.

Eles estavam apenas em sua mente, é claro. Eles não eram reais. 
Ela se sacudiu. A última coisa que ela precisava era que sua imaginação estivesse em alerta máximo.

Cinders and Ashes  - ziamWhere stories live. Discover now