37|A viagem

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Já estávamos a alguns dias viajando naquele trem.

As horas passavam lentas e desconfortáveis. Em geral, nós conversávamos sobre ervas e experiências no Castelo das Damas.

Quando chegamos no Distrito C, o ao norte, desembarcamos numa distribuidora de frutas e minerais.

Meu rosto já estampava postes e estava por todos os jornais. Erick era apontado como meu cúmplice, consequentemente, também era um fugitivo.

Escondemos nossos rostos em túnicas roubadas de mercadores distraídos.

Iríamos pegar outro trem de carga, quando um homem nos parou:

— Ei, ei, ei, o que estão fazendo aí? O vagão de embarque é ali na frente.

Peguei um pedaço de pano, e enrolei rapidamente em outros trapos.

— Perdão, acho que confundimos — digo suavemente, soando confusa.

— Nomes — pediu.

— Ah senhor, sou Ciro, essa é minha esposa Dayse e nossa pequena Lily. Caso não se importe, a bebê está faminta, temos que seguir para o vagão para minha esposa poder alimentar-la. — mentiu Erick.

— Claro, quem sou eu para deixar uma criança faminta — disse o senhor, aparentemente convencido pela ideia da criança faminta.

— Boa viagem — desejou.

Acenamos, sem mostrar o rosto por completo, e seguimos para o vagão da frente.

— O que vamos fazer? — cochicho — Assim que pedirem os documentos, vão chamar a polícia.

— Tem os dutos, mas não é dos melhores caminhos — diz Erick.

— Com certeza é melhor que a cadeia — digo.

Eric lidera o caminho.

Os becos eram desertos, não havia uma pessoa perambulando por eles.

Ele entrou em uma casa, aparentemente abandonada. Inseriu um código em um dispositivo na parede, que se abriu.

Um longo túnel, com iluminação precária, e fedido, surgiu.

— Que lugar é esse? — pergunto.

— Os dutos. Antigamente era um canal de esgoto, depois transformaram em canal de energia, mas agora está abandonado — explicou.

— Como descobriu isso?

— A cidade não é um parque de diversões, temos que nos entreter com as opções disponíveis — disse ele.

— Esse duto pode nos levar até a próxima estação? — perguntei.

— Sim. Vamos ter que andar bastante, prepare seus pés — avisou.

°°°

Chegamos na outra estação e eu estava exausta. Andamos um percurso considerável.

Embarcamos no vagão de carga, como o planejado.

Durante as noites, Erick permanecia acordado vigiando o vagão. Durante as manhãs, ele descansava enquanto eu montava a guarda.

Assim seguiram os dias, as semanas, e todas as viagens.

Tivemos que alternar a rota algumas vezes, pessoas já começavam a nos reconhecer.

— Aquela moça, ela está nos encarando estranho — digo no ouvido de Erick.

Apressamos o passo.

Embarcamos no trem de carga novamente.

Já estávamos exaustos. Durante todos esses dias, dormimos sentados, ou no máximo sobre alguns sacos de farinha — o que não foi uma boa ideia. 

Na costa norte, pegamos um barco com alguns pescadores. A vista da costa não era das melhores, a pobreza predominava. Era inevitável o contraste do país, igualmente a Pandora.

— Mais alguns dias e estaremos em Pandora — era o que eu dizia para Erick, e para mim mesma. Mais para mim mesma, era uma forma de acalmar meu coração e enganar minha mente. 

A viagem poderia durar pouco tempo, quanto muito tempo. Isso dependeria se as pessoas nos reconheceriam ou não. Mudamos de rota quatro vezes, e fazia praticamente um mês que estávamos tentando chegar em Pandora.

— Não é muita coisa, mas quero que saiba que sou muito grato a você, Joy. Em tantos anos trabalhando lá, essa foi a primeira vez que tentei fugir, e graças a você  consegui. Provavelmente já deve ter passado o dia de comemorar a virtude, mas ainda temos tempo de comemorar o ano novo. — Erick me surpreendeu com um globo de neve, pequeno, porém significativo.

— Obrigada! Onde conseguiu isso? 

— Planejava te dar desde o dia na dispensa. Guardei e acho que é uma boa hora para te dar — diz.

 Abraço-o.

Faz tanto tempo que estamos juntos tentando chegar em Pandora, isso nos aproximou, pois Eric é literalmente a única pessoa que tenho agora. Se eu morresse, ele provavelmente seria o único a saber. Isso me assusta.

— Descansa um pouco, em algumas horas estaremos do outro lado da fronteira — disse Erick.

Concordo acenando a cabeça, e recosto sobre o banco da cabine.

Estava apenas com os olhos fechados, porém atenta a qualquer sinal de perigo que pudesse surgir.

Sentia as ondas baterem no barco, fazendo movimentos parecidos com um berço de bebê.

Ao mesmo tempo que estávamos pertos de chegar a Pandora, estávamos longe. Tudo poderia dar certo, mas também poderia dar errado.

A fronteira marítima era a nossa melhor opção, a mais segura. Ir pela terra envolveria muita burocracia, assim que vissem nossos rostos nos enviariam para a cadeia.

Tentei relaxar. Era quase impossível, então continuei a repetir "mais alguns dias e estaremos em Pandora".

"Mais alguns dias e estaremos em Pandora."

"Mais alguns dias e estaremos em Pandora."

"Mais alguns dias e estaremos em..."

"Mais alguns dias e estare..."

"Mais alguns dias e..."

"Mais alguns..."

"Mais..."

Abri os olhos uma última vez, e caí no sono.

Deadly Mirrors - 1° Rascunho - CONCLUÍDAWhere stories live. Discover now