Ovelha Negra [Completa]

Epílogo

  Aquela era uma bela foto.

 Em um porta retrato de base prateada, naquele corredor cercado de vários outros semelhantes, uma fotografia se destacava. Talvez não pra todos, era provável que a maioria das pessoas que passassem por ali sequer o olhassem, mas, para aquela garota em especial, ele tinha um significado.

Aurora se aproximou da imagem contemplativa, qualquer observador que capturasse aquele momento de inserção dela naquilo, deduziria que a garota contemplava uma obra de arte. Talvez uma obra de Monet, Picasso, uma própria Monalisa de Da Vince. Mas não, ela encarava sua própria imagem, e a de todos os seus colegas. Era uma foto comum da turma, como todas as outras que estavam espalhadas ao seu redor, mas aquela era diferente porque ela fazia parte, era uma foto que representava uma longa fase da sua vida, compartilhada com todos aqueles que também estavam nela.

Foi tirada pouco antes da formatura, no dia da cerimônia de conclusão, na sexta-feita. Todos usavam becas, e sorriam iluminados pelo fim da tarde, o gramado do Colégio Órion garantia o cenário. Ela elevou os dedos, nostálgica enquanto suas emoções borbulhavam dentro de si, tocando o vidro do objeto como se fosse capaz de ser imersa por aquele momento outra vez. Seu olhar avaliador observou todos os detalhes, memorizou cada rosto ali, cada pessoa com quem ela havia convivido diariamente nos últimos anos, e provavelmente não voltaria a ver com frequência.

Seus dedos foram descendo aos poucos, perdendo a força que os havia guiado até lá, e pararam em uma pequena placa de metal, logo abaixo da imagem. A Abelha Rainha voltou sua atenção para aquilo, e sentiu sua garganta se fechar.

Os sobreviventes.

Aquele foi o nome que sua turma recebeu, em homenagem a tudo que passaram até o dia daquela foto. Sem perceber, ela sorriu, porque aquilo significava muito, principalmente pra ela. Aurora não havia apenas sobrevivido a escola, ao fundamental, ao médio, ela havia sobrevivido a tudo. Ao bully, ao sofrimento, aos momentos ruins, a vontade de desistir, as más decisões, aos seus erros, havia sobrevivido a si mesma e a todos os comportamentos nocivos que teve, e havia sobrevivido a todo o peso que a sociedade lhe havia imposto. Ela finalmente estava bem outra vez.

_Eu que escolhi - ela escutou uma voz grave a sua direita, se virando para ver quem era o interlocutor - não sei por que não havia pensado antes, mas no momento em que estava gravando o metal o nome me veio à cabeça, e eu sabia que era perfeito.

Aurora sorriu calorosa para o diretor Garcia, aquela pessoa especial que sempre esteve ao seu lado. A garota se sentia grata por tê-lo tido na vida, por tudo que ele havia feito para ajudá-la, por ele sempre ter acreditado no melhor dela. Aquele homem havia sido mais que um diretor e educador, havia sido como um pai, um amigo, uma pessoa iluminada que sempre pensava no bem dos seus alunos. Ela era muito sortuda mesmo por ter tido uma referência assim enquanto estudava.

_Imaginei, foi realmente o nome perfeito - a garota de cabelos claros concordou, olhando uma última vez para o retrato - nem parece que já faz um mês. O tempo realmente passa rápido.

_Foi um mês e tanto pra você - ele observou bem humorado

O momento pós-descoberta da Ovelha havia sido um alvoroço na cidade. Aqueles que não haviam entendido exatamente do que se tratava a revelação de Aurora naquela noite, procuraram saber do que ela estava falando, e logo Fontana inteira já estava por dentro da coluna no Jornal do Colégio Órion. A maioria das pessoas a parabenizaram, outras não foram tão receptivas assim. O mais importante é que ela não havia sido linchada, não fisicamente, e também não havia sido processada, mesmo aqueles que quiseram fazer isso, e era bem óbvio quem seriam eles, desistiram. Aurora tinha quase certeza de que havia um dedo do diretor nisso, argumentando que os malefícios seriam bem mais quantitativos que os benefícios, afinal de contas, aqueles mesmos que desejavam fazer uma denúncia para acusá-la não possuíam uma ficha tão limpa. Era o que ela havia dito, não havia um único culpado naquela história, e eles sabiam disso.