"...harmonia..." - Parte 1

9.4K 708 513
                                    


Twitter: ISBB5H

Narração: Camila

Miami – South Beach – Posto da Guarda – 09:15

Deixei que meus dedos passeassem pela superfície irregular das tábuas de madeira. Pintadas de azul caribe, descascadas e cheias de pontas ásperas, mas tão familiares às minhas digitais. Encontrei a meio percurso o binóculo gasto e agarrei-o, pressionando-o contra o peito. Passei a corda pelo pescoço, sentindo seu peso em meu corpo e me assustei ao escutar a porta bater com força atrás de mim. – Hey! – Gritou uma mulher. – O que pensa que está fazendo aqui? – Seus cabelos estavam soltos, mas pareciam pesar demais para que a brisa os balançasse. Castanhos, ondulados, mais que os meus. Seus olhos também escuros e arredondados, assim como suas bochechas cheias, castigadas pelo sol forte. Vestia um short preto e uma camiseta já gasta da Guarda, mas seus traços denunciavam a pouca idade. – Perguntei o que está fazendo aqui? Vocês turistas não podem fazer o que bem entendem! – Me esforcei para encaixá-la em alguma, qualquer uma das minhas memórias, mas nada aconteceu. Eu não a conhecia e claramente nem ela a mim.

– Eu... – Tentei pensar na melhor maneira de desfazer aquele mal entendido, mas de certa forma me divertia o fato de não ser reconhecida. – O meu nome é Camila e eu...

– Você vai sair. – A novata cruzou os braços abaixo dos seios e se esforçou em sua pior careta. – Imediatamente.

Antes que eu pudesse me mover, uma voz familiar preencheu o apertado ambiente. – Está tudo bem por aqui? – Ellie perguntou ao entrar. Carregada pela surpresa da minha presença, ignorou a garota desconhecida e cortou o pouco caminho restante entre nós duas, me tomando em seus braços com urgência. – Mila, eu senti tanto a sua falta! – Girou nossos corpos alegremente em meio a risos. – E me perdoe pelo mal entendido, ela é nova aqui e ainda tem muito que aprender.

– Está tudo bem, não se preocupe. – Pisquei para a novata. – Ela estava apenas fazendo o seu trabalho. – Estiquei um braço para frente como uma oferta de paz. – Não tivemos a chance de nos conhecer ainda, mas o meu nome é Camila e eu também trabalho para a Guarda.

A garota não ofereceu a mão. Ou seu nome. Ou mesmo um sorriso. – Trabalha mesmo? – Pediu por uma confirmação à supervisora que apenas acenou com a cabeça, encorajando-a a se desculpar. – Ok. Foi mal. Eu não poderia simplesmente adivinhar, você nem ao menos está usando um uniforme.

– De qualquer maneira. – Elena interrompeu-a. – É muito bom te ver, Mila. Você faz uma falta enorme, sabia?

– Também senti a sua falta. – Deixei meus cabelos serem afagados vagarosamente, exatamente como a loira gostava de fazer. – Estou aqui para entregar alguns documentos. Para você.

– E o que vou encontrar dentro daquele envelope?

– O meu retorno. – Respondi animada.

O semblante de Ellie se apagou diante da notícia. – Mesmo? Isso é, isso é maravilhoso! E para que dia agendaram o seu retorno?

– Para hoje. N-não te... Avisaram?

Ela riu sem humor. – Não. Não avisaram. – A supervisora olhou para baixo, para o lado e todas as direções possíveis parecendo confusa quanto ao que fazer em seguida, até que seus olhos perdidos se prenderam na figura, ainda estranha, entre nós. – A propósito, essa é Maia. Nossa nova aprendiz.

Franzi o cenho confusa quanto ao rumo dado a conversa, mas não protestei. Imediatamente me recordei do programa em questão. Uma proposta integrada a escolas do estado para contribuir com o desenvolvimento profissional, intelectual e social de jovens economicamente vulneráveis. – Mas os aprendizes designados à Guarda não costumam ficar na Central?

Guarda VidasWhere stories live. Discover now