1. (Un)Lucky

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No fundo Seokjin sabia que aquela noite em específico não seria muito boa para ele. Via de regra nenhuma noite era realmente boa ou especial, mas desde o instante em que acordou, já quase anoitecendo, sentiu que o melhor era ficar no cubículo meio mofado que chamava de casa, jogado sobre a cama, sem fazer coisa alguma além de olhar pela mínima janela muito acima da altura dos seus olhos. Se voltasse a dormir nada poderia o atingir, nem a fome, nem o frio, nem a ameaça constante de ser expulso daquela espelunca por falta de pagamento.

Em sua defesa, tinha sido isso que ele tentou fazer. Pensando em como estava gelado do lado de fora, e que dentro do seu espacinho poderia cerrar os olhos e cair no sono de novo, buscou se concentrar para retornar ao mundo dos sonhos — muito embora há eras ele não conseguisse mais se recordar do que sonhara ao despertar. No entanto, uma briga feia entre a senhoria e um dos inquilinos daquele prédio caindo aos pedaços o fez despertar de uma vez por todas, o fazendo lembrar que se dali a cinco dias não tivesse dinheiro o suficiente para ao menos oitenta por cento do aluguel do mês, seria ele no lugar do inquilino protagonizando uma gritaria chata e vergonhosa no corredor em breve.

Assim, sem muita vontade, mas estimulado pela necessidade, se levantou do colchão duro, pegou a toalha manchada e saiu pela porta tão logo a gritaria cessou, indo para o banheiro que compartilhava com mais quatro homens em tão mal situação quanto a sua que moravam naquele lugar. Tomou um banho frio rapidamente, uma vez que o chuveiro elétrico nunca funcionava, voltou ao quarto para se vestir e, antes de sair para a noite congelante, preparou um ramén sabor frango picante que a senhoria oferecia como cortesia, quebrando dois ovos dentro, também cortesia da casa. Aquela seria, por certo, sua única refeição do dia. Se desse sorte, pela manhã, quando terminasse de trabalhar, poderia separar um pouco do que obtivesse para uma panqueca, mas a julgar pela renda que vinha tendo nos últimos dias, era melhor não contar com isso.

O inverno deixava o movimento nas ruas mais fraco, e com a proximidade do vencimento do aluguel era mais racional juntar tudo o que conquistasse. Como sempre não daria para fechar o valor cheio da mensalidade, porém, forçaria a sua lábia e seu charme mais uma vez para cima da mulher e, quem sabe, conseguiria deixar o restante para uma próxima que, sendo bem realista, jamais chegaria. Seokjin sabia que a paciência da Sra. Kang estava por um fio, mas precisava continuar tentando. Nenhum lugar em Seul era mais barato que aquele, e se fosse expulso dali, não teria lugar algum para ir. O máximo que pudesse fazer para não perder o pouco que tinha, tanto melhor para sua própria segurança.

Foi nesse estado que Seokjin saiu pela porta gasta do prédio, enfrentando a brisa fria e cortante com a sua jaqueta de couro puída que já tinha passado por dias melhores. Não era suficiente para lhe dar proteção, mas o ajudava a não cair de peito aberto no frio intenso, o que lhe era de grande valia, afinal, antes pouco do que nada. Até mesmo porque, nas ruas, a temperatura era o menor de seus problemas. O risco de uma friagem e suas consequências em nada se comparava com o perigo ao qual se expunha todas as vezes em que saía para trabalhar. A profissão que decidira seguir não era nem um pouco segura.

A prostituição em nada poderia ser classificada como um estilo de vida fácil. Não era indigno, não era demérito, mas, certamente, não oferecia nenhuma facilidade, ao menos não para Seokjin. Para alguns era uma escolha mais consciente, uma carreira eleita com base em gostos e aspirações pessoais, e para estas pessoas funcionava como algo mais tranquilo. Para Seokjin, no entanto, foi algo que aconteceu e acabou por se tornar a sua única opção. Sozinho na grande capital do país depois de sair de uma província pequena, sem estudos básicos completos e sem boas habilidades, com um rosto bonito e elogiável, ao se dar por si, já estava prestando favores sexuais em troca de dinheiro. No alto de seus dezenove anos, na luta pela sobrevivência, diante das faltas de oportunidades que tinha experimentado até então, vender o próprio corpo para satisfazer os desejos alheios se tornou a opção que mais fazia sentido. Com ela, vivia na linha da pobreza, encontrando dificuldades como qualquer um, mas, com certeza, menos do que encontraria caso desistisse dela. Já tinha tentado, e não foi um período feliz. Era o que tinha para o momento.

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