༺XLIV༻

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PENSILVÂNIA SÉCULO XVIII

ஜீ፝͜͜͡͡Três séculos haviam se passado.

Mesmo que muitas coisas houvessem mudado desde da minha época de origem até aqui, o amor que sentia por Daynna, permanecia inabalável, por mais que senti-lo só fazia com que eu me lembrasse a falta dolorosa que ela me fazia. Meu ser havia se tornado um vazio cada vez maior à espera de Daynna que parecia não vir nunca ao meu encontro. Sua alma de caçadora parecia ter se esquecido do caminho de volta à vida. Talvez vê-la novamente poderia demorar bem mais do que eu imaginava. A saudade me consumia como fogo ardente que parecia quererme consumir por completo. Meu eu sôfrego vivia pela esperança de um dia poder vê-la outra vez.

Ainda podia sentir seu amor, mesmo não estando ali comigo. Seu gesto provara que tudo o que vivemos não foi em vão. Tudo em nós dois era verdadeiro. Nós éramos um só. Dois corpos, mas uma alma apenas. Estávamos ligados pelo amor que sentíamos um pelo outro e estar longe parecia como viver em uma morte contínua a cada vez que o sol se levantava mais uma vez no céu.

Mesmo Blair comigo naquela casa, ainda sim me sentia sozinho, mesmo que na maior parte do dia jogássemos ou conversássemos, ainda sentia o vazio crescente se apoderando do meu ser. Todas as noites olhava para o céu e pedia para que no mais breve dos tempos aquela pedra forjada pelo sangue de Daynna brilhasse, mostrando que ela havia voltado para mim.

Às vezes a solidão não se dá pelo fato de que estamos sozinhos. Muitas vezes estamos acompanhados e mesmo assim nos sentimos sozinhos. O vazio está no interior e só poderia ser preenchido pelo motivo certo.

A saudade fora o pior mártire que eu poderia ter. Ela me massacrava, flagelando meu coração, deixando-o com marcas profundas que só poderiam ser curadas pela presença de Daynna novamente comigo.

Um século poderia não ser nada para um imortal que estava aproveitando a vida, mas para mim, era como estar navegando em um mar sem fim. Não havia sequer sinal de terra firme para mim. Meus olhos não conseguiam capitá-los, mesmo percorrendo longas distâncias.

O vazio parecia cada vez mais fundo e tenebroso dentro de mim. Não queria mais me sentir daquela forma enquanto esperava Daynna. Sentia que enlouqueceria. Mesmo que aproveitasse a vida, viajasse o mundo ao lado de Blair. A ansiedade dentro de mim pela vinda de Daynna fazia com que eu estivesse sempre frenético dentro de mim. Contava os dias e as horas à todo momento na esperança dela chegar. Não queria mais viver daquele jeito. Precisava descansar minha mente por algum tempo e principalmente o meu coração.

Naquela tarde, estava sentado em um dos bancos de frente para o belo jardim que havia cultivado. Blair estava ao meu lado caindo na mesma melancolia que eu, pois a estava puxando diretamente para aquilo, mas ela não parecia se importar com aquilo. Estava disposta a me ajudar naquele momento de crise.

― Ela parece que perdeu o caminho de casa! ― disse um tanto melancólico.

― Aposto que ela está à caminho, não sabemos ao certo como funciona o reino fantasma. Talvez o tempo lá seja diferente do que conhecemos aqui.

― Essa espera me machuca tanto.

― Eu sei como pode ser difícil, mas acredite que tudo vai terminar bem.

― Não é tão fácil ter esperanças quando o coração está dilacerado.

― Eu sei.

Por mais algum tempo ficamos olhando para as rosas, tão vivas sob a iluminação do pouco sol da tarde, já despedindo seus raios desse lado do mundo para o próximo. O vento soprou suavemente por ali, afagando-nos com seu toque terno. As folhas e as rosas balançaram levemente com aquele barulho tranquilo que proporcionavam aos meus ouvidos, me trazendo, mesmo que por um breve segundo, a sensação de paz que tanto buscava naqueles últimos anos.

― Sabe Blair, estava pensando comigo e acho que não sei quanto tempo posso aguentar a dor da saudade.

― O que quer dizer?

― Que estou planejando entrar em modo de hibernação.

― Mas você já esperou até aqui. Ela pode chegar à qualquer momento.

Respirei fundo.

― Ela pode chegar hoje, amanhã ou em mil anos, quem sabe.

Blair me encarou pensativa.

― Todos esses anos fizeram meu coração ansioso. Não quero mais viver com essa sensação por quantos anos mais vierem.

― Você tem certeza disso? ― perguntou ela seriamente.

― Tenho ― respondi com a maior certeza que já tive em minha vida. ― Você poderia tomar conta da minha casa, sair um pouco, se divertir, viajar para novos lugares, enquanto espera.

― Você também pode fazer isso. Podemos, juntos.

― Não Blair. Meu coração precisa de um pouco de descanso. Preciso hibernar ou me tornarei louco. Já comecei a planejar. Amanhã vou ter que beber sangue de efêmero para manter-me hidratado, mas não beberei, para poder descansar e quando ela finalmente chegar aqui, só depois de ter completado dezoito anos de idade, quero que me acorde para finalmente poder ficar junto dela.

― Você é o meu melhor amigo, vai mesmo me deixar sozinha nessa mansão?

― Você poderá arranjar novos amigos e quem sabe até um amor...

― Me fechei para o amor há muito tempo ― disse ela e seu rosto se anuviou.

― Às vezes o coração nos surpreende.

― Você e suas ideias românticas! ― falou revirando os olhos, enquanto um sorriso preenchia o espaço entre seus lábios.

Sorri para ela e voltamos a admirar as flores por mais algum tempo. Mesmo que ela tentasse me manter ali, meu pensamento estava consolidado em ir. Não queria mais viver com aquele peso em meu coração. Tinha de fazer aquilo, pois seria o mais fácil para mim naquele momento onde as trevas dentro de mim queriam me engolir por inteiro.

Assim como eu havia planejado, não saí para caçar nenhum efêmero e beber o seu o sangue, portanto me preparava ali deitado dentro de um caixão, que abafaria o mau cheiro do meu corpo em toda à casa depois que houvesse se passado muito tempo, para me despedir daquela realidade e dar lugar à uma nova quando eu acordasse.

Blair me ajudava com tudo, pois no fim respeitou minha decisão final. Ela imaginava o quanto poderia ser difícil para mim continuar ali me martirizando. Já me sentia fraco ali deitado no caixão. Meus olhos estavam começando a pesar. Minha garganta estava mais seca do que nunca e por mais que desejasse molhá-la com sangue, mantinha minha cabeça focada na paz que sentiria do outro lado, mesmo sem saber ao certo o que ia encontrar. Talvez minha mente só vagasse no completo vazio por anos até que o sangue derramado diretamente na minha boca me reidratasse depois de algum tempo, trazendo-me à tona.

― Você foi uma ótima amiga! ― disse com uma voz fraca. ― Obrigado por tudo!

Blair riu e lágrimas encheram os seus olhos, emocionada.

― Descansa em paz Sebastian.

― Cuida direito da minha casa.

― Pode deixar!

― Nos vemos em breve! ― minha voz saiu em um sussurro.

― Mais breve do que você possa imaginar ― devolveu ela com certo otimismo em sua voz que foi a mais bela ilustração dos meus últimos minutos ainda consciente.

Blair tocou meu rosto e um sorriso singelo surgiu entre seus lábios. Aquela despedida não seria para sempre, mas ainda sim doía no coração. Ela segurou minhas mãos que deveriam estar tão geladas quanto antes. Ela apertou por um momento dando aquele sorriso que só ela sabia dar, como o sol iluminando um belo dia de verão.

Aos poucos senti uma sensação de sono muito boa se abatendo sobre mim de uma maneira que não dava para resistir. Fui me deixando levar pela corrente que me puxava cada vez mais para fundo, deixando que minha mente se desligasse vagarosamente, até que de repente tudo o que eu enxergava em minha frente era a completa escuridão. 

Entre Almas [Livro 01]Where stories live. Discover now