Visita aos mortos

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Capítulo 05

   Sento-me na cama ofegante e logo ponho minhas mãos no rosto pelo sol, estou suada e meu rosto está molhado por lágrimas, tento acalmar minha respiração e meu coração e me sento na beira da cama olhando meus pés sobre o tapete, logo o relógio do celular para ver que é sete da manhã de sábado. Levanto-me calma e troco às roupas de Finn pelas minhas, arrumo a cama muito bem arrumada e deixo as roupas dobradas perfeitamente perto do travesseiro e um bilhete em cima delas agradecendo. Na sala procuro uma chave reserva em algum canto, todo mundo tem uma, procuro embaixo de objetos e revistas e quando me canso, sento no sofá olhando todo mísero canto, onde ele guarda? Não é possível que só tenha uma, ninguém tem só uma chave de casa. Depois de dez minutos olhando apenas para cantos que possivelmente eu colocaria, vejo uma chave numa moldura, como é gênio! Um amoldura sobre chaves e um em 3d quase imperceptível, pego-a e saio do seu apartamento o trancando e vou em direção ao elevador.

  Apanho um táxi para casa, olho para as ruas a fim de ficar entretida com alguma coisa e não pensar nos pesadelos que se tornaram frequentes. São todos com ele, em cenários diferentes, mundos distópicos, catastrófico, bonitos ou sei lá o que, os sonhos que não me deixam esquecer sua voz e nem sua figura. Mas, distorce da minha cabeça o homem maravilhoso que era, logicamente as boas lembranças que tenho ficou comigo, mas sempre me pego a pensar como nunca irei esquecer Simas, nunca mais vou vê-lo chegar do trabalho, nem mesmo iremos viajar para negócios juntos, parece que minha ficha está caindo depois de tanto tempo, mas são só pensamentos. Entro em casa e sou recebida por Joseph morto de fome, coloco sua comida e preparo um café, subo com a xícara e jogo os sapatos para lá, volto para fechar a porta do quarto e acabo por olhar o meu, o que antes era eu a dormir, antes de fugir para o quarto dele as noites, fecho a porta e suspiro. Tomo todo o café sentada a beira da janela olhando as ruas, deixo a xícara de lado e vou para o banho, hoje é dia de visita.

  Ponho uma calça de inverno preta, três casacos, um mais fino preto por baixo, um vinho por cima e uma jaqueta preta, cachecol, gorro e botas de inverno. Aconchego Joseph entre os lençóis e afago sua cabeça por muito tempo, esse sempre é o melhor dia do mês, porém, me da angústia, aperto, choro tudo junto e misturado e fico uma pilha de nervos, olho a porta e respiro fundo soltando o ar calmamente. Desço as escadas deixando a xícara na pia, pego minhas chaves e olho para o escritório, lá está ele sorrindo para mim com oito buracos no corpo, engulo em seco e olho para porta, seu sorriso na minha mente, não mais doce, agora doentio. Afasto sua imagem da minha mente e saio de casa andando rapidamente os corredores, enquanto o elevador não chega tento não olhar para o fim do corredor, para a única porta que tem, para o que tem parado ali em pé, meus batimentos já estão alterados quando o elevador chega, e entro nele rapidamente, ainda consigo ver o pano do terno que estava usando quando a porta se fecha, solto meu ar sentindo uma lágrima caindo, limpo rapidamente e espero sair desse caixote de metal que está me faltando o ar.
  — Bom dia — cumprimento Austin que sorri para mim calorosamente.
  — Está tudo bem menina? Parece abalada — olhando seus olhos sem vida e tento sorrir.
  — Hoje é dia de visitá-lo — Austin não era nada de Simas, mas a consideração e quase um, ou se não, amor pelo rapaz faz o seu sorriso desaparecer. Acena apenas e volto a meu andar, pego meu carro e vou rumo à floricultura.

  Para melhorar todo o meu dia, fico presa a maior parte do meu tempo livre no trânsito esperando para retirarem a neve da estrada, quando finalmente consegui me mexer e chegar a floricultura, havia fechado, parada no meio da calçada com pessoas a passar por mim, observo o buquê de flores, respiro fundo sentindo minhas costas doerem levemente, essa dor aguda ruim passa pelo meu peito faltando o ar, viro entre meus calcanhares e entro novamente no carro, novas estradas rumo ao cemitério, a neve começa a cair e tento não declarar meu dia um fracasso total. Chego ao cemitério sem flores, na chuva de neve e duas horas depois do esperado, caminho lentamente o percurso já decorado por mim, passos firmes para não escorregar, chego no lugar esperado, três túmulos, avô, avó e Simas bem a direita, um túmulo sem graça e sem flores, me debruço sobre o seu túmulo olhando sua foto dentro do vidro, tiro a neve de cima e a fumaça sai da minha boca embaçando tudo até meus olhos, passo um tempo, meu corpo coberto por neve, meus lábios tremendo e meus cílios congelados, está difícil para respirar, deveria ter chegado mais cedo para evitar essa tempestade de neve, mas aquela máquina demorou demais.
  — Ei senhora! — ouço mais não me viro, não consigo me mexer, fico apenas olhando para a foto querendo sentir meu corpo, mas estou muito fria — Senhora! — está mais perto. — Senhor... Opa — caio para trás no braço do desconhecido, olho em seus olhos, o único ponto que dá para ver, usa uma touca que cobre seu rosto pela metade e máscara, não consigo falar nem me mexer, estou congelando, a respiração está muito difícil. Sou erguida em seus braços e caminha rápido por dentro do cemitério, entre túmulos até um lado vazio de terra, uma casinha no fim, fumaça sai da chaminé uma visão confortante.

  De frente a uma lareira com uma xícara de chá e um lençol a minha volta ouço as pegadas fortes do homem, se não fosse por ele estaria morta agora mesmo, congelada, feito uma estátua, estou até vendo a reportagem "A mulher que morreu em cima do túmulo do amado". Não seria um final ruim, morreria com ele, não sei se fico feliz ou triste.
  — Está uma tempestade lá fora, com certeza não sairemos de casa por hoje — olho de soslaio para o homem que anda de um lado para o outro na cozinha — quase morreu na chuva — tomo um gole do chá e volto a olhar o fogo, estou começando a achar que era melhor. Então me levanto, tiro a manta de mim, jogando no sofá e caminho calma até ele que está de costas tirando sua touca, a máscara protetora e os casacos, logo tira a bota e suspira pesado voltando a fazer alguma comida no balcão, nem mesmo repara que estou perto.
  — Ele era seu marido? Sempre vem aq... — para de falar assim que me vê próxima o bastante, já eu fico surpresa com o que vejo. Recuo três passos antes de bater com alguma coisa gelada demais para me sobre saltar e voltar para perto. Ele é o homem que esbarrei, ele é o homem que achei já ter visto.
  — O que você quer comigo?

Dona O'Sullivan - Spin OffWhere stories live. Discover now