4.

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Nunca acreditei em fada madrinha até conhecer Dona Missouri. A Senhorinha tem coração de mãe, colo de vovó e ombro de amiga. Seu olhar é doce, porém suas palavras podem soar duras para quem ainda não está disposto e preparado o suficiente pra escutar umas boas verdades. É engraçado, foi só ela chegar que parece que a vida de todos finalmente entrou nos eixos. A idosa tem uma energia reconfortante e uma sabedoria de guiar a alma mais perdida da face da terra.

Não demorou muito para que a reforma na casa de Geórgia e Alexia terminasse e muito menos ser vendida. Afinal, quem não deseja morar numa propriedade confortável, enorme e arejada como àquela e ainda por um preço acessível? Pois é. Logo depois, meu casal favorito comprou uma casa no mesmo bairro em que Anahí reside e aqui estou eu ajudando na mudança. Só que a irmã não está nada feliz de não poder mais ter a família toda reunida debaixo do mesmo teto, principalmente agora que Phill e Fischer estão de volta a cidade em definitivo. Segundo eles, já passaram tempo o bastante viajando pelo planeta e agora desejam estar no aconchego da família para aproveitar o que lhes resta de vida, como se os idosos dessa família não fossem passar dos cem tamanha a jovialidade.

— Ah vai, para de chororô — Alexia pede abraçando a irmã mais velha. — Vamos morar no mesmo bairro a seis quarteirões de vocês...

— Seis quarteirões! Seis! - enfatiza fazendo bico e ilustrando uma expressão dramática.

— Estávamos parecendo camundongos dividindo uma gaiola — a loira retruca revirando as safiras que chama de olhos.

— No tempo das cavernas os familiares dormiam todos juntos bem agarradinhos... — aperta as bochechas da irmã mais nova e esta bufa.

— Deus me livre! Quero é distância de vocês, estou cansada de reprimir meus gemidos...

— Como se o médico não tivesse te proibido de executar tarefas exaustivas, né querida?

— E quem disse que eu preciso me mexer?

— Meu Deus Alexia! Nem grávida você sossega essa perseguida! Só pensa em sexo!

— Estou grávida, não morta!

Só faço rir da discussão cômica enquanto estou sentada na poltrona, terminando de desembrulhar uma caixa de papelão com objetos de decoração pra sala. Do outro lado estão Phill, Rubem e Geórgia conversando animadamente bebendo uma cerveja, e as crianças correm de um lado para o outro como sempre fazem.

Dona Missouri e Fischer chegam com uma bandeja de chá com biscoitos e serve a todos exceto aos três que ingerem álcool.

Devo mencionar que o chá de Dona Missouri parece milagroso porque tudo que faz é com amor. Até Alexia obteve uma melhora surpreendente depois da chegada dela. Chegada essa que foi recheada de surpresas e revelações sobre Diana, e eu pude comprovar os dons da Clarividência da mulher mais velha. Por um momento pensei que ela havia se suicidado e quase tive uma parada cardíaca.

Alexia, Anahí e eu damos uma pausa nas tarefas para o lanche. Fischer se junta as irmãs na conversa e Dona Missouri se senta ao meu lado numa cadeira disponível.

— Tudo bem minha querida?

— Sim e a senhora?

— Bem também. E você pensou no que eu te disse sobre a Diana?

— Ah, não sei se tenho algo pra pensar. Eu não entendo porque ela abriu mão de uma carreira tão promissora na Europa pra voltar pra Dillon.

— Como te falei, acho que ela estava precisando retornar as raízes pra refletir, visto que parece que ainda não desapegou mentalmente de seu passado turbulento. Talvez, depois dessa temporada em Dillon, ela finalmente consiga seguir em frente.

— Então não tem porquê eu ir lá, não é? Ela quer ficar sozinha.

— Só existem dois tipos de pessoas nas circunstâncias de Diana: As que se isolam porque querem realmente ficarem sozinhas por uma questão de autossuficiência e as que estão gritando em silêncio por socorro.

Termino o gole do chá e a fito:

— Pelo que conheço da Diana acho que ela se encaixa mais na segunda opção.

— Unrum, exatamente. A pessoa estar viva depois de um golpe emocional não significa que ela esteja de fato bem, entende? Diana é ainda uma criança que precisa de atenção. Porém, não pense que a recuperação dela depende unicamente de você. Ninguém pode salvar o outro se ele não quer ser salvo. Só faça a sua parte e deixe a dela pra ela, senão, ao invés de resolver essa situação, vai sair mais magoada dela.

— Eu não sei o que fazer. Eu tentei ajudá-la, mas ela é complicada, esquiva e arisca demais.

— Você está falando como a Gwen amiga, e não a que está apaixonada por ela. Admitir isso vai te mostrar qual é a melhor forma de agir pra resgatá-la do abismo em que está vivendo.

— E se ela me desprezar como costuma fazer quando está ferida?

— Na verdade nunca foi sobre só ela, mas sim sobre você também. Pense. Vai conseguir seguir sua vida normalmente sem fechar esse ciclo? Se acha que sim, descarte tudo que te disse até agora.

— Infelizmente não — suspiro fundo. — Só queria resolver essa situação com ela de uma vez por todas. É difícil até trabalhar pensando nela, no vazio que ficou entre a gente. Eu até tentaria superar se ela tivesse me dito que não queria mais saber de mim, mas ela nunca disse sequer adeus. É isso que me atormenta.

— Pois é — dá com os ombros. — Vai ser bom pras duas esclarecerem isso pessoalmente.

— A senhora tem razão, — concordo me sentindo vencida — mas não posso deixar meu trabalho assim...

— Não se preocupe com o trabalho — Alexia interfere demonstrando que estava ouvindo toda conversa. — Você merece uns dias de folga — alisa minhas costas amigavelmente. — Nós damos um jeito por aqui.

— Pode ir no meu carro — Geórgia surge não sei de onde também deixando óbvio que estava a par do assunto, me entregando a chave do seu automóvel, como se eu estivesse habituada a dirigir. Sorrio sem graça. — Embora eu seja a irmã dela e esteja disposta a ir até Dillon pra saber como ela está, acho que você é a pessoa mais indicada pra se aproximar dela nesse momento visto que Diana vai me tratar com hostilidade por conta do meu sumiço e a morte do nosso pai. — ela explica e me sinto encorajada a pegar as chaves de sua mão, cumprir o papel que me cabe e encerrar essa etapa das nossas vidas.

O Amor Na Balança ( Sáfico) Where stories live. Discover now