༺XVIII༻

753 96 64
                                    

PENSILVÂNIA SÉCULO XV

ஜீ፝͜͜͡͡Acordei em meu quarto.

Minha mente rodopiava quando meus olhos encontraram diretamente a luz da minha janela. Fechei os olhos por um segundo ao sentir uma dor visual e aos poucos fui abrindo novamente, mas na direção oposta à luz da janela. Precisava que meus olhos se acostumassem com a claridade antes de tudo. Quando minha visão finalmente estava completamente acostumada com a luz forte, sentei-me na cama, passando a mão em meu rosto.

Não podia acreditar depois do que acontecera na noite anterior que havia voltado para o lugar que jurei que nunca mais voltaria. A mansão do meu pai. Tudo isso para ficar com a mulher que eu havia me apaixonado desde o primeiro momento quando vi. Às vezes fazemos algumas loucuras quando estamos apaixonados. Somos inconsequentes. Mas não me importava se eu tinha uma chance de viver uma história de amor com ela.

Voltei durante à madrugada escoltado por Daynna até a porta da minha casa. Aquilo certamente era estranho para os costumes da época, já que o homem teria que mostrar tal gesto de cavalheirismo, mas agora eu era a mocinha em perigo e não ela. Isso era novo para mim. Não costumava ser salvo por garotas ou muito menos lutar com monstros. Era tudo estranho, mas estava começando a gostar do que poderia ser a minha nova vida.

Lembro-me dela conferindo o local onde eu fora atingindo por aquele Inferus. Ela possou suavemente os dedos pela minha pele lisa. Não havia mais rastro nenhum do que aquele monstro me fizera. Daynna sorriu e mordeu o lábio inferior encarando minha pele nua, depois ergueu os seus olhos em minha direção. Ela ficava tão bela sob a luz da lua. Lembro-me de ter dito isto à ela. Sua pele leitosa ficava azulada, enquanto seus olhos pareciam ainda mais escuros como um verdadeiro buraco negro. Nossos rostos se aproximaram um do outro e nossos lábios se tocaram num beijo terno e afetuoso.

Uma noite apenas mudara tudo. Eu não imaginava que ao sair de casa no meio da noite poderia me ser tão positivo. Estava feliz que aquilo tinha acontecido e me perguntava o porquê daquilo não ter acontecido antes. Talvez as coisas só tivessem que acontecer naquele instante, daquela forma. Nunca entenderei exatamente o destino. Ele chega a ser engraçado algumas vezes, mas é sempre certeiro.

Quando nossos lábios deixaram de se tocar, comecei a me afastar dela, andando pela estrada de ladrilhos até a casa. Andava de ré, olhando para ela e sorrindo, parecendo um bobo apaixonado, o que de fato era. Ela sorria e lembro de ouvir ela sussurrando para eu ter cuidado. Eu assenti e continuei caminhando até, quase cair nos degraus que davam para a porta de entrada. Ele riu alto e tapou a mão com a boca em seguida para abafar o barulho com olhos arregalados. Sorri e finalmente subi os degraus, esgueirando-me para dentro de casa, enquanto ela acenava para mim e eu para ela, até a porta se fechar totalmente.

Agora estava ali sobre a minha cama com um sorriso bobo estampado em meu rosto, relembrando tudo o que havia vivido com ela naquela noite e tudo o que ainda havia de viver. Fui tirado do meu torpor quando ouvi um batido na porta. Rapidamente me levantei e pus uma camisa. Fui até a porta e a abri. Vi o rosto sorridente da empregada da casa, pedindo permissão para começar à arrumar o meu quarto. Consenti, abrindo a porta totalmente para que ela passasse, enquanto eu caminhava pelo corredor rumo à cozinha, deixando-a fazendo o seu trabalho em meu quarto.

Ao chegar por fim na cozinha, meu pai tomava café da manhã sozinho. Ele estava sentado na cadeira da ponta da mesa, de frente para a entrada por onde eu caminhava. Por um momento pensei em voltar, não para o meu quarto, mas para qualquer lugar longe dali. Ainda podia sentir as suas mãos pressionando a minha garganta, cortando a minha passagem de ar, prestes à esmagá-la por completo, quando os seus olhos me encontraram e tudo o que consegui fazer foi paralisar. Os olhos escuros, revelando sua alma vazia e sombria, me despertavam pavor, mas não conseguia parar de encará-los, sentindo todo o meu corpo vacilar.

― Bom dia! ― disse ele num tom simpático. ― Sente-se para tomar café juntamente comigo!

Parecia que eu estava vendo novamente o pai que eu conhecia a minha vida toda, mas não poderia confiar nele novamente. Todo o meu corpo relutava para não me juntar à ele ali, mas minha boca não conseguia dizer uma palavra sequer. Me sentia perdido quanto ao que deveria fazer a seguir. Esperava poder evitá-lo por mais algum tempo. Talvez a vida inteira se fosse preciso até eu finalmente conseguir sair dali.

― E então? ― insistiu ele fazendo um gesto com uma das mãos em direção às várias cadeiras livres à sua frente.

Minha cabeça dizia que não, mas aos poucos dei passos até uma das cadeiras, um tanto distante dele, evitando agora encarar os seus olhos. Ele passou o guardanapo de pano pela sua boca e também na barba ao redor de sua boca, que também poderia haver alguns resquícios de comida. Encarei algumas frutas que haviam ali diante de mim. Algumas uvas dentro de uma tigela, maçãs e morangos, além de alguns pães e uma jarra de suco que pela cor amarelada, supunha que deveria ser de laranja.

― Acho que precisamos conversar sobre o que aconteceu ontem à noite! ― disse ele por fim, talvez notando o meu desconforto cm relação à ele.

Finalmente depois de sentado, olhei para ele, ainda sentindo o meu interior um tanto resistente. Não sabia como definir a sua expressão. Não parecia haver nada de errado ali, além de um pai preocupado com o seu filho. Meu coração se apertou. Sentia insegurança. Desconfiança. Pavor. Não sabia o que esperar dele, depois do que havia acontecido naquela noite. Senti por um momento que ele iria me matar. Que tipo de pai chegaria até aquele extremo? E por quê?

Ainda não conseguia falar. Como se suas mãos ainda apertassem o meu pescoço, me impedindo de usar a minha voz. Tudo o que consegui fazer, foi assentir, concordando que ele continuasse a falar o que quer que fosse dizer à mim. Ele respirou fundo juntando as mãos abaixo do queixo e o apoiando nelas. Seu olhar me avaliava. Naquele momento pude sentir que ele estava farejando o meu medo, tal como um cão de caça.

Engoli em seco.

― Sobre o que aconteceu ontem à noite meu filho, eu quero que saiba que eu sinto muito!

Senti uma pontada no meu coração naquele exato momento, como um turbilhão de sentimentos me invadindo e por um segundo pude sentir compaixão dentre tantos, mesmo depois de ter sentido raiva e pânico. Minha mente estava afundada no mais profundo caos.

― Eu acabei ficando fora de mim! ― prosseguiu ele com sua justificativa. ― Perdi o controle, mas consegui me interromper à tempo de fazer uma grande besteira. Me perdoe!

Não via lágrimas em seus olhos, mas podia detectar embargo em sua voz. Não sabia se acreditava nele ou se saía correndo dali para nunca mais encará-lo novamente. Sentia um peso imenso se instalar sobre meus ombros, no entanto mesmo assim resolvi falar, por mais que ainda não me sentisse seguro para externar minha voz.

― Tudo bem! ― disse por fim com a voz fraca.

― Mas espero que aquele evento tenha servido para clarear as suas ideias quanto ao casamento com a Victoria.

Meu olhar automaticamente se abriu. Uma raiva visceral cresceu dentro de mim, ardendo como fogo, fazendo com que eu cerrasse os punhos ao lado do meu corpo. Ele levantou-se e pude ver seu roupão vermelho amarrado à cintura e seus pés desnudos, caminhando para longe dali, direcionando-me um leve sorriso que me atingiu como farpas. Ele deixou o recinto, enquanto eu permanecia ali completamente assombrado com o homem frio e calculista que agora ocupava o corpo do meu pai.

Entre Almas [Livro 01]Wo Geschichten leben. Entdecke jetzt