Admirador secreto

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  Viro de costa para a assombração de Simas ficando de conchinha abraçando meu próprio corpo, fecho os olhos para não ter que vê-lo e cubro meu rosto, mas mesmo fazendo tudo isso é como se a sua mão gélida sobe pelo meu corpo me arrepiando por completa, sinto calafrios e toques em mim.
  — AAAH! — bagunço todo o lençol e me esperneio na cama para o que quer que seja saia dela, o gato corre para o chão e as luzes se acendem com meu pavor, olho de um lado para o outro, ninguém. Respiro descontroladamente observando o quarto, ao me acalmar aos poucos e tomar coragem para sair da cama, me levanto e ponho um pijama quente, volto a segurar Joseph e antes de deitar as luzes apagam novamente, sento na cama deixando o gato de lado e abro minha gaveta para achar um único comprimido dentro do frasco, tomo o remédio a seco, me deito e me cubro até a cabeça abraçando meus joelhos.

  Ouço um último grito e corro, o corredor escuro não ajuda na minha visão, espanto com minhas mãos teias de aranha e coisas caídas do teto que machucam minha mão, conforme corro parece que o ambiente vai ficando pequeno ou eu grande demais, mal consigo passar no corredor quando a luz acende, estou numa sala, não sei o tamanho pois nem parece ter recantos, toda branca até a iluminação, engulo em seco olhando tudo a minha volta. DONA! Pulo de susto e não volto para o chão estou flutuando num túnel colorido a ouvir uma risada macabra, o rosto de Simas vira e mexe aparece ali e aqui com expressões horríveis em um sorriso largo, um menor, olhos arregalados e rosto sangrento. Não está esquecendo nada? Caio, macio, peludo, escuro. Tento levantar, mas toda vez caio e vou e volto, uma cama elástica. AAH! Olho para cima na tentativa de tentar ver quem cai do túnel, mas está escuro e quando volto para baixo meu corpo sobe e volta a descer em gritos de tirar o fôlego, subo, desço, flutuo, subo, eu desço, eu flutuo...

  Acordo com o som do despertador, meu coração bate descontrolado enquanto a sensação ruim de subir e descer permanece no meu corpo, tenho a visão do teto, o sol está queimando meu pé num freixo de luz pelo chão até a janela, estou descoberta e falta uma meia no meu pé, me sento a cama amarrando meus cabelos, Joseph já está na porta a bocejar me olhando com cara de preguiça, logo começa a lamber sua pata, hoje é mais um dia de trabalho! Levanto calma e separo uma roupa, calças de inverno pretas por baixo da social grossa, dois cachecóis um colorido em cores vermelho, branco e verde, outra cor de café com leite, uma blusa fina preta uma jaqueta e botas. Preparo um banho quente para tomar e enquanto a banheira enche desço para colocar a água do café no fogo, alimento o gato e pretendo subir novamente, mas antes que faça, percebo a neve. Ligo no noticiário e lá está a notícia que a última semana de inverno será a mais rigorosa, tudo estará fechado, as ruas estarão interditadas e fechadas, uma tempestade de neve está se aproximando. Desligo e subo novamente, trabalharei de casa hoje como todos os outros. Guardo a roupa e desligo a água, separo agora uma roupa confortável de casa e quente, desço novamente para preparar o café antes de subir e ficar no quarto o dia inteiro. Preciso mesmo de uma folga, mas antes que suba com uma bandeja de comida o telefone toca.
  — Bom dia Austin.
  — Bom dia Dona, aqui na portaria chegou uma encomenda para você — confusa tento lembrar de alguma coisa que possa ser essa encomenda.
   — Encomenda? Nesse dia de hoje? — olho para a chuva intensificando.
   — A pessoa que entregou foi muito corajosa em sair de casa, e também, tem boas intensões — suspiro já sabendo do que se trata.
   — São flores? — ouço sua risada rouca.
   — São sim senhora.
   — Deixe aí, desço em meia hora. — Desligo e subo com meu café, deixo sobre a mesa que está meu computador e visto a roupa que separei.

  Descendo já me sinto ansiosa e impaciente, não sei quem está fazendo isso, mas se está querendo alguma coisa, perde muito tempo e dinheiro, sorte da pessoa que gosto de flores, se não, turo isso estaria no lixo.
  — Obrigada Austin — flores agora e não rosas como antes. Seguro no cartão tentando o abrir, o cheiro já até me enjoa, nunca gostei dos cheiros dessas flores.

"Sorria alegre balance seu corpo, volte para o topo tudo de novo".

  O que isso quer dizer? Quem é essa pessoa? Escreve para mim bilhetes sem sentido e nada romântico, não me conhece, pode ser sim um admirador, se me conhecesse sabia que eu destesto essas flores, logo essas em específico, as jogo para o balcão em um vaso assim que chego em casa, mesmo as desprezando e odiando esse cheiro, não vou mata-las. Levo para o escritório, o lugar que não abro a um ano, só entrei aqui duas vezes, uma para dançar com Simas, outra para me lembrar, agora estou abrindo novamente para esse buquê solitário, mas não o deixo aqui, fecho a porta antes mesmo de entrar e levo o buquê novamente para a sala deixando na mesa de centro subo as escadas com o celular, fecho a porta do quarto e me sento junto a Joseph para começar a trabalhar no restaurante. Espero que ele esteja pronto até o fim dessa semana, quando começará as nossas novas obras em novos terrenos, e por fim o restaurante, mais um pra lista, será construído do jeito que pensei, em homenagem a Simas.

  Está chovendo e já são nove da noite, estou sentada na sala a comer, a televisão está ligada, mas minha atenção está nas rosas, quem está mandando-as para mim, não tenho a mínima ideia, em todos esses anos não sai nem mesmo me relacionei com nenhum homem. Não tenho ideia de quem estou recebendo essas flores. As luzes piscam e minha atenção agora está pela casa, logo tudo se apaga e suspiro, sem entretenimento por hoje. As poucas luzes em alguns pontos se acendem e levanto com calma para ir ao quarto, aos poucos os degraus vão se acendendo, são as luzes de segurança para quando faltar a casa inteira. Seguro no gato que reclama em meu colo, paro meus passos quando o vejo, parado na porta do meu quarto.
  — Não está esquecendo de nada? — os batimentos do meu coração já está alterado, engulo em seco soltando o gato que corre para o quarto, o seu semblante toma um sorriso malicioso e maldoso, diferente do que conhecia e me sinto alterada quando da o seu primeiro passo, recuo também, mas sinto o degrau na ponta do meu calcanhar, o alumínio faz minha pele arrepiar. Então fecho meus olhos e respiro fundo, dez vezes até abrir meus olhos, o corredor está vazio e daqui vejo Joseph, corro em direção o quarto sentindo uma sensação horrível no peito. Fecho a porta e bato minhas costas nelas como se meu corpo e a madeira fosse impedir uma assombração, corro para a cama me deitando junto ao gato como faço todas as noites, ver ele também está virando uma mania.

Dona O'Sullivan - Spin OffWhere stories live. Discover now