Capítulo 1 - Seu trabalho é me obedecer

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— Catarina, que diabos é isso? — berrei com o meu sotaque carregado e os olhos semicerrados enquanto encarava incrédulo a sujeira na minha frente. — Você é paga para limpar, ou esqueceu desse detalhe?

Ela logo se apressou com um pano úmido nas mãos, sabia o quanto eu detestava pessoas lerdas e provavelmente não queria se dar ao luxo de ser tachada como uma, embora eu mentalmente a estivesse julgando de qualquer jeito.

Fiquei apenas parado de frente para aquela imundície fitando-a com nojo. Não daria o próximo passo sem que tudo estivesse perfeitamente limpo, pois eu odiava sujeira acima de tudo.

— Sinto muito, príncipe Noah — disse a empregada, fazendo uma breve reverência antes de se retirar com o vestido surrado que sempre usava.

Deveria ter alertado ao meu pai para que trocasse as roupas dos empregados, já estava me dando náuseas olhar para aquelas roupas amareladas que um dia já foram brancas. Prometi a mim mesmo que o faria assim que ele chegasse de viagem.

Com o chão limpo, me atrevi a dar o próximo passo com o queixo empinado exibindo a minha magnífica coroa dourada que eu raramente tirava e o peito estufado com a minha postura impecável e o andar confiante.

O palácio era repleto de pinturas antigas e quadros de família que não valorizavam nem um pouco a parede que já era horrorosa por si só. Eu tinha certeza de que me livraria daqueles quadros assim que virasse rei, visto que não queria passar décadas com a cara dos meus ancestrais grudada na parede.

No mínimo, colocaria um quadro gigantesco com o meu rosto, já que apenas eu importava e não aquele mar de defuntos que provavelmente viraram cinzas antes mesmo de eu pensar em nascer.

Já estava farto daquele palácio com as mesmas paredes cor de ocre que me davam calafrios pelo mau gosto e os empregados nada prestativos ou divertidos que nem ao menos se davam ao trabalho de me entreter.

Queria mesmo era voltar ao Clube5 como eu fazia quase todas as noites. Era um dos poucos clubes da Ilha das Flores que realmente valia a pena conhecer. Tinha umas músicas que davam vontade de dançar, diferente das músicas clássicas e chatas que meu pai me obrigava a ouvir. Por isso eu adorava quando ele viajava, eu me sentia livre para fazer o que quisesse, sem regras, uma vez que eu detestava regras.

Mas na maioria das vezes eu não ia para o clube curtir as músicas. Na verdade eu mal as ouvia, porque eu estava muito ocupado bebendo a maior quantidade de álcool possível simplesmente para que eu pudesse deitar na minha própria cama, ouvir a porta do meu quarto ranger e ela se aproximar com o tubo e os objetos nas mãos enquanto eu fechava os olhos e fingia que tudo não passava de um pesadelo, além de tentar esquecer aquela dor que me causava fissuras bem graves. Sempre rezava em silêncio para que fossem apenas coisas da minha imaginação fértil.

O álcool era a única forma de eu dormir em paz sem querer me suicidar no dia seguinte.

Caminhei com passos firmes, mas lentos, porque eu não gostava de correr sem motivo. Gostava de admirar a paisagem, mesmo que não fosse do meu agrado. Honestamente, eu não sabia como o meu pai teve a coragem de pintar todo o palácio daquela cor. Pelo menos ele teve a decência de me deixar escolher a cor do meu próprio quarto.

Também, não era para menos, ele mal ficava em casa. Passava dias em reuniões inventadas, pois todos sabiam que não passava de uma desculpa para ficar com várias modelos e outras mulheres muito mais bonitas do que a minha mãe.

Ele não dava valor a ela e nem o mínimo de respeito, talvez por isso a pior parte da culpa caísse sobre mim quase involuntariamente.

Pensar nisso doía e, quando começava a me angustiar, era porque estava na hora de ir para o Clube5 tentar anestesiar aquela dor massacrante com doses pesadas de álcool.

Feche a porta quando sair ✅Where stories live. Discover now