Capítulo I

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                            CHLOE

O ar estava seco e os ventos que passavam pela janela eram tão fracos que mal conseguiam balançar meus cabelos. Apesar de ser outono e o inverno estar á caminho, o sol estava alto e o clima abafado ao ponto de nos fazer suar logo após um banho. Eu estava sentada na beira da janela, encarando o que eu podia ver do jardim. Algumas poucas borboletas brincavam ao redor das flores que uma das outras garotas do orfanato amava cuidar. Sempre gostei de borboletas.

Mordi o pedaço do bolo que estava em um pratinho sobre meu colo. Miranda o fizera e trouxera para mim minutos antes de eu resolver me sentar ali, um dos meus lugares preferidos naquele orfanato. Miranda era quem cuidava de todas nós e do lugar, junto com suas outras três irmãs.

Sempre considerei Miranda como uma mãe, e podia dizer que o sentimento materno era recíproco. Ela nunca me deixara ir embora quando alguma família estava disposta a me adotar, mesmo que não me contasse, eu acabava descobrindo. Eu não a questionava, estava bem ali, apesar de toda a reclusão, apesar de nunca poder sair daqueles portões, mas nada lá fora me fazia falta, afinal, eu não sabia o que esperar do Reino. Se Miranda quisesse me manter com ela, estava tudo bem, ela era minha única família. Bom, havia também minha melhor amiga, Gina.

Ela e eu éramos inseparáveis e perambulávamos pelos corredores do orfanato sempre atrás de algo para aprontar. Dizíamos que éramos irmãs para todos. Eu sentia falta dela, de sua energia e seu ânimo, de sua alegria e espontaneidade. Ela fora adotada há dois anos e me visitava sempre que podia. Ainda tínhamos contato por telefone também. Quando ela fora adotada, sua família queria me levar junto, mas Miranda não deixara. E eu realmente pensei em questionar porque eu queria ir. Mas não questionei.

Nunca questionei muitas coisas em minha vida, e acho que me acostumei com isso: aceitar o que viesse e lidar. Foi a maneira que encontrei de não me sentir mal por ter sido abandonada por meus pais.

Eu até gostava da minha vida no orfanato. Eu não tinha muitas amizades, mas podia telefonar para Gina sempre que havíamos algum telefone disponível. Minha esperança de ser adotada foi morrendo enquanto eu crescia, mas depois de um tempo, eu não tinha mais tanto esse desejo. Já havia me acostumado em ter Miranda comigo. Apesar de não ter questionado, eu tive raiva dela quando ela não me deixou ir com Gina, mas passei dias pensando que ela provavelmente só queria me manter perto dela, e a nuvem de raiva se dissipou e eu percebi que não sairia dali tão cedo, apesar de saber que também não ficaria para sempre.

– Chloe! – Ouço Miranda chamar quando estou saindo da janela e indo para cozinha. As meninas que estavam por perto fecham a cara. Sempre tiveram ciúmes de mim e Miranda. Completamente desnecessário, suponho eu. Ela era como uma mãe para qualquer uma ali, sempre cuidando e vigiando todas nós.

– Oi. – Beijo sua testa e tiro uma mecha grisalha dali. Ela sorri, mas parece nervosa, ansiosa até. Nos últimos dias ela andava tensa sempre que estava perto de mim.

– Vamos conversar lá em cima. – Ela pega minha mão e vamos para o terraço.

Sim, ela estava nervosa, suas mãos estavam trêmulas e seu sorriso não chegava totalmente aos olhos. E ela parecia séria demais ao me arrastar lá para cima. Miranda só chamava alguém para conversar a sós no terraço quando fazíamos algo errado, éramos adotadas, ou iria nos expulsar. O que significava que algo importante estava a caminho. Resolvi não tentar adivinhar o que era, pois deduzia que talvez não fosse apreciar muito a resposta.

Sentamos nas poltronas brancas, um tanto desgastadas e com alguns pequenos rasgos. Sorte a minha que Miranda nunca descobrira que eu fui o motivo do maior daqueles cortes, há anos atrás.

Floresta do SulWhere stories live. Discover now