Homar

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Capítulo 10

  Conheci Gargulho na pior fase da minha vida, pelo menos em uma das piores, tinha apenas quinze anos, e procurava o emprego que ajudaria a minha mãe adotiva em casa, só eu e mais duas meninas já estavam na idade de ter um emprego e infelizmente o que não nos surpreendia na nossa vida medíocre, nenhuma de nós havia conseguido emprego, então havíamos de sobreviver de comer um dia e passar três com fome, para a compra de 60 dólares durar pelo menos três semanas. Aquela semana havia sido horrível...

  Ando nas ruas desertas e frias da Irlanda, abraço meu pequeno corpo enquanto forço minhas pernas para andarem mais rápido, paro na esquina e tento ver no papel colado no ponto de ônibus, qual será o próximo horário, meus dedos tremem e as pontas estão vermelhas, quase não os sinto, respiro fundo e um carro para ao meu lado, paralisada, de frio e de medo, observo os vidros pretos. Ao serem abaixados reajo e dou um passo para trás, a primeira coisa que vejo são 100 dólares, observo o dinheiro, o braço estendido da pessoa, por quê faz isso? Acha que estou em situação de rua? Olho minhas roupas rapidamente e ouço um pequeno assovio. Devagar abaixo e observo o belo homem, cabelos loiros jogados para trás, boas vestimentas, braços fortes, olhos num castanho tão profundo que parecem até claros na escuridão da noite e do carro, a única luz presente é do painel do carro de luxo.
  — Quanto a hora? — mais confusa ainda o observo, nos olhamos por alguns minutos e ele recolhe a mão, engulo em seco quando percebo que sai do carro, agarro a bolsa de algodão branca ao lado do meu corpo, me recolho ainda mais ao sentir o vento bater nas minhas costas, deve haver um buraco no casaco. — Quando a hora do programa? — meus olhos se arregalaram, acha que sou prostituta? Se encosta no carro e tira a carteira do bolso — cento e vinte está bom? — olho em seus olhos e olho o dinheiro, cento e vinte, o dobro do que como em três semanas, cento e vinte é muita coisa. Olho o horário do ônibus e também olha. — Está no fim do seu programa?
  — Não — não acredito que disse isso, não acredito no que vou fazer — na verdade, sim está.
  — Então, cento e cinquenta — tira mais duas notas do moinho da carteira, meu coração para na boca, o que estou fazendo? — Vamos? — abre a porta do seu carro e me deixa entrar, a cada passo meu subsconciente me questiona o que ando a fazer, mas a minha barriga, meu estômago gritando me diz que cento e cinquenta é comida para semanas.

  Ao abrir a porta do quarto passo na frente dele, olho o mesmo quando fecha e olhando a porta quando passa por mim, tenho certeza que não há mais volta, seguro com tanta força a bolsa ao meu lado que meus dedos já até esquentaram, viro para o homem e está colocando bebida em um copo para ele e tem outro ao seu lado.
  — Você bebe? — assinto que não e ouço seu suspiro, pega o copo e caminha até mim, estou tão ansiosa e excitada que meu coração bate nas costas, nunca estive tão eufórica, tenho medo, tenho confusão. — Você é novata? — sinto um pouco de raiva pelo sorriso de meio canto que abre no seu rosto, novamente assinto que não, pois não confio na minha voz. — Acho que está mentindo, dá para saber que não sabe o que faz, parece assustada, quantos clientes teve hoje?
  — U-Um — suas sobrancelhas erguem e finalmente solto um longo suspiro.
  — É seu primeiro dia de programa? — assinto — sabia — se senta na cama e começa a tirar sua blusa — o banheiro é ali, pode se preparar — olho para o local que me apontou, quase que correndo vou até lá e me tranco, me olho no espelho com as costas na porta. O que diabos você está fazendo Dona? Que porca... Escuto um barulho que me faz assustar, logo uma música começa, me olho novamente e passo água no rosto, aceitei, então farei, ele parece bem mais velho do que eu, deve ter trinta anos mais ou menos, isso me dá mais medo ainda. Mesmo assim, jogo para o lado a bolsa e tiro minha roupa, olho todo meu corpo, como alguém se interessa? Meus ossos da clavícula estão mais que amostra, consigo afundar um dedo na minha própria pele, as minhas costelas são perceptíveis, o osso dos meus quadris faltam pouco para aparecer, suspiro e caminho até o chuveiro, preciso ser breve.

  Dobro as roupas e deixo na bolsa sobre o sanitário, assim que abro a porta ele já está na cama, me olha deixando o copo de lado e bate no colchão, seguro bem a toalha para meu corpo e caminho vergonhosamente para ele. Tira minha toalha e instantaneamente cubro meus seios, observa todo meu corpo e segura minha cintura me puxando para perto dele, seus lábios começam a vagar pelo meu corpo, minha pele arrepia, mas sinto nojo de mim mesma, tira minhas mãos de perto de mim e se levanta ainda as segurando, nós rodamos noventa graus para a direita, me deitou na cama e logo veio para cima de mim, igual um leão.

  Doeu tanto que ainda estou deitada, meus cabelos por cima do meu rosto, sinto tanta vontade de chorar, tanto nojo, ele ainda está ofegante sentado à beira da cama, me encolho e abraço meu corpo. Sinto que ele se mexe e segundos depois ouço um pequeno estalo vindo dele, o olho assustada e está em pé, com as mãos na cintura a olhar o colchão.
  — Você mentiu? — vem até mim e me encolho ainda mais, meu braço é puxado e me levanta bruscamente.
  — Não menti — o olho.
  — Então que porra é essa na cama! — Me joga até o colchão e vejo a mancha de sangue — você tem quantos anos? — choro com medo e me observa — QUANTOS?
  — 15! — Grito de volta e ele se senta na cadeira atrás de si. Me observa e parece desnorteado.
  — Deveria ter perguntado — passa a mão nos cabelos — que droga, Homar! — se repreende e sento na cama — o que você faz? Por quê? Deveria estar na escola não nas ruas, deveria ter desconfiado de você, do seu medo. PORRA GAROTA! — esbraveja, corro para o banheiro pondo minha roupa, assim que volto, está no mesmo canto, pego o dinheiro sobre a escrivaninha e corro para fora, ainda ouço seu grito me chamando, mas já estou longe demais, passo pelo hall do motel e acabo batendo em alguém, meus olhos observam o homem de terno, olho a cicatriz ao lado do seu rosto e estou muito assustada.
  — Você está bem? — balanço a cabeça e tento começar a correr, mas suas mãos me prendem no lugar, então me solta. Corro e viro a esquina, paro para respirar, o frio, o ar está muito áspero. — Ei, você quer que eu ligue para alguém, está perdida? — olho para trás e retorno a correr.

Desde aquele dia, tudo foi por água abaixo.

Dona O'Sullivan - Spin OffWhere stories live. Discover now