35 - Ele sempre quis me matar

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Sayumi Aizawa

Não importava o quanto eu corresse, meu pai ainda me perseguia. Aquelas faixas brancas aterrorizantes flutuavam na minha direção e seus olhos vermelhos não saiam de cima de mim, toda vez que eu olhava para trás, ele estava lá. A minha frente, o cenário ia mudando de forma desorganizada, era impossível saber onde eu estava e isso só aumentava a angustia dentro de mim. O medo também crescia, ele iria me alcançar, iria me machucar de novo.

De repente, eu não tinham mais para onde correr. Uma parede de espelho me cercava refletindo a imagem dele atrás de mim diversas vezes. Me encolhi no chão, assustada e com medo da morte. Aizawa se aproximava a passos lentos, os olhos vermelhos, o cabelo flutuando ao lado das faixas perigosas e o sorriso que me fazia tremer de medo. Comecei a chorar incontrolavelmente, inapta a fugir dali.

- Não! Por favor! Me deixa ir! Me deixa ir! Socorro! - Eu tentava gritar, mas parecia que minha voz não alcançava altura suficiente, ninguém iria me ouvir. Ninguém nunca tinha me ouvido.

- Filha, você não deveria fugir de mim. Lembra? Sou seu pai, para sempre. Você não pode fugir disso - A voz dele soava rouca e parecia se repetir nos meus ouvidos.

- Socorro! Ele vai me matar! Socorro! - Ainda tentava gritar, dessa vez, a minha voz não parecia sair de dentro da minha boca, eu não ouvia nem os sussurros, tudo que ouvia era a voz do meu pai se repetindo na minha cabeça.

- Você sempre foi um fracasso, Sayumi. Por que você não fez o que eu disse? Podíamos ser tanto, você só precisava ter me obedecido - Ele parecia cada vez maior enquanto se aproximava de mim e eu me encolhia mais, parecia que voltava a ser a criança amedrontada que eu era. Ele estava certo, eu era um fracasso, mas agora ele iria me matar, iria me matar para que eu pagasse pelos meus pecados.

- Pai, por favor, não me machuca, não me machuca - Eu repetia o mantra interminável, implorando, sentia meu rosto totalmente encharcado pelas lágrimas, o sorriso dele ainda estava ali, ele não se comovia pelo meu medo. Antes que eu pudesse fazer algo, aquelas malditas faixas enrolaram meu pescoço. Eu não conseguia respirar. Não conseguia respirar. Meu pai continuava ali, os olhos vermelhos olhando fixamente dentro dos meus, o sorriso macabro. Ele não me deixaria escapar.

- SAYUMI! - A voz de shigaraki disse, eu não conseguia perceber onde estava, era um lugar estranho, meu pescoço doía e não conseguia recuperar o ar, estava desesperada, procurando por Aizawa na sala, mas tudo que encontrei foi Shigaraki ao meu lado.

- Sayumi, calma. Foi um pesadelo. - Voltei a raciocinar, estava na sala do médico que tinha entrado há algum tempo, não sei exatamente há quanto tempo. Eu ainda não conseguia delimitar meu corpo, olhei para Shigaraki e minha mão estava envolvendo o braço dele. Sangue. Tinha sangue nos meus dedos. Finalmente comecei a perceber, minhas mãos já não eram as mesmas, era como ele tinha dito. Elas tinham mudado de forma, pareciam mais...monstruosas, apesar de continuarem humanas. As unhas estavam pretas, transformadas em garras afiadas que deviam ter no mínimo 6 centímetros, elas perfuravam o braço de Shigaraki. Eu ainda suava frio e o medo não tinha me abandonado, mas agora sabia o que fazer. Abri a mão, liberando ele. Passando a língua pelos dentes, pude sentir o quão afiados estavam, eu poderia cortar minha língua fora se não tivesse cuidado.

- E-eu...desculpa, desculpa, eu não queria te machucar - Tentei achar algo para estancar o sangue no braço dele, mas ainda não conseguia me livrar dos sentimentos agonizantes que aquele pesadelo tão vivido tinha me trazido. Comecei a chorar, mas minha prioridade era Shigaraki.

- Sayumi...tá tudo bem. Não tá doendo - Ele disse colocando uma gaze sobre o machucado, aquilo com certeza doía. Eu olhei para minhas mãos sem entender o que aquilo significava. Eu tinha me tornado um monstro? O desespero tomou conta de mim, comecei a me perceber melhor, tudo em mim doía. Não era como a dor de cabeça frequente que eu tinha por causa da minha individualidade. Era maior, cada osso e cada músculo em mim doía. O desespero não me abandonava, Aizawa passou a vida toda tentando me matar e nem fugindo dele isso acabava.

- Desculpa, eu não posso tocar em você, mas eu tô aqui, entendeu? Ninguém tá te machucando aqui, você tá segura, deu tudo certo. Se você tentar se concentrar na sua respiração, tenho certeza que você vai ficar bem - Ele estava visivelmente preocupado comigo, tentava conter os próprios impulsos. Talvez ele quisesse me abraçar naquele momento, eu não tinha como saber. Não conseguia ler os pensamentos dele. Depois de longos minutos chorando e tentando me livrar da agonia que o pesadelo me causou, consegui entrar em um estado mais calmo. Me concentrei nas minhas mãos, nos meus dentes, nos meus pensamentos e, tão inesperadamente quando apareceu, as garras sumiram, como se tivessem voltado para dentro das minhas mãos, os dentes já não cortavam minha língua e a dor parecia passar aos poucos.

- Você se sente melhor? - Shigaraki me ofereceu água, aceitei, minhas mãos tremiam enquanto eu segurava o copo. Meus olhos ardiam de tanto chorar, mas pelo menos agora eu tinha voltado ao normal. Os pensamentos de outras pessoas começaram a invadir minha mente, pela primeira vez, isso me fez sentir viva.

- Tá tudo bem, desculpa pelo seu braço...

- Isso? - Ele mostrou o braço com curativos malfeitos - Relaxa, nem doeu nada. Você tava tendo um pesadelo né? Deu de perceber, o médico falou que podia acontecer enquanto a individualidade se adaptava ao seu corpo.

- Deu totalmente certo?

- Sim. Você é muito forte, garota. Nós esperávamos que você morresse enquanto a individualidade se adaptava, mas você resistiu! Parece que só fez cócegas em você.

Eu não sabia como reagir aquilo, definitivamente não tinham sido cócegas, eu só tive ótima resistência à dor. Mas ele estava certo, agora que eu tinha uma individualidade útil, eu era forte. Agora eu iria poder provar para o meu pai que ele sempre esteve errado. Os pensamentos de vingança e raiva apareceram, tentando encobrir a dor e o medo que apertavam meu coração. Ele não era um herói, era um desgraçado agressivo que destruiu tudo que eu amava, foi ele quem me ensinou a me odiar, mas agora eu já não era só uma garotinha indefesa se encolhendo em um canto enquanto os olhos vermelhos me perfuravam. 

I'm Still Here [Finalizada]Donde viven las historias. Descúbrelo ahora