Um novo sentimento

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Ba me procurou a uns dois dias atrás, com uma história sem nexo de que eu poderia confiar em Padre Aurélio. Contou-me que veio vê-lo, pois havia percebido algo diferente em seu olhar, algo que o fazia diferente de todos desse lugar, mas isso não foi o que me incomodou. Ba me questionou como era meu relacionamento com Padre Aurélio, se conversávamos e tínhamos boa convivência, tudo isso para me dizer que ela gostaria muito que fossemos amigos, pois eu poderia leva-lo a Cabana...

Como Ba pode pensar algo assim? A Cabana sempre foi meu lugar magico, nosso lugar magico, desde quando eu estava aprendendo a falar. É um lugar muito importante para mim, o único lugar em que me sinto bem, mesmo sendo uma noviça.

Ba me fez prometer que iria pensar nisso, me assegurou que posso confiar nele e eu sei que Ba consegue ver a alma das pessoas, ela saberia se Padre Aurélio não fosse de confiança. Mas eu não quero dividir aquele lugar com mais ninguém além dela...

Eu estava totalmente distraída, pensando nisso, enquanto ajudava as irmãs na cozinha no almoço quando Madre Pacifica apareceu com uma expressão extremamente seria... Poucas vezes a vi assim.

- Atenção a todas, não as quero circulando próximo à igreja e o pátio ao lado após o almoço. A freira, ou noviça, que for pega circulando por lá, será castigada. Após o almoço quero todas em suas respectivas celas, rezando pelas almas pecadoras deste mundo. Esta claro?

- Sim Madre Pacifica! – Todas respondemos, mas eu não estava satisfeita.

Este anuncio não é tão atípico quanto parece. Uma vez por mês a Madre aparece com o mesmo discurso e expressão nada amigável, porém nunca nos foi dado uma explicação. O que há perto da igreja que não podemos ver, ou tomar conhecimento? Qual é o mistério?

Eu não consigo achar uma boa explicação em minha mente. Mas também não importa, hoje eu irei descobrir.

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Eu necessitava descobri o que estava acontecendo, o que tanto Madre Pacifica queria ocultar.

Sai pelos corredores do primeiro andar, alerta a cada detalhe. Estava próxima a varanda com vista para o pátio e ouvia barulhos de uma pequena multidão de pessoas. Virei o ultimo corredor e o encontrei.

Padre Aurélio estava de costas para mim, olhando para o pátio abaixo dele. Parecia-me estar tão concentrado, que mal pode perceber minha presença. Eu tentei passar sem que ele pudesse me enxergar, então ele virou-se para o lado oposto ao que me encontrava e levou as mãos ao rosto, pressionando os olhos, como se enxugasse lagrimas. Por um segundo me forcei a não ter pena, a não me importar e voltar a esconder-me. Só por um, talvez dois, segundos.

- Estas chorando? - Eu não devia, mas perguntei e me aproximei. Ele tirou as mãos do rosto e percebi que estava sem barba,

- O que faz aqui? - Perguntou-me rapidamente, segurou meu braço e tentou tirar-me de lá.

- Solte-me. - Puxei o braço com força e me soltei. Aproximei-me da varanda e pude entender a preocupação de Madre Pacifica. Havia uma pequena multidão de pessoas, mas muito alvoroçadas, a frente de um palanque de madeira, onde havia duas mulheres e um homem, presos em troncos e implorando por piedade, prestes a morrerem queimados pelo fogo que já ardia abaixo deles. Olhei para nossa frente e lá estavam Padre Pedro e Padre Francisco, acompanhados de alguns senhores nobres e assistindo a tudo, como se assistissem um grande e bonito espetáculo. - Oh, Céus! - Senti meus olhos lagrimejarem, minhas pernas fraquejarem e minha audição sumir. Padre Aurélio me segurou.

Sor Maria - O Espelho I (Sem Revisão)Where stories live. Discover now