XX - Floresta escura

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Os pequenos pezinhos que corriam afoitos deixavam uma trilha de pegadas na areia do porto. O corpo do pequeno Akane se chocava com pessoas que não conseguia identificar e jamais pretenderia: havia conseguido comida o suficiente para se alimentar durante generosos dias.

A sacola roubada que seus braços raquíticos carregavam era pesada, carregada de frutas e vegetais frescos. Um sorriso sapeca, com alguns dentes a menos, jazia presente no rostinho pálido do menino. O senhor, que havia sido roubado, corria atrás dele, prometendo-lhe centenas de açoites e pontapés. 

Corria tão rápido que sequer raciocinava o caminho que trilhava. Tanto que, para sua infelicidade, antes que pudesse sair da multidão e sumir por entre as árvores, chocou-se em um homem alto, despejando boa parte do alimento no chão. 

Quando voltou a si, o senhor que lhe perseguia o ergueu pela gola da camisa, fazendo-o sufocar. 

— Ladrãozinho imundo! Quem pensa que é?! — Seus dentes amarelos tomavam toda a visão de Akane, que se encolhia quando a saliva odorosa respingava em seu rosto. — Moleque vagabundo! Vou te dar uma surra aqui mesmo.

Ele jogou Akane no chão com brutalidade, fazendo com que o pobre menino se cortasse em uma pedra e urrasse de dor. 

— Esse garoto é meu, não o machuque — Uma voz grave soou no meio da confusão, pausando instantaneamente o braço erguido do homem, que já estava pronto para chibatar o pequeno Aoi até que ele perdesse a consciência. — Ou vamos ter que resolver isso de homem pra homem, não é? Sou muito bom na linguagem dos punhos e creio que já saiba disso.

Os dois homens se entreolharam e houve um silêncio. Akane não sabia quem era o seu "salvador", se recusava a erguer a cabeça. Naquele momento, o constrangimento esmagava suas entranhas à medida que a humilhação era esfregada em sua face. 

— Cuida melhor desse fedelho, menino Yugi — O senhor recuou aborrecido e preferiu esquecer o acontecimento, recolhendo suas verduras com visível pressa. Sabia da fama, que em nada o favorecia, de seu oponente. 

O jovem Yugi se voltou ao garotinho, que estava sentado em meio à multidão. Sua cabeça permaneceu baixa e seu semblante sombrio. Deram as mãos e caminharam juntos pelo porto. 

Akane conseguia ver os chinelos e bermuda surrados do homem que o acompanhava. A textura da mão dele era áspera também, não era agradável de se tocar por ser uma pele muito grossa e calejada. 

— Sente-se aqui, menino Aoi — Ele mostrou uma pequena elevação, próxima da sarjeta do porto. Akane obedeceu, sentando. Repousou a fronte nos braços, já encostados nos joelhos, e ali ficou até que ele virasse de costas.

Quando o homem virou, o Aoi tentou se esgueirar rapidamente pela floresta.

Mas a tentativa foi frustrada. 

— Se tentar escapar, conto ao senhor Aoi a sua peripécia de hoje — Sem nem mesmo se virar, ele havia percebido que Akane havia se movido. 

— Não conte a ele, por favor! Ele está velho, vai morrer se souber! — O menino implorou, receoso. Recuou seus passos e voltou a se sentar rapidamente. 

Quem era aquele homem?

— Vou te comprar comida. Se sair, ficarei com ela para mim mesmo. 

Akane arregalou os olhos, levantando subitamente sua cabeça para, por fim, observar a face de tamanha gentileza.

Mas ele já havia desaparecido na multidão.

Portanto, esperou. E esperou um pouco mais. Quando já estava impaciente e preocupado, pois o sol se poria em breve e seu avô, como chamava o senhor que o havia adotado, sentiria falta dele, se ergueu e já ia se retirar.

𝑂 𝑐𝑜𝑛𝑡𝑟𝑎𝑡𝑜 - Hananene fanficOnde histórias criam vida. Descubra agora