Prólogo

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  Olhando agora para todas essas pessoas ao meu redor em um cenário único. Engulo em seco sentindo minha garganta arranhar como se engolisse areia. As roupas em preto numa sessão fechada para poucas pessoas, mas as palavras não saem da minha boca. Estão todas na minha mente, estão todas na ponta da língua, porém, não consigo jogar para fora. Sinto como se, uma única palavra iria desencadear várias outras reações. Choro, loucura, dor, pensamentos e pesadelos, olhando Andréa chorando no canto a me olhar como se implorasse que tudo isso acabe, abro a folha na minha mão, olho um texto com letras redondas e elegíveis, mas amasso a folha logo em seguida para olhar todos os vinte convidados para o enterro de Simas.
  — Simas — as palavras saem, como se minha boca estivesse presa, como se meu nariz e boca estivessem fechados, e agora, puxo o ar desesperadamente. Minha voz sai quebrada, com dor, como se acabara de levar uma facada no peito. — Simas foi o meu marido durante sete anos — olho todos sentindo o nó da minha garganta — tinhamos planos, uma lista de coisas a experimentar, planejamos um filho, mas tudo isso foi tirado de nós, de mim, do nosso futuro. — Olho meus dedos a fim de não ver os rostos chorosos — ele tinha coisas em mente, do que ele ainda poderia fazer nesse mundo, do que ele ainda tinha a oferecer. Do que tínhamos para construir, Simas não morreu, Simas foi nossa chama e agora se tornou nossas cinzas, aqui — aponto para minha cabeça — e aqui — para o coração...

  Saio do velório junto a Andréa, mãe de Simas, não sei o que vai ser daqui para frente. Faz três dias, três dias desde tudo. Não sei o que farei, não sei o que acontecerá, mas estou dormindo na nossa cama a só, a gritar sozinha à noite com todas as cenas se repetindo na minha mente, estou sendo perturbada por um fantasma que está preso agora.

  Meus pensamentos são interrompidos, quando o carro para em frente ao prédio. Fecho meus olhos sentido uma lágrima solitária cair, e a porta abrindo e fechando com um baque me faz abri-lo revendo tudo o que aconteceu naquele dia. Quando Noah abre a porta para mim e o vento faz minha pele arrepiar e meus cabelos voarem, olho em seus olhos. Saio do carro, entramos e subimos quietos todos até o último andar, ao entrar na casa caminho para subir ao quarto, mas a voz de Andréa me interrompe:
  — Os bens de Simas seriam divididos entre a família. — Paro nos degraus olhando meus pés a quase completar a subida — decidimos não fazer isso — com sobrancelhas franzidas viro para olha-la, Andréa tão pálida com um vestido preto até abaixo dos seus joelhos, James com um terno que lembra seu filho. — Achamos melhor você ficar com os bens, incluindo a empresa. Meu marido não quer ficar à frente, nenhuma das minhas filhas tem interesse, mesmo sendo negócio de família, você é a viúva, deve ficar no lugar dele — nunca me dei bem com a família de Simas, isso vindo da sua mãe, é surpresa. Não digo nada, não sou capaz de dizer nada, muita coisa para processar e nem me caiu a ficha ainda que tudo isso é verdade.
  — Não sou da família — James olha para Andréa — disse, que é negócio de família.
  — Simas te amava, confiava em você — isso é ainda pior de ouvir e me sinto envergar para trás como se o impacto de uma bala me jogasse para longe, então me sento incapaz de me manter em pé — não estou só falando da empresa, você agora o representa no mundo criminoso também, espero que tenha responsabilidade por isso, ele nunca deixou que ninguém te desprezasse, nunca deixou ninguém falar mal, apesar de não aceitamos — Andréa diz e ouço sua voz falhar ao começar a chorar. — Por favor, ele iria querer isso — olho James que também me olha, Noah meu segurança confiável, se retira para algum canto no apartamento e suspiro.
  — Tudo bem — é o que digo, com milhões de coisas na minha cabeça — preciso tomar um banho — concorda. Então subo, ouvindo quando chego ao quarto, a porta da frente bater, então desabo caindo no chão com meus joelhos, choro. O cheiro de rosas e cemitério é enjoativo e repugnante, mas enquanto estou ao chão do nosso quarto reparo em tudo, e filmes na minha mente me torturam, para todo canto que olho o vejo passando de um lado para o outro, se arrumando, se deitando, dormindo e levantando. Ele ainda está vivo mesmo quando não está aqui.

Dona O'Sullivan - Spin OffWhere stories live. Discover now