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Só de pensar que ontem a essa hora da noite estávamos no apartamento de Lauren socializando amigavelmente até alta hora da madrugada meu coração dá um nó e a vontade de me derramar em lágrimas se torna cada vez maior. Ganho um beijo suave na mão e um olhar que abraça de Diana. Abro um sorrisinho sem humor apenas para corresponder seu carinho. É como Dona Missouri disse; ter Diana ao meu lado me dá forças para enfrentar mais esta situação. O universo não me dá uma trégua, parece que o autor da minha vida está brincando com minha cara e se divertindo com minha desgraça. Mais uma vez tive que deixar minha rotina completamente estabilizada, meu gato aos cuidados da família Aderson's, para fazer uma viagem indesejável. O bom nisso tudo é que Diana fez questão de me acompanhar. Ela ainda está meio perdida quanto ao que fazer, não sabe se quer procurar um emprego ou fazer outra faculdade. Mas eu sinto que ela deseja se desculpar publicamente com a empresa francesa que a contratou. Espero que ela faça isso quando voltarmos para Nashville. Parece que é só isso o que falta para ela seguir em frente de vez, mais leve, pois está muito envergonhada do papelão que protagonizou.

Agora estamos saindo do aeroporto e entrando num Uber para locarmos um carro pelo tempo que ficarmos no Estado do Mississippi. Não é de se admirar que ela queria ter pegado a rodovia ao invés de virmos de avião. Argumentei que seria mais rápido visto que estamos lidando com um caso crucial e ela concordou. É uma piada amarga que minha namorada tenha que conhecer seus sogros numa situação como esta. Por incrível que possa ser, não estou nada desesperada e totalmente conformada se o destino do meu pai for partir dessa pra melhor. Acidentes acontecem não é? Ainda mais ele que passou boa parte da vida na estrada. Se ele morrer, morrerá tendo feito o que mais gostava que é conduzir um caminhão. Eu mais do que ninguém sei que a vida na terra é passageira e que a morte é só uma passagem para uma outra dimensão. Então, não há outra saída a não ser tentar compreender os desígnios da vida e dessa força invisível e maior que nos rege. Depois do susto pela notícia inesperada consegui refletir e me acalmar, porque tem coisas que estão fora do nosso controle e a ideia de que podemos controlá-las é que nos faz sofrer. Além disso, fui eu que tomei a decisão de me afastar dos meus pais porque não me sentia bem na presença deles. A doença e a morte só nos faz pensar que deveríamos aproveitar melhor a companhia ao lado de quem amamos porque para morrer basta estar vivo e o próprio tempo não volta mais.

— Tem certeza que você está bem? — questiono levemente preocupada com o silêncio da minha namorada desde que saímos da cidade enquanto ela dirige até a fazenda onde morei por longos e pesados anos da minha existência. Me comuniquei novamente com minha mãe e ela sugeriu que eu primeiro deixasse minhas bagagens em casa para ficar mais confortável e então só depois ir para o hospital porque segundo os médicos meu pai só está sendo mantido vivo com a ajuda de aparelhos.

— Ah, sim, é só que... — Diana coça a cabeça. — Ter que lidar com enterros de novo me causa um pouco de ânsia de vômito. Não queria conhecer seu pai no fim da vida dele.

— Eu também não queria que você conhecesse meus pais assim. Mas fomos praticamente arrastadas para cá. Agora é encarar.

— Tem razão. Vamos encarar juntas — garante mais confiante e eu respondo com um sorriso sereno.

Assim que Diana estaciona em frente a fazenda eu solto um suspiro pesaroso. É péssimo estar de volta. Todos meus traumas infantis retornam de súbito e me causam vertigem.

— É um belo lugar! — Diana comenta já fora do carro espreguiçando-se enquanto olha ao redor.

Desço do carro e faço o mesmo. Olho para a casa espaçosa de dois andares, um celeiro, um trailer carro onde fizemos várias viagens em família, estacionado do outro lado, e um vasto território rodeado pela natureza.

— É sim — não seria justo discordar.

— Ah, será que eu posso tomar um banho antes de irmos pro hospital? — Diana pergunta com um tom de voz constrangido com os braços encostados no teto do automóvel me vendo abrir o porta-malas.

— Claro que pode. Eu também mereço um — sorrio para tranquilizá-la.

— Ótimo — ela vem me ajudar a pegar nossos pertences e entramos na casa.

A porta está destrancada porque a violência nessa região é quase nula, ou é porque tem alguém aqui. Espero que seja a primeira opção porque ainda não estou preparada para ver minha mãe e se ela estiver no hospital terei mais um tempinho para me organizar mental e emocionalmente.

No momento em que colocamos nossas malas no chão, somos recebidas com euforia por duas silhuetas que surgem pelo que me parece propositadamente de surpresa. Minha mãe e ué, meu pai?! Inteiramente saudável. Está até soprando um apito comemorando nossa chegada.

— Oi? Que porra é essa? — me recupero do transe e indago furiosa.

Minha mãe e meu pai se entreolham apreensivos.

— Me deixa explicar! — meu pai se manifesta com as mãos suspensas como quem pede paciência e calma. — Essa foi a única maneira que eu encontrei de te trazer até aqui...

— Você está me dizendo que inventou seu acidente? Você me enganou! Me deixou preocupada, sofrendo por sua morte! — disparo incrédula.

— Fofinha, nos perdoe querida — minha mãe pede cabisbaixa mexendo no saco de confetes com vergonha da sua própria ação inconsequente.

— Não me chama de fofa! Eu odeio esse apelido! Eu... Eu... Eu odeio vocês! E jamais vou perdoá-los por isto e... E todo o resto! — vocifero e saio correndo sem rumo com as lágrimas me cegando e uma dor me dilacerando por dentro.

O Amor Na Balança ( Sáfico) Where stories live. Discover now